Para advogada, penhora de salário por dívidas pode destravar execuções
Especialista avalia que, embora medida demande cautela, pode ser oportunidade para promover educação financeira.
Da Redação
sábado, 5 de agosto de 2023
Atualizado às 13:46
O endividamento dos brasileiros alcançou o maior nível histórico já registrado: 77,9% da população, segundo dados da CNC - Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Levantamento do Serasa mostra ainda que 64,43 milhões de pessoas entraram em 2023 com o nome restrito. Não há dados oficiais sobre quantas dessas dívidas acabam virando execuções judiciais, mas de acordo com a advogada e especialista em Processo Civil Renata Martins Belmonte, do escritório Albuquerque Melo Advogados, os credores acionam a Justiça quando as cobranças extrajudiciais não surtem efeito, levando à busca de bens para a quitação dos valores devidos.
Decisão recente da Corte Especial do STJ trouxe um elemento a mais em favor dos credores: flexibilizou o salário do devedor, historicamente protegido e considerado até então impenhorável - exceto nos casos de pensão alimentícia. O caráter da decisão, embora seja considerado excepcional, abriu uma nova possibilidade.
Segundo explica a advogada, a penhora do salário está no final da lista, mas trata-se de um movimento necessário, que acompanha a evolução e a maturidade da sociedade.
"É do salário que decorrem os rendimentos da maioria das pessoas e, logo, impedir a sua penhora, sem a análise do cenário como um todo, prestigia apenas o devedor."
A especialista esclarece, entretanto, que a medida é uma exceção e deve levar em conta a situação econômica do devedor e o percentual que não comprometerá a sua subsistência e de sua família.
"Para chegar a essa medida, o credor deverá tentar satisfazer seus créditos de outra forma, buscando meios que sejam menos danosos ao devedor. Todavia, quando nada é localizado, tem-se entendido pela mitigação da regra de impenhorabilidade."
Em sua visão, esta flexibilização deve ser uma tendência dos tribunais. "A mitigação da regra, de forma ordenada e com uma análise crítica e atenta ao caso concreto, é o caminho para destravar as execuções", opina a advogada. Segundo ela, a definição de quanto pode ser penhorado não é fixada em lei, e deve ser feita pelo juiz, caso a caso.
Para Renata, a medida pode ajudar na educação financeira da população, além punir, de fato, aqueles que são devedores contumazes. Para reconhecê-los, a Justiça recorre às únicas ferramentas oficiais à sua disposição: os cadastros de inadimplentes e os cartórios que registram protestos.
"Mas é muito fácil identificar um devedor como este: em regra, existem várias ações de cobrança/execução contra ele. Outro indício é o fato de o devedor não ter absolutamente nada em seu nome, incluindo contas bancárias, manobra comumente utilizada para dificultar, de fato, que qualquer credor alcance seus bens."
Ademais, a advogada ressalta que, por se tratar de garantia constitucional, a penhora ou não dos salários pode chegar ao STF.
"Uma vez que a Constituição Federal prevê a proteção salarial, o que se pretenderá discutir é a constitucionalidade das decisões que estão mitigando essa regra. É interessante recordar, todavia, que o próprio CPC já previa duas hipóteses de mitigação: o pagamento de pensão alimentícia, bem como rendimentos acima de 50 salários-mínimos mensais", conclui.