Polícia de SP fixa balizas para abordagem pessoal e invasão domiciliar
Recomendação publicada no Diário Oficial do Estado objetiva garantir a legalidade e licitude das provas colhidas.
Da Redação
quarta-feira, 17 de julho de 2024
Atualizado às 10:50
O delegado-Geral de Polícia de São Paulo, Artur José Dian, assinou uma recomendação às forças policiais do Estado com balizas a serem seguidas sobre abordagem de pessoas e invasão de domicílio sem mandado judicial. O documento foi publicado no Diário Oficial do Estado no último dia 12.
O documento é um guia para garantir que as ações policiais estejam alinhadas com os princípios legais e éticos, visando a transparência e a legalidade nas operações policiais. De acordo com o documento, deve-se primar pelos princípios da razoabilidade e da motivação para garantir a licitude das provas colhidas das ações.
Assim, o texto dá interpretação e aplicação das expressões "justa causa", "fundadas razões" e "fundada suspeita" em contextos de abordagens e buscas sem ordens judiciais prévias.
- Veja a íntegra da recomendação DGP 1/24.
Fundada suspeita
O texto afirma que a "fundada suspeita" para a abordagem deve ser feita a partir de parâmetros objetivos - tangíveis e perceptíveis - e elementos suficientes para justificar uma abordagem.
Diz, também, que a fundada suspeita provém de uma análise do "conjunto comportamental" do suspeito, a partir da "experiência profissional e na capacidade de percepção adquirida pelo policial na constância da sua atividade".
Segundo a recomendação, há justa causa para busca pessoal quando motivada por denúncia anônima ou patrulhamento em local conhecido como ponto de tráfico de drogas, conjugada com campana de policiais que constataram intensa movimentação, típica de comércio ilícito de entorpecentes, ou desobediência a ordem de parada e subsequente evasão, ou quando visualizado volume descartado ou sob as vestes do indivíduo.
"É essencial a documentação da motivação, seja por meio dos depoimentos prestados pelos policiais militares ou policiais civis, por meio da descrição do nexo de causalidade da ação policial desde a sua origem, seja por meio da juntada de registros de reportes populares anônimos."
Invasão de domicílio
O texto reafirma que a entrada forçada em domicílio sem mandado só é lícita quando amparada em "fundadas razões" devidamente justificadas.
Diz a nota que o simples ingresso do cidadão para dentro de sua residência ao avistar os agentes estatais ou a mera existência de denúncia anônima não são, sozinhos, fundadas razões.
Mas, se o policial estiver diante das duas situações, de forma conjugada - denúncia anônima e fuga ao domicílio, por exemplo, - fica justificada a entrada forçada em domicílio.
A denúncia anônima aliada a forte odor de maconha nas proximidades também justifica o ingresso dos policiais, segundo o documento.
Da mesma forma, o documento orienta que há justa causa se houve fuga para dentro de casa após dispensa de drogas, ou se avistado aparentemente entregando-as a terceiros.
Grupo de trabalho
Os enunciados contidos no documento foram elaborados pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional, no Gabinete do procurador-Geral de Justiça, voltado à realização de estudos e elaboração de proposta que contenha diretrizes e parâmetros para delimitação dos termos "justa causa", "fundadas razões" e "fundada suspeita" nas buscas domiciliares e veiculares e nas abordagens policiais, visando orientar as atividades da Polícia Militar, Polícia Judiciária e dos membros do Ministério Público.
Questão tormentosa
Recentemente, a 1ª turma do STF entendeu que foi devidamente justificado o ingresso de policiais em domicílio sem mandado, após alegação policial de que o suspeito fugiu para o interior da residência. Assim, seguindo o voto do relator, ministro Flávio Dino, o colegiado reformou decisão da 5ª turma do STJ e validou provas obtidas na busca.
Enfrentando esse tema diariamente, a 3ª seção do STJ tem respondido de forma variada à questão. Para o STJ, considerando a realidade do dia a dia, a mera alegação policial de que houve fuga ao avistar a viatura não é suficiente.
De fato, se esse fosse o critério, poderia ser alegado em todos os boletins de ocorrência que houve fuga, abrindo caminho para a perpetração de diversas ilegalidades.
Vale citar que essas e outras ilegalidades poderiam ser evitadas se houvesse o uso de câmeras tanto nos uniformes policiais quanto nas viaturas.
Em entrevista concedida ao Migalhas em maio deste ano, o ministro Rogerio Schietti, do STJ, analisou os efeitos, no Tribunal, da falta de gravação das ações. S. Exa. ressaltou que, apesar das diretrizes claras, as exceções se tornaram uma espécie de regra não oficial, com invasões domiciliares frequentemente justificadas por denúncias anônimas sem subsequente verificação.
Relembre: