CNJ pede explicações a magistradas que negaram aborto a menina de 13 anos vítima de estupro
Para o corregedor, o caso, se comprovado, aponta para prática de falta funcional com repercussão disciplinar.
Da Redação
sábado, 13 de julho de 2024
Atualizado às 09:47
O corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, determinou a intimação de duas magistradas do TJ/GO que negaram a interrupção da gravidez de uma adolescente de 13 anos vítima de estupro.
O corregedor-nacional ressaltou a gravidade e a urgência do caso, que, se comprovado, pode configurar prática de falta funcional com consequências disciplinares.
"É inequívoca a urgência e a gravidade do caso, em tese, razão pela qual determino intimação da juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva, titular do 1º Juizado da Infância e da Juventude de Goiânia, e a desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, do Tribunal de Justiça de Goiás, para que, no prazo de cinco dias, prestem as informações que entenderem pertinentes", declarou.
A decisão do corregedor foi motivada por uma reportagem publicada pelo site Intercept Brasil.
A matéria jornalística revelou que a adolescente teve seu direito ao aborto legal negado por um hospital em Goiás e por duas decisões judiciais, proferidas pela juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva e pela desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade. A vítima se encontra na 28ª semana de gestação e que busca interromper a gravidez desde a 18ª semana.
O suspeito do estupro é um homem de 24 anos, que seria conhecido de seu pai, com quem ela vive. O caso é investigado pela Polícia Civil.
Parto prematuro
O Ministério Público de Goiás ingressou pedido de alvará de interrupção de gravidez em junho. No final do mês, a juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva concedeu uma medida de emergência em que autorizou a interrupção, mas só se a equipe médica adotasse métodos para preservar a vida do feto - ou seja, que fosse feito um parto prematuro.
"Legalmente não existe prazo legal para interrupção da gestação oriunda de estupro", reconheceu a juíza. Porém, Silva proibiu procedimentos abortivos como a assistolia - em que o feto é induzido ao óbito dentro do útero para evitar sofrimento -, recomendada pela OMS em interrupções tardias.
"O nascituro encontra-se em avançado estágio temporal de vida intrauterina, com possibilidades de sobrevida", escreveu a juíza, ressalvando que a menina não precisaria cuidar do bebê, caso sobrevivesse.
Impedimento pelo pai
Após a decisão da juíza, o pai buscou a Justiça para adiar o procedimento, pedindo que se aguardasse até as 28 ou 30 semanas, para que o feto tivesse mais chance de sobreviver. Ele também questionou o estupro, afirmando que estava "pendente de apuração".
A lei brasileira, no entanto, considera estupro de vulnerável qualquer relação sexual com menores de 14 anos. Vale citar decisão do STJ de maio deste ano em que a 6ª turma destacou que suposto consentimento da vítima não influencia condenação por estupro de vulnerável.
A desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, analisando o caso em segunda instância, aceitou o pedido do pai e proibiu a realização de qualquer procedimento até o julgamento definitivo.
A magistrada alegou não haver laudo médico que comprovasse o risco à vida da menina gestante. Disse, ainda, que a demora na decisão era perigosa, pois ela poderia realizar um aborto enquanto aguardava.
Segundo o Intercept, vários advogados, além de um padre e uma freira da igreja católica, estariam auxiliando o homem. O pedido era para que a menina "segurasse" a gravidez até 30 semanas, quando o feto teria mais chances de sobreviver.
Gravidez infantil
De acordo com a reportagem do Intercept, a própria menina é fruto de gravidez infantil. Sua mãe teria 12 anos quando de seu nascimento.
A menina não frequentava a escola e não fez acompanhamento pré-natal.