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Entrevista exclusiva

Tony Garcia: O "agente infiltrado" a serviço da República de Curitiba

Empresário diz que foi forçado a cometer ilegalidades e que foi usado pelo ex-juiz e MPF para gravar pessoas.

Da Redação

terça-feira, 18 de julho de 2023

Atualizado às 15:02

A força-tarefa da Lava Jato pode ter acabado. Mas as histórias mirabolantes que envolvem a chamada "República de Curitiba" ainda vão dar muito pano pra manga. 

E é exatamente uma destas histórias que apresentamos hoje.

Um polêmico e conhecido empresário curitibano, Antônio Celso Garcia, conhecido apenas como Tony Garcia, tem surgido no noticiário com informações que datam antes mesmo da Lava Jato. 

Seriam apenas histórias de 20 anos atrás, não fosse o fato de que ele possui áudios que comprovam, indubitavelmente, a proximidade com o então juiz Moro e com os procuradores da famosa operação.  

Em entrevista exclusiva ao site Migalhas, ele narra como se tornou uma espécie de "agente infiltrado" do grupo do Paraná, em 2004 e, desde então, teria sido usado para gravar pessoas.

 (Imagem: Arte Migalhas)

Em entrevista ao Migalhas, Tony afirma que atuou como informante de Sergio Moro e procuradores.(Imagem: Arte Migalhas)

Tony Garcia, que era investigado num processo, e teria firmado um arremedo de acordo de colaboração (que na época, 2004, nem existia na lei), diz que sofreu uma série de ilegalidades.

O "modus operandi" aplicado a ele seria, segundo o próprio, um "laboratório" para o que foi feito, posteriormente, na Lava Jato.

E, ironicamente, com o mesmo gravador que gravava pessoas para cumprir o acordo, Tony decidiu gravar o próprio juiz e os procuradores. Agora, os áudios vêm à tona, e mostram uma relação absolutamente imprópria, para dizer o mínimo, entre réu e acusador, e réu e julgador.

Vale frisar: a reportagem foi construída a partir dos relatos de Tony Garcia. E o que é fato ou boato, caberá à Justiça dizer.

Como se verá adiante, há alguma verossimilhança nas declarações, haja vista que o Supremo Tribunal Federal deliberou ouvi-lo. Nesse sentido, percebe-se que o caso merece ser investigado. 

Acompanhe, abaixo, como esta história se desenrola.

O personagem e a introdução

Tony Garcia é empresário e ex-deputado estadual do Paraná. Ele foi preso em 2004, por ordem de Sergio Moro, acusado de gestão fraudulenta de um consórcio intitulado Garibaldi.

Ao Migalhas, Tony Garcia afirma inocência. Segundo ele, Sergio Moro teria "criado" uma situação para envolvê-lo no processo, sendo que o verdadeiro alvo era o advogado de Tony, Roberto Bertholdo - haveria uma suspeita, pelo grupo de Curitiba, de que o causídico poderia estar envolvido em ilegalidades.

Tony conta que foi flagrado numa escuta telefônica em conversa com seus advogados, traçando uma estratégia, fato que foi considerado como "obstrução de justiça". Preso na PF, que na época era no bairro Alto da Glória, diz que foi colocado num calabouço. E, de fato, Migalhas apurou que as celas na então sede da PF ficavam no subsolo, o que dava um aspecto de calabouço. 

Assista ao primeiro trecho da entrevista: 

Após aceitar fechar o acordo, mas sem ainda conhecer os termos, Tony conta que foi transferido para o COP - Centro de Operações Policiais Especiais.

Ali, ele diz ter recebido uma visita "informal" do juiz Sergio Moro, que o orienta a comprar um gravador. 

Ao todo, sua prisão duraria 81 dias. Depois disso, seu contato com a força-tarefa seria como informante.

Confira a segunda parte da entrevista: 

"Trabalho sujo"

Quando enfim firma o acordo, o que ali se vê eram missões a cumprir, como um "agente infiltrado". Ainda segundo seu relato, as missões nada tinham a ver com o caso pelo qual ele estaria sendo acusado. 

Áudios de conversas gravadas por Antonio Garcia têm sido publicados por ele no Twitter.

Em sua rede social, o empresário mostra um trecho em que é possível ouvir uma conversa amistosa entre réu e juiz, o qual reproduzimos abaixo, exatamente como publicado por ele.

Ouça:

"Retomando"

Tony Garcia também falou ao Migalhas como aconteciam os depoimentos em Curitiba. "Quando eu falava uma palavra que não interessava para o Moro, ele desligava o gravador."

Veja:

O segundo acordo

A partir de 2004, ele era figura frequente no MPF, colaborando em vários casos, como um informante.

Em 2014, Tony Garcia oferece ao MPF uma gravação, que supostamente incriminaria o chefe de gabinete do governador do Paraná, Beto Richa. Os procuradores recusam, diz ele, sob o argumento de que o caso não era Federal. Tony Garcia não dá notícia, mas pelo visto o MPF se esqueceu de avisar o órgão competente acerca da notícia-crime que lhes chegou às mãos.

Em 2018, ele delibera entregar o áudio que envolveria o governador, gravado quatro anos antes, ao Gaeco, órgão do MP/PR. Neste momento, ao saber disso, o MPF volta atrás e se interessa pelo material.

Assim, para se livrar de um suposto envolvimento num terceiro caso, Tony Garcia condiciona a entrega da gravação à assinatura de um "segundo acordo".

Segundo Tony, essa seria sua "alforria" da força-tarefa.

O MPF concorda e o acordo é firmado.

Competência do STF

Tempos depois, um dos procuradores entra com pedido de quebra de acordo, afirmando que Tony Garcia mentiu em depoimento. Diante desta situação, ele pede uma audiência e conta à juíza Gabriela Hardt todas as ilegalidades que teria sofrido, desde 2004. Segundo ele, a juíza ("com cara debochada", em suas palavras) teria ignorado solenemente as provas.

Em novembro de 2022, Gabriela Hardt dá decisão rompendo o acordo de Tony Garcia com o MPF.

Em fevereiro de 2023, o juiz Eduardo Appio assume a 13ª vara de Curitiba, tem acesso às acusações que Tony fez em juízo, e, por envolver pessoas com foro por prerrogativa de função, remete o caso ao STF. O feito é distribuído ao ministro Lewandowski. Futuramente, com a aposentadoria do ministro, o caso foi para as mãos de Dias Toffoli, que assumiu os processos de Lewandowski na 2ª turma.  

Em maio, Eduardo Appio é afastado da vara de Curitiba, pois teria feito uma trapalhada digna de um pastelão hollywoodiano.

Gabriela Hardt reassume caso, desfaz o ato de Appio, de remeter o caso ao Supremo, e convoca audiência. Ato contínuo, a juíza se declara suspeita.

O feito final foi de Dias Toffoli, que reconhece a competência do STF para julgar o caso, suspende o que está nas instâncias inferiores e autoriza oitiva de Tony Garcia.

A decisão de Toffoli, proferida em 30 de junho, dá 30 dias para a oitiva de Tony Garcia. Ou seja, o depoimento está na iminência de acontecer.

De acordo com a decisão, Antônio Celso Garcia será ouvido por um delegado da Polícia Federal designado por Toffoli, em oitiva por videoconferência ou presencial, em uma das salas de audiência da Suprema Corte, e será acompanhada por magistrado auxiliar do gabinete do ministro, podendo também participar um procurador da República designado pelo PGR, além de advogado de Tony Garcia.

Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.

A depender do histórico de Curitiba, ninguém duvide que mais coisas incríveis possam surgir.

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