CNJ aplica indisponibilidade a desembargadora que ofendeu Marielle: "engajada com bandidos"
STJ havia absolvido a desembargadora no passado, mas CNJ decidiu aplicar pena de disponibilidade por 90 dias devido às manifestações ofensivas feitas pela magistrada contra Marielle e outras personalidades.
Da Redação
terça-feira, 21 de maio de 2024
Atualizado às 20:12
O CNJ decidiu, nesta terça-feira, 21, aplicar pena de disponibilidade à desembargadora Marília de Castro Neves Vieira, do TJ/RJ, por publicações em rede social nas quais atacou a vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018. O plenário decidiu pela aplicação de pena de disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 90 dias.
Dias após o crime, a magistrada teria afirmado que Marielle era "engajada com bandidos", e que foi eleita com a ajuda de facção criminosa. Atribuiu, também, o assassinato ao comportamento da própria vereadora. "Seu comportamento (...) foi determinante para seu trágico fim. Qualquer outra coisa diversa é mimimi da esquerda tentando agregar valor a um cadáver tão comum quanto qualquer outro."
O relator, conselheiro Alexandre Teixeira, afirmou que "o traço pejorativo, preconceituoso e discriminatório que emana das publicações (...) ostentou potencial lesivo apto a atingir direitos da personalidade afetos às figuras públicas mencionadas nas publicações, uma das quais já falecida ao tempo das postagens..
"Ora, se aos vivos não raro é extremamente difícil responder a violência que atinge a honra, aos mortos isso é impossível. Assim, soma-se à dor da perda por parte dos que ficam a da ofensa à memória de quem partiu."
O conselho também analisou outras publicações da magistrada, entre elas, uma discriminatória a uma professora com síndrome de Down; outra que teria como alvo Guilherme Boulos, na qual a magistrada diz que ele "seria recebido na bala" depois do decreto de Bolsonaro, e dizendo "eu apoio Bolsonaro"; e uma última outra contra o ex-deputado Jean Willys e ofensiva à comunidade LGBTQIA+.
"A meu juízo, são ataques pessoais e ofensivos a uma liderança política, em virtude de ideologias que são contrárias, de maneira nítida, às da emitente da opinião, e que teria o objetivo indisfarçado de descredenciá-lo perante a opinião pública", disse o relator, Alexandre Teixeira, sobre posts de Boulos. Com relação a Marielle, destacou que a magistrada jamais teve a preocupação de checar as publicações que disseminava.
Para ele, a condutas colidem com a Loman e com o código de ética da magistratura, e devem ser julgadas procedentes as imputações. Ele votou pela aplicação de pena de disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 90 dias.
Ele foi acompanhado pela maioria dos conselheiros.
Aumento da pena
Ministro Barroso se disse impressionado com as manifestações da desembargadora, nas quais visualizou manifestação político-partidária totalmente inadequada, calúnia, transfobia, capacitacismo e desrespeito aos mortos. "Não é pouca coisa."
Para ele, 90 dias é insuficiente. Ele entendeu que deveria ser imposta apenas a indisponibilidade - ou, no mínimo, deveria ser imposta pena por 180 dias. "90 dias é quase um prêmio para um comportamento espantoso."
Sustentações orais
Em sustentação oral, o subprocurador-Geral da República José Adônis Callou de Araújo Sá manifestou-se pela sanção de disponibilidade por 180 dias
Ele divergiu de seu colega anterior, que apresentou parecer contra a condenação, e entendeu que as imputações postas no PAD são mais graves do que muitas outras da mesma natureza que foram julgadas no plenário.
Para ele, as publicações feitas pela magistrada foram "claramente ofensivas à honra da vereadora, que foi covardemente assassinada".
A advogada Samara de Oliveira Santos Léda realizou sustentação oral, afirmando que as publicações representaram críticas, que não atraem a condição de infração funcional.
Posteriormente, a defesa pediu que o feito fosse convertido em diligência, e retorne a fase anterior para que a defesa possa se manifestar sobre as razões. Mas o pedido foi negado, visto que o julgamento já teve início e a palavra foi dada à advogada em momento posterior à manifestação do MP.
- Processo: 0000040-74.2021.2.00.0000
Absolvida no STJ
Em 2021, o STJ, ao julgar queixa-crime da família de Marielle, absolveu a desembargadora Marília Vieira do crime de calúnia por ter publicado as ofensas a Marielle.
Os ministros entenderam que foram suficientes as retratações publicadas pela própria magistrada em suas redes sociais e por meio de uma carta com pedido de desculpas pelas postagens.