Para juíza, não há fraude processual em uso de jurimetria pela Uber
Magistrada entendeu aceitável utilização de técnica estatística para ponderação de riscos processuais.
Da Redação
quarta-feira, 1 de novembro de 2023
Atualizado às 18:09
Uso de jurimetria pela Uber não configura fraude processual. Decisão é da juíza do Trabalho Sandra Maria Generoso Thomaz Leidecker, da 32ª vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG. Segundo a magistrada, uso da tecnologia é admitido no ordenamento jurídico e forma prudente de avaliar riscos processuais.
No caso, o MPT ajuizou ação civil pública contra a Uber alegando que a empresa faria uso fraudulento de jurimetria para manipular jurisprudência e impedir formação de decisões contrárias a seus interesses.
O parquet argumentou que os acordos celebrados pela Uber utilizaram dados estatísticos baseados em resultados de julgamentos de diversos órgãos jurisdicionais, o que ocasionaria a manipulação da formação da jurisprudência, prejudicando a coletividade.
Assim, para o MPT, a empresa violaria os princípios constitucionais do juiz natural, devido processo legal, ampla defesa, contraditório, lealdade e boa-fé, comprometendo a função do Judiciário.
Tecnologia é parte da realidade
Em sentença, a magistrada relembrou que a jurimetria é um método de investigação jurídica que utiliza técnicas estatísticas e computacionais para analisar a experiência jurídica, acompanhando processos e jurisprudência de tribunais.
A julgadora considerou que, para um mesmo fato ou norma jurídica, podem existir interpretações diversas do julgador a depender da distribuição do processo. Ademais, no sistema da civil law, adotado pelo Brasil, a criação de jurisprudência não gera, necessariamente, a obrigatoriedade de que outros órgãos julgadores sigam a mesma tendência.
Tais características, afirmou a magistrada, tornam inócua a alegação de que o Judiciário seria lesado pelo uso da jurimetria. Além disso, a juíza pontuou que a oferta de acordos a partir da análise de risco feita com resultados da técnica não fera a legislação brasileira.
"Não se pode olvidar que, na atualidade, a tecnologia faz parte, em menor ou maior escala, do cotidiano de todos. Não seria diferente no ramo jurídico, o qual não pode ignorar a realidade. Não se mostra razoável, no mundo moderno, quedar-se alheio ou insurgir-se contra movimento que já se apresenta de forma permanente no cotidiano dos aplicadores do direito", completou.
Ponderação de riscos
A juíza destacou que a estratégia da Uber não é inovadora, nem distante da utilizada por outros grandes litigantes. Desde sempre advogados diligentes utilizam técnicas do gênero para orientar a clientela, frisou a magistrada.
Assim, entendeu que é prudente e aceitável que empresas analisem riscos de êxito nos processos, considerando os gastos envolvidos, o que não caracteriza manipulação.
"A ponderação dos riscos deve - ou ao menos deveria - ser feita por todas as partes envolvidas em um processo, pois a incerteza de sucesso da demanda abrange também a parte reclamante. A partir disso, feita tal análise inicial de viabilidade de sucesso ou não na demanda, o que este juízo constata é que a ré acrescentou outra variante à sua análise: a probabilidade de êxito em segundo grau, análise aprimorada e otimizada por meio da jurimetria."
Ao final, julgou improcedente o pedido do MPT, não acolhendo a alegação de que a Uber estaria impedindo a pacificação, uniformidade e estabilidade da jurisprudência e causando prejuízos à segurança jurídica e à coerência das decisões.
O escritório Silva Matos Advogados defendeu a Uber.
Veja a sentença.
- Processo: 0010531-94.2023.5.03.0111