MIGALHAS QUENTES

  1. Home >
  2. Quentes >
  3. Projeto de lei prevê indenização por perda de tempo do consumidor
Desvio produtivo

Projeto de lei prevê indenização por perda de tempo do consumidor

Proposta do senador Fabiano Contarato visa atualizar CDC para punir desvio produtivo.

Da Redação

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Atualizado às 17:54

Um projeto de lei quer atualizar o CDC com relação à responsabilidade das empresas pelo desvio produtivo do consumidor. O texto prevê, por exemplo, reparação em razão do tempo perdido. A proposta (PL 2.856/22) é do senador Fabiano Contarato, e foi protocolada no último dia 23.

 (Imagem: Freepik)

Projeto de lei quer indenizar perda de tempo do consumidor.(Imagem: Freepik)

O projeto foi proposto a partir de minuta sugerida por um grupo de juristas especializados no tema, composto pelos professores Fernando Antônio de Lima, Laís Bergstein, Maria Aparecida Dutra Bastos, Maurilio Casas Maia, Miguel Barreto e Vitor Guglinski, sob coordenação do advogado e professor Marcos Dessaune, autor da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, que dá base à nova proposta legislativa. O tema já foi reconhecido também pelo STJ. 

De acordo com Dessaune, "o ponto central do novo projeto de lei é o reconhecimento do tempo como um bem jurídico essencial para o desenvolvimento das atividades existenciais do consumidor, sendo-lhe, portanto, assegurado o direito à reparação integral dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais decorrentes da sua lesão".

Lesão ao tempo

"Simples e objetivo", conforme avalia Dessaune, o projeto prevê que o fornecedor de produtos ou serviços deverá empregar todos os meios e esforços para prevenir e evitar lesão ao tempo do consumidor, sendo consideradas práticas abusivas as condutas do fornecedor que impliquem perda indevida do tempo do consumidor. 

A proposta legislativa considera expressamente abusiva a incômoda prática de certos fornecedores - que se tornou frequente no Brasil - de "disparar, reiterada ou excessivamente, mensagens eletrônicas, robochamadas ou ligações telefônicas pessoais para o consumidor sem o seu consentimento prévio e expresso, ou após externado o seu incômodo ou recusa".

O projeto também estabelece cinco circunstâncias que deverão ser consideradas na apuração dos danos decorrentes da lesão ao tempo do consumidor: 

1) o descumprimento, pelo fornecedor, do tempo máximo para atendimento presencial e virtual ao consumidor; 

2) o descumprimento, pelo fornecedor, do prazo legal ou contratual para sanar o vício do produto ou serviço, bem como para responder a demanda do consumidor; 

3) a inobservância, pelo fornecedor, de prazo compatível com a essencialidade, a utilidade ou a característica do produto ou do serviço, quando não existir prazo legal ou contratual para o fornecedor resolver o problema de consumo ou responder a demanda do consumidor; 

4) o tempo total durante o qual o consumidor ficou privado do uso ou consumo do produto ou serviço com vício ou defeito e 

5) o tempo total gasto pelo consumidor na resolução da sua demanda administrativa, judicial ou apresentada diretamente ao fornecedor.

Danos extrapatrimoniais e morais

Além disso, Dessaune esclarece que, diante da "tradicional confusão" entre danos extrapatrimoniais e morais existente em uma parte da doutrina brasileira e da jurisprudência nacional que traz condenações em quantias irrisórias a título de "danos morais", o PL prevê que "a reparação do dano extrapatrimonial, decorrente da lesão ao tempo do consumidor, deverá ser quantificada de modo a atender às funções compensatória, preventiva e punitiva da responsabilidade civil". 

O PL ainda estipula que tal reparação deverá ser majorada quando a situação envolver: 1) produto ou serviço essencial; 2) consumidor hipervulnerável; 3) fornecedor de grande porte e/ou 4) demandas repetitivas contra o mesmo fornecedor ou sua figuração reiterada em cadastro de reclamações fundamentadas mantido pelos órgãos públicos de defesa do consumidor.

Bem jurídico essencial 

Contarato explica que, na atualidade, o dano moral em sentido amplo, enquanto gênero que corresponde ao dano extrapatrimonial, conceitua-se como o prejuízo não econômico que decorre da lesão a qualquer bem extrapatrimonial juridicamente tutelado, aí se inserindo o "tempo de vida" do consumidor. 

Mas o próprio senador já ressalva que a realidade judicial revela uma grande dificuldade no reconhecimento de novas categorias de danos extrapatrimoniais para além da esfera anímica da pessoa, o que tem levado à manutenção de uma jurisprudência anacrônica que ficou conhecida no país como a do "mero aborrecimento".

Diante desse quadro, Contarato afirma que há a crescente necessidade do reconhecimento legal de que o tempo do consumidor é um bem jurídico essencial na sociedade contemporânea como meio para se pôr fim a tal noção já superada do dano moral, que nega o direito básico do consumidor à efetiva prevenção e reparação integral dos danos. 

Em outras palavras, o senador esclarece que, diante da jurisprudência anacrônica, mas persistente, baseada na tese do "mero aborrecimento", a positivação de que o tempo do consumidor é um bem jurídico mostra-se cada dia mais necessária para se conferir efetividade ao princípio da reparação integral, bem como para alcançar maior segurança jurídica na defesa do vulnerável no Brasil.

O senador finaliza justificando que, "nesse contexto, a proposição tem como finalidade positivar a já reconhecida e solidificada Teoria do Desvio Produtivo que vem sendo aplicada tanto pelos Tribunais Superiores como pelos demais Tribunais Estaduais, garantindo segurança jurídica e o reconhecimento do tempo como direito fundamental".

Patrocínio

Patrocínio Migalhas