Caso Suzy: TJ/SP derruba indenização de Globo e Drauzio Varella a pai
Para o colegiado, ainda que se entenda a revolta do autor da ação, não houve na reportagem intenção velada de atingir as vítimas dos crimes cometidos pelas entrevistadas.
Da Redação
sábado, 7 de maio de 2022
Atualizado em 9 de maio de 2022 13:17
A 1ª câmara de Direito Privado do TJ/SP reformou sentença de 1º grau e negou pedido de pagamento de indenização por danos morais proposto contra a Globo e o médico Drauzio Varella. O autor da ação é pai de vítima assassinada pela transexual Suzy, que foi personagem da reportagem exibida em março de 2020 no Fantástico.
Na matéria jornalística, sobre preconceitos, abandono e violência vivenciados por mulheres trans presas, Suzy dizia que não recebia visitas há oito anos e recebeu um abraço do médio entrevistador.
O juízo de primeiro grau havia condenado a emissora e Drauzio Varella a pagar R$ 150 mil ao pai após a exibição da entrevista.
De acordo com os autos, depois da grande repercussão da matéria sobre o sistema carcerário, o pai de uma vítima de estupro e homicídio cometido pela presidiária entrevistada ajuizou pedido de indenização por danos morais contra o médico que apresentou a reportagem e a emissora, alegando ter sofrido abalo psicológico ao reviver os fatos após a veiculação em rede nacional.
Em contestação, Drauzio e a Globo argumentaram que a matéria teria tido cunho jornalístico e informativo, sem qualquer abuso ou ilicitude. Eles disseram que narraram os fatos sem conhecimento das práticas delituosas cometidas e que jamais mencionaram o nome da vítima ou do autor.
A juíza de Direito Regina de Oliveira Marques, da 5ª vara Cível de SP, considerou que foi violado o direito personalíssimo do pai ao veicular matéria que minimizava a condição de presidiária da assassina de seu filho.
Ao analisar apelação, o desembargador Rui Cascaldi, relator, considerou em seu voto que, ainda que se entenda a revolta do autor da ação, não houve na reportagem intenção velada de atingir as vítimas dos crimes cometidos pelas entrevistadas.
Segundo o magistrado, a matéria "não tinha por objetivo historiar o fato criminoso, mas as péssimas condições de carceragem das detentas trans, nisso residindo a sua liberdade de imprensa, direito que ora se lhe garante".
"Mostrar detentas trans de forma a gerar o sentimento de solidariedade e compaixão, para que a reportagem cale fundo nas autoridades responsáveis pelo sistema penitenciário, pode não agradar aqueles que um dia se viram feridos pelas pessoas encarceradas, mas é lícito e não tem o condão de causar dano moral a nenhuma das vítimas, que sequer são mencionadas. E, note-se, não foi dito na reportagem que elas não praticaram crimes", concluiu o magistrado.
Participaram do julgamento os desembargadores Claudio Godoy e Francisco Loureiro. A votação foi unânime.
O advogado André Cid de Oliveira (Affonso Ferreira Advogados), que representa a Globo no processo, comentou a decisão:
"Além de reverenciar a liberdade editorial do veículo de comunicação, a decisão do Tribunal de Justiça reafirma o essencial papel cumprido pela imprensa no debate público. A reportagem da Globo, longe de ser abusiva, foi cuidadosa ao tratar da intersecção de dois temas de sensível interesse da sociedade: a precariedade do sistema penitenciário e o preconceito contra pessoas transgênero."
- Processo: 1016800-76.2020.8.26.0005
Confira o acórdão.
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