STJ julga se sindicato indenizará magistrado por apontar nepotismo
Sindicato acionou o CNJ denunciando possível prática de nepotismo em caso de desembargador que indicou sua cunhada a chefe de gabinete, mas foi condenado por danos morais em ação movida pelo magistrado.
Da Redação
terça-feira, 21 de março de 2023
Atualizado às 12:42
A 3ª turma do STJ começou a julgar responsabilidade civil de sindicato que informou ao CNJ suspeita de prática de nepotismo de magistrado ao indicar irmã de sua namorada à chefia do gabinete. O TJ/RJ condenou o sindicado em R$ 50 mil de indenização por danos morais.
Para a ministra Nancy, relatora, a condenação não é lícita, pois o sindicato tem o dever constitucional de informar indícios de irregularidade ao CNJ. Já para o ministro Marco Aurélio Bellizze, o sindicato não demonstrou as suspeitas e deve, sim, indenizar. O ministro Moura Ribeiro pediu vista, suspendendo o julgamento.
Segundo colhe-se do quadro fático traçado pelas instâncias de origem, o sindicato de servidores do Poder Judiciário do RJ informou ao CNJ acerca da existência de indícios da prática de nepotismo pelo desembargador do TJ/RJ Luciano Silva Barreto devido à nomeação de Celeste Magalhães para exercer cargo de chefe de gabinete
As informações apontavam para a existência de relacionamento entre o desembargador e a irmã de Celeste, bem como que o comparecimento da nomeada ao gabinete seria apenas de 15 em 15 dias.
O inteiro teor da denúncia foi reproduzido em revista editada pelo sindicato com a omissão dos nomes, que foram substituídos por letras "X".
Após a denúncia ou CNJ, o magistrado e a chefe de gabinete moveram, e venceram, uma ação indenizatória que condenou o sindicato ao pagamento de R$ 50 mil por ausência de apuração da denúncia, "submetendo ao casal à necessidade de formulação de defesa por denúncia infundada".
Ao STJ, a defesa do sindicato alegou que não sabia se o casal gostaria de constituir família ou se havia algum impedimento para o casamento, mas "cumprindo seu dever constitucional de zelar pela carreira dos servidores que representa, o sindicado reportou o caso ao CNJ, supondo na relação uma união estável e, portanto, a hipótese de nepotismo".
Dever constitucional
A relatora, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que a Administração Pública está sujeita a diversas espécies de controle, entre as quais se destaca o controle interno, que é aquele exercido por órgão integrante do mesmo Poder, do qual emanou o ato objeto do controle.
"O controle tem por finalidade assegurar que a Administração atue em consonância com os princípios que lhes são impostos pelo ornamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação e impessoalidade. No âmbito do Poder Judiciário, o controle interno é desempenhado pelo CNJ, pelos conselhos superiores, pelas corregedorias e pelas ouvidorias. O propósito desses órgãos é reprimir e prevenir eventuais ilícitos praticados por magistrados no exercício da função, bem como conferir maior eficiência e efetividade à prestação jurisdicional."
Para a ministra, havendo indícios de irregularidade perpetrada por membro do Poder Judiciário, o sindicato tem a incumbência de comunicar o fato ao CNJ, ao qual competirá averiguar a efetiva ocorrência do ato contrário à lei ou aos princípios que regem a Administração.
A ministra ainda destacou que o STJ já se manifestou no sentido de que não há como concluir que o ato de representar qualquer magistrado ao CNJ com fundamento em notícias circuladas pela imprensa local, possa causar, por si próprio, a configuração de danos morais indenizáveis, pois o direito de petição é um direito constitucionalmente garantido, e a atividade de magistratura, por sua natureza pública, está constantemente sujeita a críticas e controles.
"A formulação de representação junto ao CNJ é um direito constitucionalmente garantido aos administrados, de modo que o exercício desta prerrogativa, desde que fundado em elementos de probabilidade da ocorrência do ilícito, não tem o condão, por si só, de configurar afronta aos direitos da personalidade e ensejar consequente reparação. É necessário examinar, em casa hipótese concreta, se houve o abuso de direito do denunciante."
A ministra concluiu que a mera comunicação ao CNJ da ocorrência do suposto ilícito, não é capaz de conduzir à responsabilização civil do informante, se ausente o abuso do direito, e que a veiculação de notícia somente caracteriza ato lícito quando inobservados os deveres de veracidade, pertinência e cuidado.
"As circunstâncias sublinhadas na sentença e no acórdão conduzem à conclusão de que o sindicato agiu nos estreitos e estritos limites do seu dever de levar ao conhecimento do CNJ a suposta prática de nepotismo, não tendo a intenção de difamá-los, ou injuriá-los."
A ministra ainda salientou ser incontroverso nos autos que o desembargador mantém há anos relação de namoro com a irmã da nomeada, independentemente da ausência de união estável ou casamento entre eles.
"O longo vínculo torna plausível a conclusão extraída pelo sindicato no sentido de que viviam em união estável. Afinal, apesar de a lei elencar requisitos para a configuração da união estável, a verificação ou não dos requisitos legais, na prática, não é tarefa simples, havendo, muitas vezes, uma linha tênue entre o namoro e a união estável."
Assim, conheceu do recurso especial e deu provimento, julgando improcedente os pedidos de indenização da petição inicial.
Comprovação
Em divergência, o ministro Marco Bellizze destacou que juntando jurisprudência da turma, há a necessidade de se apurar minimamente a verossimilhança dos fatos. "O tribunal local deu o mesmo tratamento: quem faz uma afirmação, tem que ter uma comprovação mínima do que se atribuiu".
Para o ministro, não foi um simples requerimento ao CNJ para apurar possível nepotismo, "se afirmou ali uma conduta criminosa do juiz".
"A cunhada era servidora de carreira exemplar. Não houve nepotismo, muito menos o CNJ atribuiu crime ao juiz."
Diante disso, votou no sentido de desprover o recurso.
Pediu vista o ministro Moura Ribeiro.
- Processo: REsp 2.036.582