STF julga queixa-crime de Gustavo Gayer contra José Nelto: "fascista"
Cármen Lúcia votou pelo recebimento integral da denúncia, já Flávio Dino pelo recebimento parcial. Nelto foi acusado de chamar Gayer de 'nazista', 'fascista' e 'idiota' em um podcast.
Da Redação
terça-feira, 4 de junho de 2024
Atualizado em 5 de junho de 2024 07:19
Pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, suspendeu julgamento de denúncia contra o deputado Federal José Nelto por injúria e calúnia contra o deputado Federal Gustavo Gayer.
Até o momento, a relatora ministra Cármen Lúcia votou pelo recebimento integral da denúncia e ministro Flávio Dino pelo recebimento parcial, apenas com relação ao crime de calúnia.
No caso, Nelto é acusado de ofender Gayer durante participação, em 2023, no podcast "Papo de Garagem". Na oportunidade, Nelto chamou Gayer de "nazista", "fascista" e "idiota".
No programa, perguntado se teria inimigos na política, o deputado José Neto disse: "Eu não tenho inimigos na política, eu tenho adversários idiotas, fascistas, nazistas. Esse Gustavo Gayer. Isso é a pior espécie que tem, nazista, fascista. Vai ser processado. E por quê? Porque ele é um cidadão que não tem o menor respeito, que não tem o menor temor por ninguém e vive nessa besteira dele. Um cara que foi lá em Brasília bater em uma enfermeira lá, eu não tenho o menor respeito por esse cara."
Veja o momento:
Ausência de imunidade
Ao analisar o pedido, a relatora, ministra Cármen Lúcia votou pelo recebimento da denúncia, por entender que as falas do deputado não estavam acobertadas pela imunidade material, a qual incide quando provado nexo de causalidade entre o delito de opinião, imputado ao parlamentar, e ao exercício da atividade política, ainda que proferidas fora do Congresso Nacional.
S. Exa. ressaltou que o STF consolidou jurisprudência de que em declarações fora do Congresso, a imunidade não pode ser absoluta. Assim, no contexto de entrevista, o parlamentar não tratou de tema de políticas de interesse público, não havendo, portanto, pertinência com o mandato parlamentar. Contexto estranho ao debate político e atingindo a pessoa.
Revisão do instituto
Ao proferir seu voto, ministro Flávio Dino afirmou que é muito comum, atualmente, que no recinto do parlamento haja parlamentares mais ocupados em produzir vídeos do que em usar a tribuna. Dessa forma, afirmou o ministro, não há uma distinção absoluta entre o que ocorre dentro e fora do recinto parlamentar.
"Basta observar as fotos: enquanto as votações se processam, há parlamentares com celulares em punho fazendo lives e gravando vídeos. Estamos no limiar da necessidade de examinar o instituto da imunidade parlamentar, não para eliminá-lo, mas para adequá-lo a esse novo contexto", concluiu.
Confira:
"Istas"
Dino, no entanto, votou por receber a denúncia apenas em parte, quanto ao crime de calúnia pela alegação de violência contra enfermeira.
O ministro entendeu que os termos "nazista" e "fascista" não teriam o poder de configurar ofensa pessoal, tratando-se de "uma corrente política, estruturada, na sociedade, no planeta, basta examinar as eleições da Alemanha em curso, em que há um partido formado, basicamente por herdeiros dessa corrente política".
Ministra Cármen Lúcia, contudo, fez ressalvas quanto à observação de Dino.
Destacou que chamar alguém de nazista traz consigo uma série de comportamentos atribuíveis ao regime da Segunda Guerra Mundial, tornando essa acusação muito mais grave do que outras ofensas. Observou que é lamentável a situação em que a política se encontra, onde ofensas sérias são proferidas sem consideração pelo impacto.
"É tristinho a gente ter que lidar, e não é este um caso único aqui neste tribunal, acho que nós todos somos relatores de outros casos, nos quais se chega a imputar, e muitas vezes nós já aceitamos e até concluímos julgamentos, sobre o desnível a que se reduziu esta mais que nobre atuação política em benefício de todos", afirmou a ministra, referindo-se à degradação do discurso político. S. Exa. destacou que, mesmo em um momento de ânimos exaltados, não se deve chamar alguém de nazista.
A ministra ponderou que, em um momento inicial de recebimento da queixa, é crucial considerar o impacto dessas acusações no ambiente político. Retirar essas ofensas sem uma análise aprofundada pode levar a uma prática recorrente, especialmente em contextos eleitorais, prejudicando a imagem pública e as escolhas livres dos eleitores.
Mencionou que, em processos eleitorais, dizer que alguém é nazista pode ter consequências graves e que o TSE já lidou com discursos espúrios com impacto eleitoral. Cármen Lúcia enfatizou que a imunidade parlamentar foi criada para proteger a oposição de silenciamento durante a ditadura, mas não deve ser confundida com impunidade. "A imunidade parlamentar não pode em nenhum momento significar impunidade parlamentar, porque não é sinônimo".
Em resposta, Dino explicou que, se estivesse examinando direito de resposta no TSE, a imunidade parlamentar não se aplicaria. O ministro compartilhou uma experiência pessoal para ilustrar seu ponto de vista, mencionando os 18 anos em que foi comparado, frequentemente e de maneira depreciativa, ao líder da Coreia do Norte.
Apesar das ofensas, Dino afirmou que nunca processou ninguém, considerando-as parte do debate político, ainda que as achasse desproporcionais. O ministro enfatizou que, embora a crítica possa ser errada, ele a considera uma crítica política e, por isso, entende que a imunidade parlamentar deve ser mantida nesses casos.
Veja o debate:
- Processo: PET 11.573