STF derruba lei que prevê arquivamento de material genético; veja tese
Como a norma não chegou a ser aplicada, não há material genético para descarte.
Da Redação
quinta-feira, 13 de abril de 2023
Atualizado às 15:49
Nesta quinta-feira, 13, o STF invalidou dispositivos de lei do Estado do Rio de Janeiro que obriga hospitais a coletarem, compulsoriamente, material genético de mães e bebês no momento do parto e a manter os dados arquivados, à disposição da Justiça, para resolver dúvida sobre possível troca de recém-nascidos. Por unanimidade, o Supremo concluiu que a norma fluminense afronta diretamente os princípios da privacidade e da intimidade.
Sobre o tema, foi fixada a seguinte tese:
"É inconstitucional a lei estadual que preveja o arquivamento de materiais genéticos de nascituros e parturientes em unidades de saúde com fim de realizar exame de DNA comparativo em caso de dúvida."
O caso
No STF, a PGR questionou lei do Estado do Rio de Janeiro que obriga hospitais, casas de saúde e maternidades a coletar material genético de mães e bebês, no momento do parto, para arquivamento.
Os arts. 1º, parte final, e 2º, inciso III, da lei estadual 3.990/02, determinam o armazenamento do material genético na unidade de saúde, à disposição da Justiça, em caso de dúvida quanto a possível troca de bebês, como medida de segurança.
Para o autor da ação, a norma viola os direitos fundamentais à proteção da privacidade e da intimidade e ao devido processo legal. Alegou, ainda, que a norma não exige consentimento prévio formal da mãe para realizar tais medidas, nem veda o uso do material para outros fins.
Assim, a PGR afirma que o benefício da lei é duvidoso e ofende o princípio da proporcionalidade, em sua dimensão de proibição de excesso e de medidas estatais gravosas desnecessárias.
Lei inconstitucional
Na sessão passada, ao votar, o ministro Luiz Fux, relator do caso, explicou que a manipulação desse tipo de dados envolve questões bioéticas, relacionadas a posse ou processamento de DNA de terceiros. E, segundo S. Exa., "os dados genéticos, configuram-se como dados sensíveis ao ordenamento jurídico brasileiro, o que exige que recebam uma tutela jurídica mais cuidados por parte do Poder Público".
"Esses dados sensíveis afetam o núcleo mais profundo da intimidade das pessoas, representando um risco maior à privacidade de que os dados pessoais comuns."
O relator asseverou, ainda, que a norma impugnada ao impor a coleta compulsória e armazenar amostras de DNA de mães e recém-nascidos independentemente de consentimento prévio, afronta diretamente os princípios da privacidade e da intimidade. Assim, em seu entendimento, coletar e armazenar o material genético na sala de parto revelam-se absolutamente inadequados a assegurar a proteção da identidade genética.
"A manipulação irresponsável dos dados de DNA gera expressos perigos, que inspiram redobrado cuidado em relação ao tratamento conferido aos elementos genéticos da população. Ademais, como a informação genética é única (..), essa informação de caráter pessoal assume relevantíssima importância."
Segundo o relator, a manipulação irresponsável de dados de DNA pode ocasionar uma série de violações a direitos fundamentais, e a falta de mecanismos de controle torna a norma estadual uma carta branca para possível utilização futura desses dados sem autorização.
No mais, para o ministro, a regra também é ineficaz para evitar a troca de bebês no nascimento. S. Exa. lembrou que as medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90) - coleta de impressão da planta do pé do recém-nascido e da digital da mãe - são mais proporcionais e desejáveis. Salientou, ainda, que as recomendações mais recentes são de que o material genético seja coletado quando ocorrer a dúvida sobre a eventual troca.
Nesse sentido, votou no sentido de declarar a inconstitucionalidade do dispositivo.
Na ocasião, os ministros André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso acompanharam o entendimento.
Critério inadequado
"A norma certamente não atende ao critério de adequação", afirmou o ministro Gilmar Mendes ao acompanhar o voto do relator. Segundo S. Exa., o dispositivo contraria a recomendação médica acerca do procedimento para investigação paterna e filial, bem como não traz segurança para a própria identificação, uma vez que o material genético pode ser trocado.
"Não há qualquer garantia positivada de que o material não seja utilizado para fins diversos do previsto em lei."
Nesta tarde, também votaram as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber e o ministro Edson Fachin para acompanhar a vertente.
- Processo: ADIn 5.545