STJ: Site é condenado em R$ 50 mil por difamar vítima de estupro
Jornal vinculou a narrativa a uma manchete sensacionalista, atribuindo à vítima conduta ativa ante o fato ocorrido e levantando dúvidas morais sobre seu comportamento.
Da Redação
quinta-feira, 23 de maio de 2024
Atualizado às 10:13
Para a 4ª turma do STJ, um órgão de imprensa comete ato ilícito ao divulgar um fato verídico, mesmo sem identificar nominalmente as pessoas envolvidas, se a publicação ofende a honra de uma vítima de crime de estupro.
Com base nesse entendimento, o colegiado condenou um site de notícias a pagar R$ 50 mil em danos morais a uma menina, devido à publicação de uma matéria que, ao relatar o estupro sofrido por ela antes de completar 14 anos, vinculou a narrativa a uma manchete sensacionalista, atribuindo à vítima uma conduta ativa e levantando dúvidas morais sobre seu comportamento.
Na matéria, o site se referiu à vítima como "novinha" e insinuou que ela havia mantido relações sexuais com o padrasto, em vez de relatar que foi vítima de estupro, além de responsabilizá-la por um suposto "barraco familiar". A publicação levou a vítima a ajuizar uma ação com pedido de indenização por danos morais.
Contudo, o juízo de primeiro grau julgou a ação improcedente, afastando a responsabilidade civil do site com o argumento de que, embora houvesse excesso no título da matéria, a conduta do jornal online estaria amparada pela liberdade de expressão e de imprensa. Além disso, considerou que não houve danos à imagem da menor, uma vez que a notícia não continha dados objetivos que permitissem sua identificação. Essa decisão foi mantida pelo TJ/SP.
O relator do recurso no STJ, ministro Marco Buzzi, afirmou que a manchete utilizou termos graves e altamente ofensivos à honra e à dignidade da menor, vítima de abuso sexual, mas tratada de forma grosseira, pejorativa e preconceituosa, como se fosse culpada do próprio estupro.
O magistrado destacou que, embora o site não tenha informado os nomes das pessoas envolvidas, os termos ofensivos utilizados chegaram ao conhecimento da vítima e de seus familiares, que facilmente perceberam que a matéria se relacionava ao fato vivenciado por eles, caracterizando-se, assim, grave difamação da menor.
O relator ponderou que a ofensa à honra individual não ocorre apenas com a divulgação pública de fato vexatório, mas também quando o ataque é dirigido ao indivíduo, que pode se sentir afetado por palavras grosseiras e pejorativas, seja quando publicadas na internet, seja quando faladas diretamente ao ofendido.
"Assim, apesar do cuidado do órgão de imprensa ao omitir os dados dos envolvidos no fato, é evidente que os conceitos grosseiros e vexatórios manifestados na manchete da matéria, em relação à vítima do crime de estupro de vulnerável, têm o condão de afrontar a honra íntima da menor e nela causar danos psicológicos (artigo 21 combinado com o 17 do Código Civil e artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA)."
Marco Buzzi ainda ressaltou que, conforme a jurisprudência do STJ, os cuidados a serem empregados pelos órgãos de imprensa, na divulgação de notícias envolvendo menores de idade, devem ser redobrados, diante do dever imposto a toda a sociedade de zelar pelos direitos e pelo bem-estar da pessoa em desenvolvimento (artigos 16 e 17 do ECA).
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.