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Sessão | STF

Jornalistas no STF: Corte julga limites de ações judiciais contra imprensa

Quatro ministros votaram por medidas para evitar assédio judicial contra jornalistas e órgãos de imprensa.

Da Redação

quinta-feira, 16 de maio de 2024

Atualizado em 17 de maio de 2024 11:37

Nesta quinta-feira, 16, o STF retomou o julgamento de processos que discutem o ajuizamento abusivo de ações por danos morais contra jornalistas e órgãos de imprensa. O objetivo é determinar medidas para coibir o assédio judicial e proteger a liberdade de atuação dos profissionais da imprensa.

O caso estava sendo analisado em plenário virtual, mas foi suspenso após pedido de vista do Presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso. Até agora, votaram a relatora, ministra Rosa Weber (hoje aposentada), e os ministros Barroso, Cristiano Zanin e André Mendonça.

Os ministros concentraram suas análises em duas questões principais: (i) se, reconhecido o assédio judicial, as ações devem ser reunidas no foro de domicílio do réu; e (ii) como definir os limites da responsabilidade civil dos jornalistas que possam resultar em danos morais.

Quanto ao primeiro ponto, discutido na ADI 7.055, a relatora, ministra Rosa Weber, não recebeu a ação, porque considerou que a solicitação das partes excedia os limites da técnica de controle de constitucionalidade.

Em contrapartida, o ministro Barroso, seguido pelos ministros Cristiano Zanin e André Mendonça, votou por recebê-la, permitindo que a parte demandada possa requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio.

Veja o placar:

Já na ADIn 6.792, os quatro ministros reconheceram a existência de assédio judicial contra jornalistas.

Barroso adotou tese mais genérica quanto à possibilidade de danos morais decorrentes de matérias jornalísticas, baseando-se no critério da "malícia real". Segundo esse critério, apenas serão responsabilizados os jornalistas ou órgãos de imprensa que saibam da falsidade da notícia e a divulguem, ou que atuem com negligência na apuração dos fatos.

Em contrapartida, para Rosa Weber, o ato ilícito capaz de ensejar indenização pressupõe a veiculação de conteúdo que envolva ameaça, intimidação, incitação, discriminação, apologia ao ódio nacional, racial ou religioso, entre outras hipóteses.

Veja o resultado parcial:

 (Imagem: Antonio Augusto/SCO/STF)

STF voltou a julgar ajuizamento abusivo de ações contra imprensa.(Imagem: Antonio Augusto/SCO/STF)

Voto da relatora

Antes de se aposentar, a ministra Rosa Weber proferiu voto no plenário virtual. S. Exa. ressaltou que a jurisprudência do STF tem reiterado que a imposição de restrições à liberdade de expressão, opinião e manifestação do pensamento, fora dos limites da lei fundamental, é incompatível com os preceitos constitucionais e com o Estado Democrático de Direito.

Segundo a ministra, não há liberdade em uma sociedade onde a manifestação do pensamento está condicionada à autocontenção. Afirmou que a constante avaliação de riscos de represálias antes de manifestações críticas é uma forma silenciosa de censura.

Assim, julgou parcialmente procedente a ADIn 6.792 para estabelecer que o conteúdo da opinião, notícia, informação ou ideia capaz de configurar ato ilícito deve envolver ameaça, intimidação, incitação ou comando à discriminação, hostilidade ou violência, ainda que psicológica ou moral.

Também configura ilícito a disseminação deliberada de desinformação, manipulação de grupos vulneráveis, ataque doloso à reputação de pessoas ou apuração negligente de fatos, risco à segurança nacional, à ordem, à saúde ou à moral públicas, bem como propaganda favorável à guerra, guerra civil, insurreição armada ou violenta, ou apologia ao ódio nacional, racial ou religioso.

Quanto à ADIn 7.055, a ministra não conheceu do pedido. S. Exa. entendeu que a solicitação das partes iria além do que a técnica permite, pois não se trata de delimitar o sentido das normas à luz da Constituição, mas de criar uma nova regra de competência funcional não prevista originalmente nas normas questionadas.

Voto-vista

O ministro Luís Roberto Barroso, em seu voto-vista, afirmou que para superar a liberdade de expressão, impõe-se um ônus argumentativo maior a quem a questiona, pois se trata de um direito preferencial. Destacou que esse direito é essencial para a dignidade humana, a busca da verdade em uma sociedade aberta, a democracia e a participação informada dos cidadãos.

Barroso ressaltou que a atividade de imprensa é uma das poucas atividades privadas com proteção especial garantida pela CF. Reconheceu a existência de "assédio judicial", caracterizado pelo ajuizamento de múltiplas ações baseadas nos mesmos fatos, por um ou vários autores, contra a mesma pessoa, em diferentes foros, visando causar prejuízos, inclusive ao direito de defesa.

O ministro votou para reconhecer os pedidos das partes quanto ao foro competente e à reunião de processos. Entendeu que, uma vez caracterizado o assédio judicial, deve prevalecer como foro competente o do domicílio do réu, conforme a regra geral do CPC. Além disso, afirmou que é legítimo reunir as ações sobre o mesmo tema, como já previsto nas leis da ação popular, ação civil pública e improbidade administrativa.

Quanto aos pedidos de penhora e de danos morais e materiais - individuais e coletivos - o ministro votou por não acolhê-los, entendendo que esses temas já são tratados na legislação e dependem do caso concreto.

Barroso afirmou que, para a responsabilização de jornalistas e veículos de imprensa, deve ser adotado o critério universalizado pelo caso "New York Times Co. v. Sullivan", que envolve "malícia real" - a divulgação de uma notícia falsa sabendo da falsidade ou com negligência na apuração dos fatos. Essa tese também foi adotada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que afirma que só há responsabilidade em caso de dolo ou culpa grave na divulgação das notícias.

Ao final, seguido pelos ministros Zanin e Mendonça, o relator votou pela procedência parcial da ADIn 6.792 e pela procedência total da ADIn 7.055, propondo a seguinte tese:

"1. Constitui assédio judicial, comprometedor da liberdade de expressão, o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou o efeito de constranger jornalista, ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa.

2. Caracterizado o assédio judicial, a parte demandada poderá requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio.

3. A responsabilidade civil de jornalistas, ou de órgãos de imprensa, somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou de culpa grave."

Casos

A ADIn 6.792 foi ajuizada pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) pedindo que, nas ações de reparação de danos decorrentes do exercício da liberdade de expressão e de imprensa, onde se verifique assédio judicial, seja estabelecido o domicílio do réu como foro competente.

A ADIn 7.055 foi movida pela ABI (Associação Brasileira de Imprensa) contra o abuso de ações judiciais de reparação de danos materiais e morais com o intuito de impedir a atuação livre de jornalistas e órgãos de imprensa. A ABI afirmou que decisões estipulando indenizações no Brasil têm produzido um efeito silenciador da crítica pública, afrontando a liberdade de expressão e o direito à informação.

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