Lenio Streck: STF agiu por falha do sistema em decisão sobre maconha
O jurista também alertou para a possibilidade de um "backlash" brasileiro, onde o Parlamento, insatisfeito com a decisão do STF, poderia aprovar uma emenda constitucional recriminalizando o porte de drogas.
Da Redação
quinta-feira, 27 de junho de 2024
Atualizado às 11:19
Nesta semana, o STF tomou uma decisão histórica ao definir que o uso de maconha deve ser tratado como um ilícito administrativo, não penal, configurando-se como uma questão de saúde pública. Com isso, não haverá consequências criminais, apenas sanções administrativas. Os ministros também determinaram que a posse de até 40 gramas de cannabis ou a manutenção de até seis plantas-fêmeas diferenciará o uso pessoal do tráfico de drogas, até que nova legislação seja estabelecida.
Simultaneamente, o Congresso Nacional analisa a PEC 45/23, que visa criminalizar a posse ou porte de qualquer quantidade de droga ou entorpecente, criando um potencial conflito com a recente decisão do STF.
O jurista Lenio Streck comentou a decisão em dois vídeos à TV Migalhas, ressaltando a complexidade da questão e suas possíveis implicações. Segundo Streck, "a decisão do Supremo Tribunal Federal é uma decisão complexa porque, para quem como eu tem uma posição de que o Supremo não faz regras gerais para o futuro, fica bastante estranha essa decisão. De todo modo, vê-se a boa intenção do Supremo".
Streck destacou que a decisão do STF foi motivada pelo fracasso do sistema atual, que resultou na prisão de muitas pessoas pelo porte de pequenas quantidades de drogas, confundidas com traficantes. Ele explicou:
"O sistema fracassou. A polícia não foi avisada... os presídios estão cheios de pessoas que somente consomem, mas são tidas como traficantes porque o Ministério Público também, entre aspas, não foi avisado de que a lei já não previa crime para quem consome."
O jurista alertou para a possibilidade de um "backlash" brasileiro, onde o Parlamento, insatisfeito com a decisão do STF, poderia aprovar uma emenda constitucional recriminalizando o porte de drogas. Nesse cenário, Streck questiona qual seria a última palavra: a do Supremo ou a do Parlamento. Ele sugere dois caminhos possíveis: ou o STF se rende à decisão parlamentar ou reafirma sua posição, gerando um conflito político e jurídico.
"Sempre vão existir ruídos políticos, porque é o mesmo caso do aborto. Backlash é o efeito bumerangue. Vamos ver se a nossa democracia tem gordurinhas para queimar com essas pautas que não deviam criar toda essa polêmica. Bastava ter um certo grau de racionalidade. Aliás, se a polícia já tivesse cumprido a lei há mais tempo, não precisava. As pessoas estranham e dizem 'ó céus, por que o STJ precisa dar uma liminar sobre um problema de algumas gramas de maconha?' Mas, claro, porque alguém prendeu, alguém denunciou, alguém condenou, foi pro tribunal, confirmou a condenação. Resta para quem? STJ ou Supremo Tribunal. Portanto, eis a questão."
O evento
O XII Fórum de Lisboa, realizado de 26 a 28 de junho, abordará o tema "Avanços e Recuos da Globalização e as Novas Fronteiras: Transformações Jurídicas, Políticas, Econômicas, Socioambientais e Digitais". O evento reúne autoridades e especialistas de diversas áreas para analisar as mudanças e os desafios contemporâneos que impactam o cenário global.