STJ: Preso que recusa comida suspeita não comete falta grave
Ministro Ribeiro Dantas afirmou ainda que a rejeição à comida duvidosa está ligada à obrigação do Estado em proporcionar alimentação adequada.
Da Redação
domingo, 5 de novembro de 2023
Atualizado às 09:18
Não configura falta grave a conduta do preso que recusa alimento por considerá-lo impróprio para o consumo. Assim decidiu a 5ª turma do STJ ao considerar que, se o detento se comportou de forma pacífica, sem ameaçar a segurança do ambiente carcerário, sua atitude apenas representa o exercício do direito à liberdade de expressão, à saúde e à alimentação.
De acordo com o processo, os agentes penitenciários conferiram os alimentos e entenderam que eles estavam bons para o consumo, mas um grupo de detentos se recusou a receber a comida nas celas. Ouvido em sindicância, um dos presos afirmou que a recusa tinha o objetivo de provocar a melhoria das condições de alimentação no presídio. O diretor da unidade classificou a conduta do preso como falta disciplinar de natureza grave.
A punição ao detento foi determinada pelo juízo da execução penal e mantida pelo tribunal estadual, sob o entendimento de que a conduta se enquadraria no artigo 50, inciso I, da lei 7.210/84 (incitação ou participação em movimento para subverter a ordem ou a disciplina).
Alimentos julgados impróprios
O ministro Ribeiro Dantas, relator do caso no STJ, apontou que uma "greve de fome" realizada por detentos pode, em determinadas situações, caracterizar a falta grave prevista no artigo 50 da lei 7.210/84, especialmente se o movimento resultar na configuração do crime de motim de presos (art. 354 do CP) ou de dano ao patrimônio público (art. 163 do CP).
"Em tais situações, a recusa deliberada em se alimentar pode ser considerada parte de um movimento que busca subverter a ordem ou a disciplina no estabelecimento prisional, sujeitando os envolvidos às sanções correspondentes."
Por outro lado, o ministro observou que não há caracterização de falta grave apenas pela recusa do detento em aceitar a comida tida por ele como imprópria para o consumo, tendo em vista que o ordenamento jurídico não obriga um preso a ingerir alimentos em circunstâncias que considera inadequadas.
Alimentação digna é direito básico
Segundo Ribeiro Dantas, a entrega de alimentos sem condições adequadas tira do indivíduo já privado de liberdade o direito básico à alimentação digna, representando uma afronta direta à sua integridade física e mental. É um fato que, em última análise, ameaça a saúde e o bem-estar do detento, contrariando princípios consagrados na Constituição, disse o relator.
Ao afastar a falta grave, o ministro afirmou ainda que a rejeição à comida duvidosa está intrinsecamente ligada à obrigação estatal de proporcionar alimentação adequada e suficiente no presídio, e também diz respeito à obrigatoriedade de assistência material e à saúde do detento.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Informações: STJ.