MIGALHAS QUENTES

  1. Home >
  2. Quentes >
  3. STJ se organiza para enfrentar incrível aumento de ações penais
Sobrecarga

STJ se organiza para enfrentar incrível aumento de ações penais

O presidente da Corte, ministro Herman Benjamin, sensível à situação imprevista está empreendendo medidas extraordinárias.

Da Redação

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Atualizado às 07:11

O STJ enfrenta atualmente uma acentuada disparidade na distribuição de processos entre suas áreas de competência.

Com efeito, a 3ª seção, responsável por matérias penais, vem recebendo um volume significativamente maior de casos, especialmente habeas corpus, em comparação com as demais seções.

Tal descompasso vem gerando uma sobrecarga, comprometendo a uniformidade da prestação jurisdicional no Tribunal da Cidadania.

A propósito, esse aumento expressivo de processos penais requer uma análise mais profunda, pois pode revelar questões estruturais ou conjunturais que impactam o sistema de Justiça.

Ciente dessa situação, o presidente do STJ, ministro Herman Benjamin, propôs uma solução que será votada na próxima sessão plenária, marcada para esta quarta-feira, dia 11, às 18h. A pauta prevê a convocação excepcional de juízes Federais e estaduais para auxiliar a 3ª seção, de forma temporária, por seis meses, com atuação remota, sem necessidade de deslocamento.

Embora essa solução emergencial seja bem-vinda e necessária, é inegável que, caso o ritmo atual de aumento persista, daqui a pouco será preciso desenvolver estratégias de longo prazo para equilibrar a demanda.

 (Imagem: Gustavo Lima/STJ)

Ministro Herman Benjamin, presidente do STJ.(Imagem: Gustavo Lima/STJ)

Colegiado sobrecarregado

Cada seção do STJ é responsável por julgar matérias específicas - a 1ª seção cuida de Direito Público; a 2ª seção, de Direito Privado, e a 3ª seção, de Direito Penal.

Como dito , ao analisar os números do 1º semestre de 2024, fica clara uma distorção existente entre os órgãos que compõem a Corte.

No primeiro semestre de 2024, enquanto a 1ª seção teve 1.001 processos com pedido de liminar, e a 2ª seção teve 2.462, a 3ª seção recebeu impressionantes 44.591 processos com liminares no mesmo período, representando provavelmente os números mais espantosos já registrados pelo Tribunal.

 (Imagem: Arte Migalhas)

Processos com pedido de liminar no STJ (jan a jul/2024).(Imagem: Arte Migalhas)

Para além das liminares, o total da distribuição média por ministro de janeiro a julho deste ano é de 4.700 processos para ministros da 1ª seção; 5.400 a ministros da 2ª seção; e 7.800 a ministros da 3ª seção.

 (Imagem: Arte Migalhas)

Média de processos por ministro no STJ (jan a jul/2024).(Imagem: Arte Migalhas)

Se a separação for feita por turmas, é possível verificar também a discrepância: 

 (Imagem: Arte Migalhas)

Processos por turma no STJ (jan a jul/2024).(Imagem: Arte Migalhas)

A situação parece refletir um momento particular da sociedade, que merece até estudos acadêmicos. O fato é que há alguns anos o número de processos penais, especialmente na 3ª seção do STJ, cresceu de forma significativa. Nos últimos dois anos, essa alta fez com que o volume de casos nessa seção não apenas se aproximasse, mas também ultrapassasse o das demais áreas da Corte.

Há, certamente, vários motivos para esse aumento. De fato, diversos fatores devem estar interligados:

Pandemia de covid-19: Durante a pandemia, houve uma série de medidas restritivas, incluindo lockdowns e interrupções temporárias nas atividades judiciais, que geraram acúmulo de processos e atrasos no julgamento de casos. Além disso, o sistema prisional, altamente afetado pela crise de saúde, gerou um número maior de pedidos de liberdade, muitos deles na forma de habeas corpus, para evitar contaminações em massa nas penitenciárias.

Mudanças na segurança pública e política criminal: A adoção de novas políticas de segurança pública, como o aumento das operações policiais em certas regiões, pode ter resultado em mais prisões, levando a um maior número de processos penais e recursos relacionados.

Maior conscientização sobre direitos: Nos últimos anos, houve um aumento na conscientização sobre direitos fundamentais e garantias processuais, o que levou advogados e réus a recorrerem mais ao Judiciário para garantir essas proteções, como a utilização do habeas corpus em casos de prisão preventiva ou condenação em instâncias inferiores.

Demora no julgamento de casos criminais: A morosidade processual em instâncias inferiores gera um efeito cascata. Com processos acumulados nos tribunais de primeiro grau, mais réus buscam o STJ em busca de soluções rápidas, como habeas corpus, na tentativa de desbloquear o andamento dos seus casos.

Aumento na criminalização de novas condutas: Em certos casos, legislações mais rígidas ou a criação de novas tipificações penais também podem ter gerado mais processos criminais, como a intensificação de leis de combate à corrupção, crimes cibernéticos e lavagem de dinheiro.

Esses fatores, em conjunto, explicam o aumento expressivo da demanda penal no STJ nos últimos anos, especialmente após o período pandêmico.

Para se ter uma ideia, uma década atrás, o estoque de processos em um gabinete criminal do STJ correspondia a cerca de metade do volume encontrado em um gabinete cível. Hoje, o cenário se inverteu, com a 3ª seção enfrentando uma sobrecarga que não pode ser ignorada.

O presidente do STJ, ministro Herman Benjamin, parece estar especialmente preocupado com dois pontos: garantir que os processos daqueles que buscam Justiça sejam julgados em tempo hábil e evitar a prescrição de crimes graves, o que resultaria em impunidade, agravando a percepção de injustiça. 

Ademais, vale ressaltar que habeas corpus (HCs) e recursos em habeas corpus (RHCs) frequentemente envolvem situações urgentes, muitas vezes relacionadas à liberdade de pessoas presas, e, por isso, não podem ser adiados.

Além disso, os processos criminais demandam uma análise individualizada, já que se baseiam em condutas específicas que precisam ser examinadas caso a caso. Isso impede que filtros de relevância, como os que estão sendo desenvolvidos para outras áreas da Corte, sejam aplicados no Direito Penal.

Se o STJ não conseguir absorver essa demanda crescente, há o risco de que os casos acabem sendo levados ao STF, sobrecarregando também a Suprema Corte e agravando o problema da morosidade judicial.

Convocação de magistrados

Se aprovada a proposta de convocação de juízes, poderão ser chamados até 100 magistrados - sendo 10 para cada gabinete que trata de matéria penal. 

A ideia é compensar os juízes com 2 dias de licença indenizatória por semana trabalhada, conforme regulamentação. 

A seleção de juízes por gabinete será feita pelos ministros da seção, seguindo os mesmos critérios de seleção dos juízes auxiliares.

E, ao contrário do que se diz, a convocação dos juízes, se aprovada, não resultará em deslocamento dos magistrados: eles seguirão atuando em suas varas e tribunais de origem, com um regime de trabalho alternado.

Reunião com o STF

Nesta segunda-feira, 9, ministros do STJ se reuniram com o presidente do STF e do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso.

O objetivo foi tratar de temas a serem uniformizados pelo STF. A solução dessas "distorções" certamente reduziria a litigância, sendo parte da solução para o STJ.

 (Imagem: STF)

Ministros do STJ reúnem-se com Barroso para tratar de temas penais pendentes no STF.(Imagem: STF)

Patrocínio

Patrocínio Migalhas