CNJ aposenta juiz Marcos Scalercio, acusado de assédio sexual
A decisão entre os conselheiros foi unânime.
Da Redação
terça-feira, 23 de maio de 2023
Atualizado em 24 de maio de 2023 07:24
Nesta terça-feira, 23, o plenário do CNJ, em decisão unânime, aposentou compulsoriamente o juiz Marcos Scalercio, acusado de assédio e importunação sexual.
O PAD contra o magistrado foi aberto em setembro de 2022. Na ocasião, ele também foi afastado das funções jurisdicionais.
Confira, no vídeo abaixo, alguns momentos relevantes do extenso julgamento:
Relembre
Ao menos 22 mulheres relatam terem sofrido assédio sexual por parte do juiz do Trabalho substituto Marcos Scalercio, do TRT da 2ª região, entre 2014 e 2020. O magistrado, que também dava aulas no Damásio, famoso cursinho preparatório para concursos e OAB, é acusado de beijos e agarrões à força, pedido de fotos e assédio na webcam.
Os episódios de assédio teriam ocorrido dentro do gabinete do magistrado, no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, e em cafeteria próxima ao cursinho. Outras vítimas teriam relatado assédio por meio de redes sociais.
Três dessas mulheres procuraram a ONG Mee Too, que oferece assistência jurídica gratuita a mulheres vítimas de violência sexual. A instituição levou as acusações à Justiça.
Em seu voto na sessão de hoje, a relatora do caso, conselheira Salise Sanchotene, invocou o protocolo com perspectiva de gênero do CNJ, considerou que há indícios de que os assédios ocorreram e citou um "padrão de comportamento prolongado" por parte do juiz.
"Assim como ocorre em processos judiciais, afirmo que o conteúdo das mensagens, dos prints, não deve servir de prova única para, por si só, formar a convicção do julgador para eventual condenação. Mas, por outro lado, em apuração de condutas com conotação sexual, que normalmente ocorrem às ocultas, a jurisprudência é firme em conferir especial relevo ao depoimento da vítima e, portanto, não há como destacar de pronto as mensagens juntadas aos autos pelo simples fato de não terem sido periciadas. Se a fala da vítima é prestigiada, com mais razões devem ser examinados os documentos juntados que possam comprovar, ou ao menos compor, o conjunto da prática do ilícito."
Segundo Sanchotene, avaliando o caso de uma das vítimas, conversas indesejadas sobre sexo, anedotas ou expressões com conotações sexuais e pressões para encontros e saídas são comportamentos que caracterizam assédio.
"O comportamento do requerido no âmbito privado violou o dever de integridade pessoal e profissional, o dever de cortesia e a dignidade, a honra e o decoro de suas funções."
Mais adiante, a conselheira destacou o caso de outra vítima, que teria sido beijada e apalpada pelo juiz em uma cafeteria.
"Em maior grau de reprovabilidade em relação a primeira imputação, os fatos relacionados a vítima 2 envolveram, além dos diálogos invasivos, toques físicos e prejuízos concretos a atividade profissional da advogada. Desse modo, concluo que o comportamento do requerido no âmbito privado violou o dever de integridade pessoal e profissional, o dever de cortesia e a dignidade, a honra e o decoro de suas funções."
Ato contínuo, Salise citou o ocorrido com a terceira vítima, que teria sido beijada e agarrada à força.
"A expertise técnica e o currículo apresentado absolutamente não impedem o cometimento de ilícitos administrativos dessa natureza, tampouco podem compensar ou servir de atenuante para as condutas dos autos, que em nada se referem a produtividade ou conhecimento jurídico, e sim a padrão de conduta incompatível com o cargo. A conduta praticada dentro do Poder Judiciário, em horário de trabalho, com contato físico de caráter sexual não consentido, foi comprovada nos autos e merece veemente repreensão."
Perspectiva de gênero
Presidente do CNJ, ministra Rosa Weber disse que o caso é "paradigmático" por refletir "uma sociedade estruturalmente machista, que invisibiliza as mulheres e, mais do que isso, as silencia pelos constrangimentos que a elas impõe".
"Eu lamento que a nossa legislação permita manter os vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. O que mais dói neste processo é que as condutas eram adotadas e se invocava a condição de magistrado. Eu posso por que sou juiz."
"Se esse juiz é tarado a esse ponto, a pena de aposentadoria compulsória é pouca", ressaltou o conselheiro Marcello Terto e Silva. "As condutas são gravíssimas, inadmissíveis e vergonhosas para a magistratura", completou Richard Pae Kim.
Ao acompanhar integralmente a relatora, Giovanni Olson afirmou que Scalercio agiu mal como magistrado e como professor. "A prova é farta e chega a ser reduntante em alguns aspectos."
A fala foi endossada por Sidney Madruga: "Não foi um fato isolado. Muito pelo contrário."
- Processo: 0006667-60.2022.2.00.0000