Para Toffoli, tese da legítima defesa da honra é inconstitucional
De acordo com o relator, quem pratica feminicídio para reprimir adultério, ataca a mulher de forma desproporcional, covarde e criminosa.
Da Redação
sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021
Atualizado em 8 de março de 2021 09:14
O ministro Dias Toffoli, do STF, concedeu parcialmente medida cautelar na ADPF 779 para firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. A ação foi ajuizada pelo PDT - Partido Democrático Trabalhista.
Em sua decisão, que deverá ser submetida a referendo do plenário em 5/3, o ministro dá interpretação conforme a Constituição a dispositivos do Código Penal e do Código de Processo Penal, de modo a excluir a legítima defesa da honra no âmbito do instituto da legítima defesa.
A decisão impede que advogados de réus sustentem, direta ou indiretamente, a legítima defesa da honra, ou qualquer argumento que induza à tese, nas fases pré-processual ou processual penais e perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento.
Caso
O PDT - Partido Democrático Trabalhista acionou o STF para questionar a constitucionalidade da tese jurídica da "legítima defesa da honra". Na ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, com pedido de liminar, a legenda argumenta que, com base na interpretação de dispositivos do Código Penal e do Código de Processo Penal, Tribunais do Júri têm aplicado a tese e absolvido feminicidas.
De acordo com partido, a tese da legítima defesa da honra admite que uma pessoa, normalmente um homem, mate outra, normalmente uma mulher, para proteger sua honra, em razão de uma traição em relação afetiva.
Contudo, o PDT sustenta que qualquer interpretação de dispositivos infraconstitucionais que admita a absolvição de assassinos de mulheres por "legítima defesa da honra" não é compatível com os direitos fundamentais à vida e à não discriminação das mulheres nem com os princípios da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade e da proporcionalidade.
Afirmou, ainda, que a matéria envolve controvérsia constitucional relevante, pois há decisões de tribunais de Justiça que ora validam, ora anulam vereditos do Tribunal do Júri em que se absolvem réus processados pela prática de feminicídio com fundamento na tese da legítima defesa da honra. O partido aponta, também, divergências de entendimento sobre o tema entre o Supremo e o STJ.
O partido pede que o STF interprete a Constituição de forma a impedir que os Tribunais do Júri se utilizem da tese da legitima defesa da honra para aplicar a exclusão de ilicitude e a legítima defesa, ambas na legislação penal brasileira, aos crimes de feminicídio.
Recurso odioso
Para o ministro Toffoli, relator, "a chamada legítima defesa da honra não encontra qualquer amparo ou ressonância no ordenamento jurídico". Segundo Toffoli, não se pode confundir "legítima defesa da honra" com "legítima defesa", pois somente a segunda constitui causa de excludente de ilicitude.
O ministro afirmou que, para evitar que a autoridade judiciária absolva o agente que agiu movido por ciúme ou outras paixões e emoções, foi inserida no atual Código Penal a regra do artigo 28, no sentido de que a emoção ou a paixão não excluem a imputabilidade penal.
"Portanto, aquele que pratica feminicídio ou usa de violência, com a justificativa de reprimir um adultério, não está a se defender, mas a atacar uma mulher de forma desproporcional, covarde e criminosa."
Em sua decisão, S. Exa. também afirma que o argumento da prática de um crime em razão da legítima defesa da honra constituiu, na realidade, recurso argumentativo e retórico "odioso, desumano e cruel utilizado pelas defesas de acusados de feminicídio ou agressões contra mulher para imputar às vítimas a causa de suas próprias mortes ou lesões, contribuindo imensamente para a naturalização e a perpetuação da cultura de violência contra as mulheres no Brasil".
- Processo: ADPF 779
Leia a decisão do relator.
Informações: STF.