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Supremo | Sessão

STF forma maioria para diferenciar tráfico de uso de maconha; Toffoli pede vista

Placar está em cinco a três para descriminalizar porte de maconha para uso pessoal. Maioria da Corte votou por estabelecer quantitativo que diferencie usuário de traficante.

Da Redação

quarta-feira, 6 de março de 2024

Atualizado em 7 de março de 2024 08:37

Em sessão plenária nesta quarta-feira, 6, ministro Dias Toffoli pediu vista de ação que analisa a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. No momento o placar está em cinco a três a favor da descriminalização e a Corte já formou maioria para estabelecer um quantitativo - ainda não definido - para diferenciar usuário de maconha de traficante.

A ação está no Supremo há quase dez anos. Antes do pedido de vista, apresentaram votos ministro André Mendonça e ministro Nunes Marques. 

Descriminalização

Ministros Gilmar Mendes (relator), Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Rosa Weber (atualmente aposentada) votaram para dar interpretação conforme à CF ao art. 28 da lei de drogas, invalidando o inciso II e considerando como administrativas as sanções previstas nos incisos I e III. Isso significa que os cinco ministros foram favoráveis à descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. 

Já os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques foram contrários à descriminalização da maconha.

Veja o placar:

Critério quantitativo

Todos os ministros votaram para estabelecer um critério quantitativo para distinguir o consumo pessoal e o tráfico de maconha. Assim, neste aspecto, o STF já tem maioria formada. Entretanto, os ministros ainda divergem a respeito das quantidades.

Ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Rosa Weber (atualmente aposentada) e Luís Roberto Barroso entendem que deve ser considerado consumo pessoal a quantidade de 60g ou de seis plantas fêmeas.

Ministro Edson Fachin entende que a quantidade deve ser definida pelo Legislativo. Ministros Cristiano Zanin e Nunes Marques entendem que a quantidade de 25g ou de seis plantas fêmeas são suficientes para distinguir consumo de tráfico.

Já ministro André Mendonça fixou a quantidade diferenciadora de 10g de maconha.

Confira o placar:

Esclarecimento inicial

Nesta tarde, o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, fez esclarecimento a respeito do que está sendo julgado pelo STF.

S. Exa. informou que a Corte deve definir a natureza do porte de maconha: trata-se de um crime, punido com medidas penais, ou um ilícito, com sanções administrativas? Ressaltou que não se trata da legalização, e que o consumo de drogas no Brasil continuará a ser ilegal. 

"As drogas não estão sendo, nem serão liberadas no país pelo STF. Legalizar é definição que cabe ao Legislativo, e não ao Judiciário."

A segunda questão enfrentada pelo Supremo, segundo ministro Barroso, será um critério objetivo para auxiliar policiais, e todos os integrantes do sistema de Justiça, a diferenciar o usuário do traficante com base na quantidade de droga encontrada. 

"Esse filme nós já assistimos e sabemos quem morre no final: o homem negro e pobre que porta 10g de maconha vai ser considerado traficante e enviado para a prisão. Já o homem branco, de bairro nobre, será considerado usuário e liberado. Portanto, o que está em jogo aqui é evitar a aplicação desigual da lei", concluiu.

Confira o trecho:

Voto-vista

Em seguida, ministro André Mendonça, ao iniciar seu voto, questionou a extensão de eventual descriminalização da maconha para uso próprio. O ministro entendeu que tal medida seria um sinal para "liberar" o consumo. 

"Há uma imagem falsa de que maconha não faz mal", afirmou Mendonça. S. Exa. mencionou estudos demonstrando efeitos nocivos, "ainda piores que os do cigarro", segundo Mendonça.

O ministro tratou dos prejuízos na saúde física e mental de adolescentes, jovens, gestantes e os riscos de seu uso por motoristas. Após apresentar uma série de dados, André Mendonça ressaltou que "fumar maconha é o primeiro passo para o precipício".

Ao final, ressaltou que a descriminalização é tarefa do legislador. Para o ministro, afastados os efeitos penais do uso e aplicadas medidas meramente administrativas, haveria dificuldade no estabelecimento de consequências. 

"Vamos jogar para um ilícito administrativo? Qual a autoridade administrativa? Não é para conduzir para delegacia? Quem vai aplicar a medida? Na prática, nós estamos liberando o uso", afirmou.

S. Exa também ressaltou que não se trata de vida privada, mas de danos sérios à saúde, aumento de suicídio, acidentes e do próprio uso. 

Assim, propôs que o art. 28 da lei de drogas seja declarado constitucional, e que em 180 dias o Congresso Nacional fixe critérios objetivos para diferenciar quem porta drogas para consumo pessoal de quem trafica. 

Ademais, ressaltou que, se presentes outros elementos que levem ao entendimento de que, no caso, existe tráfico, é possível que fundamentação idônea da autoridade judicial afaste a presunção de porte para uso próprio.

Ao final votou para que, até deliberação do Congresso Nacional, seja conferida interpretação conforme ao art. 28, II, da lei de drogas para definir usuário como aquele que porta até 10g de maconha - o equivalente a 36 cigarros. 

No caso concreto, entretanto, votou pela improcedência do pedido. Apesar de o réu, na ação, portar 3 g da substância, o fato de ter sido pego com a maconha na cadeia levou o ministro a não prover o pedido da Defensoria.  

Confira o voto e a tese do ministro:

Competência legislativa

Para o ministro Nunes Marques, o argumento da Defensoria de que o uso de drogas é decisão que afeta o sujeito no âmbito privado está no plano sutil do debate ético, filosófico e político, e não apresenta pertinência jurídica, ainda mais perante lei vigente há mais de dez anos, que tem o escopo de reduzir danos e coibir o tráfico.

S. Exa. entendeu que não deve haver uma reorientação radical da jurisprudência da Corte sem a existência de alteração fática ou jurídica relevante que justifique a revisão da matéria.

Segundo o ministro, o Legislativo é o local adequado para o debate do tema, o qual é complexo, multifacetário, demandando reflexão. Acresceu que a discussão não foi solucionada pela sociedade brasileira, portanto, eventual abolitio criminis deve ser analisada pelo Congresso Nacional.

Ao final, negou provimento ao RE e encaminhou voto no mesmo sentido do ministro Cristiano Zanin, pela não descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e pelo estabelecimento de 25g, ou seis plantas fêmeas, como quantidade diferenciadora entre usuário e traficante.

Pedido de vista

Após pedir vista da ação, ministro Dias Toffoli disse que a lei determina que cabe à Anvisa estabelecer quais substâncias são lícitas ou ilícitas.

S. Exa. afirmou que não tem noção da quantidade que poderia ser considerada ilícita para uso da maconha. Nesse sentido, pontuou que caberia ao legislador e ao Executivo, via agências reguladoras, tutelar o tema.

"É muito fácil eles lavarem as mãos e jogarem para nós a responsabilidade", completou.

Ministro Barroso respondeu que, segundo a lei, o consumo pessoal não deveria ser punido com pena de prisão. Assim, segundo S. Exa., como as pessoas vêm sendo presas, é necessário que o STF se manifeste acerca da quantidade que identifica consumo ou tráfico.

Ministro Alexandre de Moraes ressaltou que caberá à ciência médica dizer a quantidade que fará mal, ou menos mal ao usuário. Ao STF, afirmou Moraes, cabe estabelecer quantidades para evitar o arbítrio e a diferenciação que acontece, atualmente, quando da apreensão de entorpecentes com pessoas de classes sociais distintas. 

Confira:

Caso

O RE 635.659 discute a constitucionalidade do art. 28 da lei de drogas (11.343/06), o qual tipifica como crime o porte de drogas para consumo pessoal. 

No caso dos autos, um homem foi condenado pela Justiça paulista à prestação de dois meses de serviços à comunidade por portar três gramas de maconha para consumo próprio.

A DPE/SP, que representa o condenado, sustenta que essa tipificação penal ofende o princípio da intimidade e vida privada, previsto no art. 5º, X, da CF/88

Alega, também, que não há lesividade na hipótese do porte de drogas para uso próprio, uma vez que tal conduta não afronta a saúde pública (objeto jurídico do delito de tráfico), "mas apenas, e quando muito, a saúde do próprio usuário".