STJ suspende show em São Miguel do Araguaia/GO pago com verba pública
Em recurso, o MP/GO demonstrou que gastos de R$ 908 mil são excessivos para um município de apenas 22 mil habitantes e incompatíveis com o orçamento disponível.
Da Redação
sexta-feira, 8 de julho de 2022
Atualizado às 11:24
O presidente do STJ, ministro Humberto Martins, atendeu a um pedido do MP/GO e suspendeu o uso de R$ 908 mil para a realização de dois eventos em São Miguel do Araguaia/GO: a Expoagro SMA e o Carnaraguaia.
De acordo com o ministro, as despesas com os eventos poderiam ter consequências irreversíveis para a situação financeira do município. Ao restabelecer a decisão de primeira instância sobre o caso, o ministro disse que o interesse social envolvido na controvérsia exige uma posição de cautela.
"O interesse público exige cautela prévia com relação à utilização proba do dinheiro público, priorizando a moralidade e a eficiência administrativas, tudo em prol, ao final, da sociedade, destinatária final de toda a atuação pública."
Humberto Martins reforçou que os shows de música programados pela prefeitura para os dois eventos poderiam ser realizados em outra data, após a conclusão do processo, em trâmite na Justiça estadual, que discute o caso.
Gastos exorbitantes
Em junho, o MP/GO acionou a Justiça para impedir o uso de verba pública nos dois eventos. De acordo com o órgão, a prefeitura iria gastar R$ 233 mil com a Expoagro e outros R$ 675 mil com o Carnaraguaia.
Segundo consta, os gastos são excessivos para um município de apenas 22 mil habitantes e incompatíveis com o orçamento disponível. Além disso, o poder público teria utilizado fundamentação "genérica e abstrata" ao justificar a promoção dos eventos como um fator de benefício econômico para São Miguel do Araguaia.
O órgão ministerial sustentou que o município sofre com falta de vagas em creches e que o valor previsto para ser gasto nos eventos era superior ao destinado para reforma e construção de escolas em 2022. Apontou também diversos outros problemas municipais, cuja despesa em saúde estaria abaixo do mínimo exigido.
Em primeira instância, o juízo deferiu tutela provisória para suspender o uso de verba municipal nos eventos. Após recurso da prefeitura, o TJ/GO derrubou a liminar, por entender que o MP não demonstrou situação de debilidade financeira ou incapacidade de gestão do município.
A corte estadual levou em conta, ainda, o fato de que os valores a serem aplicados nos eventos passaram pelo crivo da Câmara Municipal, que aprovou as despesas em 2021.
No pedido de suspensão dirigido ao STJ, o Ministério Público afirmou que, ao contrário do entendimento do tribunal local, a debilidade financeira de São Miguel do Araguaia foi devidamente comprovada em inúmeros exemplos, ficando nítida a falta de razoabilidade na seleção das prioridades orçamentárias.
Ao analisar o pedido, o presidente do STJ destacou que há, no caso, o perigo da demora inverso, ou seja, a possibilidade de consequências irreversíveis para a situação financeira do município caso fossem realizadas as despesas previstas com os eventos.
"O argumento do Ministério Público no pleito é justamente que a realização dos shows causará lesão à ordem pública administrativa local, dados a precariedade dos serviços prestados à população e o altíssimo custo dos shows. Portanto, em termos de interesse processual, a medida de suspensão tem total cabimento."
- Processo: SLS 3.139
Informações: STJ
Relembre a fala do ministro Gurgel de Faria sobre gastos de prefeitutras com shows
Em entrevista à TV Migalhas, o ministro do STJ Gurgel de Faria falou sobre os gastos de prefeituras com shows. Para o ministro, houve a necessidade de intervenção do Judiciário, pois municípios com orçamentos pequenos estão gastando valores "astronômicos, muito elevados, cifras altas", para pagar cachês de shows.
Entenda
A contratação de grandes shows por prefeituras de municípios pequenos começou a ser alvo de questionamento após o cantor Zé Neto, da dupla com Cristiano, criticar artistas que usam a lei Rouanet.
O cantor alfinetou a cantora Anitta, que posteriormente afirmou nunca ter usufruído da lei.
A partir da repercussão nas redes sociais e mídias, o Ministério Público passou a investigar os shows sertanejos com altos cachês pagos por prefeituras que não tem poder de contratação alto. As investigações ficaram conhecidas popularmente como "CPI do Sertanejo".
Os casos chegaram ao Judiciário. No STJ, o presidente Humberto Martins chegou a proibir shows da dupla Bruno e Marrone, Leonardo, Wesley Safadão e Gusttavo Lima.
Segundo o presidente do STJ, os gastos são desproporcionais à capacidade financeira da administração. Alguns dos municípios chegaram a receber recursos federais para lidar com situação de emergência causada por chuvas.