TJ/RS: Médico não indenizará por chamar juíza de "desgraçada" em live
Colegiado reformou sentença por entender que fala do médico não ofendeu honra da magistrada.
Da Redação
quinta-feira, 9 de novembro de 2023
Atualizado em 10 de novembro de 2023 11:20
TJ/RS entendeu que uso do termo "desgraçada" por médico em live no Instagram não configura ofensa à honra de juíza, tratando-se de exercício de liberdade de expressão.
Ao reformar sentença que concedera indenização por danos morais de R$ 40 mil à juíza, relator do acórdão, desembargador Gelson Rolim Stocker, da 6ª câmara Cível do TJ/RS, afirmou que o réu não ofendeu a honra ou incitou violência contra a magistrada.
Suspensão de aulas
Consta dos autos que durante suas férias, a magistrada foi substituída por uma colega de trabalho. Durante este período, a juíza substituta deferiu liminares em três processos para suspender decreto do Estado do Rio Grande do Sul que autorizava a retomada de aulas presenciais em escolas públicas e privadas no período da pandemia.
Ao retornar do descanso, a magistrada conta que avaliou pedido do Estado de reconsideração das liminares, mas o indeferiu, mantendo a suspensão das aulas presenciais.
Após a decisão, a juíza relata que ocorreram manifestações populares em frente a sua residência.
Posteriormente, durante live no Instagram, o médico, ao tratar da necessidade de manutenção das aulas durante a pandemia, afirmou: "tem que fazer movimento na casa dela o dia inteiro para não deixar dormir, essa desgraçada".
A magistrada entendeu que as ofensas foram dirigidas a ela, em transmissão vista por mais de 57 mil pessoas, em perfil público com mais de 1,2 milhões de seguidores.
Por isso, ajuizou ação por danos morais contra o médico, alegando ataque à honra, imagem, intimidade e vida privada, pois ele teria extrapolado o direito à livre manifestação e à crítica, devendo indenizá-la por danos morais e realizar retratação pública.
Decisão
Em 1ª instância a demanda foi julgada procedente, condenando o médico a pagar R$ 40 mil e a desculpar-se via Instagram.
O profissional de saúde recorreu da decisão, alegando que a sentença foi uma forma de censura indireta, servindo de "mola propulsora para desencorajar as pessoas que possuem opiniões firmes, fortes e contrárias a determinado assunto a manifestá-las em público".
Pontuou ainda que o termo "desgraçada" não constitui injúria ou elemento capaz de causar dano à honra de alguém, pois não possui "conotação agressiva e ofensiva", apenas exprimindo desprezo quanto à decisão da magistrada não quanto a sua pessoa.
Reforma
Ao analisar o recurso, o desembargador relator pontuou que a live não produziu ou incitou atos de violência à magistrada, pois realizada após as manifestações em frente à casa da juíza.
Ressaltou que a julgadora é figura pública e que pode sofrer críticas a sua atuação.
Acrescenta que os temas relativos à Covid, à época, "tomavam elevada proporção, para ambos os lados" e que o país passava por momento político marcado por dualidades. Entendeu, que a juíza "estava ciente de toda a comoção que sua decisão geraria".
Ao final, afirmou que a liberdade de expressão não é livre e absoluta, mas que, no contexto da live, a frase pode ter soado como "grosseira, descortês, selvática [...], mas reflete manifestação do pensamento, verdadeira crítica a respeito da decisão proferida, defesa de posição política, mas não pontual ofensa aos direitos da personalidade".
Entendendo que não houve intenção de ofensa pessoal à juíza ou de estimular atos de ódio contra ela, decidiu que a sentença merecia reforma, sendo improcedente os pedidos da magistrada.
O médico foi defendido pelo escritório Rech, Moraes, Oliveira & Advogados Associados.
Veja o acórdão.
- Processo: 5133649-79.2021.8.21.0001