Violência obstétrica: Hospital que se negou a antecipar cesárea é condenado
Na sentença, o juízo considerou que violência obstétrica é toda a violação aos direitos humanos de mulheres e meninas praticado quando da prestação de serviço essencial e emergencial às parturientes.
Da Redação
quinta-feira, 7 de março de 2024
Atualizado às 14:23
A Justiça Federal condenou o Hospital de Clínicas, de Curitiba/PR, a pagar indenização por danos morais a uma mulher que sofreu violência obstétrica. A sentença foi proferida pela 1ª vara Federal de Curitiba.
A autora da ação relatou que durante todo o seu período gestacional, planejou junto aos médicos o seu parto na modalidade cesária, marcada para o dia 10/11/22. Contudo, na madrugada do dia 2/11, sentiu contrações e foi para o Hospital de Clínicas para realizar a cesárea, que lhe foi negada. Segundo a autora, ela tinha a autorização da médica para realizar a cirurgia de forma antecipada, caso precisasse.
Informou em seu pedido inicial que passou seis horas sentindo dores e não recebeu anestesia até o momento do nascimento de sua filha. Argumentou que foi vítima de violência obstétrica pelo desrespeito às escolhas e conveniências preestabelecidas no acompanhamento pré-natal, e que a experiência do nascimento de sua filha revelou-se uma traumática luta para fazer valer seus direitos e suas vontades, que não foram respeitadas, resultando no abalo moral sofrido, e pelo qual pretende ser indenizada.
Ao analisar o caso, o juízo expôs que a situação idealizada de uma programação prévia para cesárea foi alterada pelas circunstâncias. "Assim, tendo entrado em trabalho de parto espontaneamente na madrugada de 2/11/22, deixou de existir o cenário de cesárea eletiva e agendada, para data posterior ao período mínimo de 39 semanas de gestação."
"O atendimento foi realizado em caráter emergencial, após a recepção da autora no pronto-socorro do HC. Ainda que a autora tenha manifestado seu desejo de submeter-se à cirurgia, o relatório de atendimento revela que sua situação não se enquadrava nas hipóteses de escolha por preferência pessoal e o atendimento teve que ser adequado à situação real do momento", complementou a decisão.
Portanto, o direito à escolha do tipo de parto não foi observado por razões tecnicamente justificadas. "Logo, a pretensão indenizatória não pode ser acolhida, neste ponto", determinou o juízo.
Quanto à utilização de anestesia durante o trabalho de parto, a sentença reiterou que o direito da parturiente à tomada de decisão sobre a gestão de sua dor está previsto na lei estadual 19.701/18 e que não foi observado no caso concreto. "Logo, caracteriza-se o ato de violência obstétrica."
A sentença também observou o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, objeto da recomendação 128/22 do CNJ, que considera violência obstétrica toda a violação aos direitos humanos de mulheres e meninas praticado quando da prestação de serviço essencial e emergencial às parturientes.
"A violação configura dano moral 'in re ipsa', ou seja, dedutível apenas e tão-somente pela ocorrência do ilícito, já que o sofrimento decorrente dessa inobservância é presumível", finalizou.
O número do processo não foi divulgado pelo tribunal.
Informações: TRF da 4ª região.