Advogada defende a volta da interação pessoal na advocacia
Para Gilda Figueiredo Ferraz de Andrade, "é preciso conhecer as demandas e preocupações dos clientes, sem ruídos de comunicação, o que só pode ser feito presencialmente".
Da Redação
quarta-feira, 29 de junho de 2022
Atualizado às 13:54
Com 40 anos de experiência, a advogada trabalhista Gilda Figueiredo Ferraz de Andrade (Figueiredo Ferraz Advocacia), conselheira secional da OAB/SP por 12 anos, avalia que nunca foi tão importante o contato pessoal entre cliente e operadores do Direito nesse período de pós-pandemia. Para ela, a advocacia é uma atividade com viés fortemente presencial, no máximo, com perfil híbrido. "A modalidade remota é para emergências, como a crise pandêmica, pois a relação de confiança e o contato pessoal entre cliente e advogado está na essência da prática jurídica", comenta. Segundo Gilda, é preciso conhecer as demandas e preocupações dos clientes, sem ruídos de comunicação, o que só pode ser feito presencialmente. "Essa é a dinâmica que move a advocacia e está na cultura jurídica do Brasil", destaca.
Gilda também critica o excesso de recursos tecnológicos que são utilizados atualmente no universo jurídico. "A advocacia está no olho no olho e essa relação está perdendo espaço em detrimento da profissão e do cliente. Quase tudo foi automatizado, não só para contemplar a gestão de processos, mas para que as decisões preditivas de robôs sejam aquelas que serão acatadas em determinada ação. Isso altera a essência humanista da advocacia", diz ela.
Para Gilda, o novo Estatuto de Advocacia, sancionado recentemente, deveria ter inserido dispositivos que assegurassem uma advocacia apoiada no conhecimento, na ética e na estratégia do advogado, e não apenas em softwares. "Certamente, programas que livram o advogado de atividades repetitivas, como a pesquisa, podem ser positivos, mas a advocacia não pode dispensar uma interação pessoal entre cliente e profissional", comenta.
Na avaliação de Gilda, a pandemia da covid-19 vem se tornando um divisor de águas para muitas profissões e a advocacia não é exceção, tanto que todos tiveram de se adaptar às audiências telepresenciais para atender o reclamo por justiça de clientes dentro de um quadro de necessidade de afastamento social e de medidas de segurança sanitária. "Essa foi uma fase de aprendizado que teve seu lado positivo - democratizou o acesso à Justiça ao facilitar o acesso digital. Contudo, não é possível transformar a advocacia numa atividade on-line".
Dentre suas preocupações, Gilda comenta o fato que a Inteligência Artificial (IA) - que já vem sendo utilizada pelos grandes escritórios de advocacia - teria chegado a se tornar senciente, segundo funcionário de uma das grandes empresas tecnológicas do mundo e estaria apta a ter consciência de sua existência, fazer reflexões, julgamentos morais e manter um diálogo sobre qualquer tema. "Isso é uma evolução para o mundo e, principalmente para o universo jurídico? Sinceramente, não sei dizer, mas creio que temos de avaliar os impactos éticos, principalmente no mundo jurídico", comenta.
Gilda acrescenta às suas preocupações, a questão da insegurança jurídica em decorrência de imprevisibilidade das decisões judiciais, gerando decisões divergentes sobre matérias idênticas: "Na verdade, temos constatado que cada juiz acaba decidindo o que quer e deixa de ser um aplicador da Lei, o que causa prejuízos para os cidadãos e seus direitos e interfere no devido processo legal e nas garantias do Estado Democrático de Direito".