Ação coletiva em 2º grau pode ser executada na jurisdição do tribunal
No caso em questão, a 2ª turma do STJ permitiu que membro da Associação Catarinense de Criadores de Suínos que reside em Braço do Norte/SC execute uma sentença coletiva obtida pela entidade na comarca de Concórdia/SC.
Da Redação
quarta-feira, 7 de dezembro de 2022
Atualizado às 15:24
A 2ª turma do STJ, por maioria de votos, reconheceu que títulos executivos formados a partir de ações coletivas julgadas em grau recursal pelos tribunais ordinários (TJs e TRFs) têm eficácia nos limites de sua competência territorial, do pedido formulado pelo autor na ação coletiva e do espaço de abrangência associativa (local, estadual ou nacional).
Assim sendo, no caso em questão, o colegiado permitiu que membro da Associação Catarinense de Criadores de Suínos que reside em Braço do Norte/SC execute uma sentença coletiva obtida pela entidade na comarca de Concórdia/SC.
A proposta, que representa uma mudança de jurisprudência, foi feita pelo ministro Og Fernandes e incorporada pelo relator do caso, ministro Herman Benjamin.
Histórico do caso
Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento contra decisão proferida pelo juízo da 1ª vara Federal de Tubarão/SC, em cumprimento de sentença coletiva, que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença e deixou de fixar honorários advocatícios.
O Tribunal Regional proveu o agravo da União para extinguir o cumprimento de sentença em razão da falta de título executivo. Compreendeu que, "ao apreciar o tema 499 da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que a eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por associação civil na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento".
"(...) Ainda que o exequente (...) seja associado da Associação Catarinense de Criadores de Suínos desde antes da propositura da ação, conforme declaração do evento 1, decl5, do processo originário, verifico que mantém domicílio em Braço do Norte-SC, município que não se submete à jurisdição da Subseção Judiciária Federal de Concórdia-SC, órgão prolator da sentença executada (...). Portanto, conforme o disposto no caput do art. 2º-A da Lei n. 9.494, de 1997, e no tema STF n. 499, Zito Michels Meurer não foi beneficiado pela sentença na ação coletiva proposta pela Associação Catarinense dos Criadores de Suínos (ACCS), impondo-se, assim, a extinção do cumprimento de sentença em razão da falta de título executivo."
O particular ofertou recurso especial, o qual não foi provido com fundamento no tema 499/STF e precedentes dos componentes da turma.
No presente agravo interno, sustenta o particular, em síntese, que a sentença coletiva beneficia todos os associados domiciliados em Santa Catarina, pois a correta exegese do art. 2º-A da lei 9.494/97 impõe que se reconheça a abrangência da decisão exequenda para todo o território do Estado.
A controvérsia central posta nos autos, portanto, está em delimitar os limites subjetivos da coisa julgada referentes a ação coletiva proposta por entidade associativa de caráter civil, nos termos do art. 2º-A da lei 9.494/97.
Voto do relator
Após voto-vista do ministro Og Fernandes, Herman Benjamin, que originalmente se posicionou em sentido diverso, retificou seu voto para prover o agravo interno e, também, o recurso especial ofertado pelo particular.
"Como bem demonstrado no substancioso Voto-Vista apresentado e já referido, os precedentes qualificados proferidos pelo STF a respeito da matéria (Res 573.232 e 612.043 - Tema 499/STF) não se ocuparam de estabelecer, sob o aspecto constitucional e com caráter vinculante, o conteúdo da expressão 'domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator' constante do art. 2°-A da Lei 9.494/1997. Essa é a razão pela qual não só se autoriza, como se recomenda, que o STJ, à luz da sua competência constitucional de intérprete maior da legislação federal (art. 105 da CF), se desincumba de tal dever e defina o real significado e alcance da expressão 'domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator' (art. 2°-A da Lei 9.494/1997)."
Segundo o ministro, as ações coletivas como um todo - sejam as ajuizadas por legitimação extraordinária ou autônoma para a condução do processo, sejam mesmo as propostas por representação processual (ações coletivas "ordinárias") - foram inseridas no sistema como poderoso instrumento de racionalização de acesso à Justiça, permitindo que o maior número de pessoas pudesse ser alcançado, de modo uniforme, pela prestação da tutela jurisdicional.
"Dentro desse amplo escopo protetivo, agride a lógica interpretar, de modo restritivo, legislação regulamentadora de instrumento de origem constitucional (art. 5°, XXI, da CF), limitando a eficácia dos comandos emitidos pelos Tribunais de segundo grau (Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais) para os estritos limites de competência territorial dos respectivos juízos originários do processo."
Do contrário, de acordo com Herman Benjamin, ter-se-á situação paradoxal, em que uma entidade de âmbito estadual, como é o caso da Associação Catarinense de Criadores de Suínos, terá de ajuizar ação por comarca ou subseção Judiciária do Estado de Santa Catarina, para obter tutela jurisdicional em prol de todos os seus representados, domiciliados nos mais distintos municípios do Estado.
"Tal situação gera inegável comprometimento da eficiência do sistema de Justiça, além de risco de diversas decisões contraditórias e em afronta ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF)."
Assim sendo, reconheceu que títulos executivos formados a partir de ações coletivas julgadas em grau recursal pelos Tribunais ordinários (TJs e TRFs) têm eficácia nos limites de sua competência territorial, do pedido formulado pelo autor na ação coletiva e do espaço de abrangência associativa (local, estadual ou nacional).
A turma, por maioria, deu provimento ao agravo interno para dar provimento ao recurso especial, considerando que a sentença coletiva executada na origem tem efeitos sob todo o território do Estado de Santa Catarina, podendo, assim, o recorrente executá-la.
Opinião
Após a publicação do acórdão, que ocorreu nesta semana, o juiz de Direito e professor Fernando da Fonseca Gajardoni comentou o caso em suas redes sociais.
Segundo o profissional, trata-se de uma das decisões mais importantes do STJ em 2022, ao menos no que toca ao processo coletivo.
"Não se deve confundir o ora decidido com o quanto posto pelo STF no tema 1.075 - que reconheceu a inconstitucionalidade do art. 16 da LACP, implodindo os limites territoriais das sentenças coletivas nas ações civis públicas. Aqui tem-se ação coletiva por substituição processual. Nos casos da lei 9.494/97 (o do acórdão do STJ referido neste post), ação coletiva por representação."
- Processo: REsp 1.856.644
Leia a íntegra do acórdão e do voto do relator.