Pais são obrigados a vacinar filhos se autoridades sanitárias recomendarem
Segundo Estatuto da Criança e do Adolescente, os responsáveis devem seguir o calendário de vacinação. A questão será definida pelo STF.
Da Redação
quarta-feira, 21 de outubro de 2020
Atualizado em 22 de outubro de 2020 10:24
A discussão sobre a obrigatoriedade da vacina gera grande confusão na população: de um lado, o presidente da República Bolsonaro tem afirmado que a vacina contra a covid-19 não será obrigatória. Já em São Paulo, o governador João Doria garante que toda a população será vacinada, compulsoriamente.
A decisão final para o imbróglio, como se sabe, será decidida pelo STF. Os ministros irão analisar ação apresentada pelo Ministério Público contra os pais de uma criança que se negam a seguir a carteira de vacinação do filho menor de idade.
O que diz o ECA
A respeito da obrigatoriedade em relação à criança e ao adolescente, a especialista em Direito Médico, Mérces da Silva Nunes, em participação no Programa Cidadania da TV Senado, explica que o ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90), estabelece como responsabilidade dos pais ou do responsável cumprir o calendário de vacinação dos filhos desde o nascimento.
O calendário de vacinação consta no PNI - Programa Nacional de Imunização elaborado pelo ministério da Saúde e dispõe de mais de 300 milhões de doses anuais distribuídas em vacinas, soros e imunoglobulinas.
O ECA assegura o direito das crianças e adolescente à vida e à saúde estabelecendo, no artigo 14, como direito fundamental o acesso à vacinação. Veja a íntegra:
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
§ 1º É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
A especialista Mérces da Sulva Nunes explica que o direito dos pais de terem liberdade de convicções em relação a não vacinação não pode prevalecer sobre o direito coletivo da população e, muito menos, sobre a saúde da criança.
Sobre o equilíbrio entre a obrigatoriedade imposta por lei e o poder de escolha da população, Mérces afirma que o caso das vacinas ganha proporções maiores por atingir o interesse da criança. "Os pais não podem se furtar ao cumprimento desta obrigação independentemente de a própria Constituição também assegurar que é direito da família decidir como que ela faz o seu planejamento". A especialista afirma, ainda, que o "bem maior a ser tutelado é da criança e do adolescente e não o da família".
Debate histórico
A questão da obrigatoriedade de vacinação colocou em posições antagônicos o sanitarista Oswaldo Cruz e a Águia de Haia, Rui Barbosa no século passado.
Em 1904, uma lei tornava obrigatória a vacina contra a varíola. Dentre aqueles que não queriam colocar dentro do corpo o vírus da própria doença, estava Rui Barbosa. Para o estudioso, a vacina não era inofensiva. Pelo contrário, ele considerava "veneno" a introdução de um vírus no corpo "em cuja influência existem os mais bem fundados receios de que seja condutora da moléstia, ou da morte".
"A lei da vacina obrigatória é uma lei morta. (...) Contrário era e continuo a ser à obrigação legal da vacina. (...) Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência, assim lhe veda transpor-nos a epiderme."
A vacina já era fabricada na Europa e o diretor-Geral de Saúde Pública da época, Oswaldo Cruz, tentou implementar a novidade no Brasil. Longe de ser pacífica, a tentativa ficou conhecida como a "Revolta da Vacina".
Depois da morte de Oswaldo Cruz, em fevereiro de 1917, Rui Barbosa, em discurso proferido no Teatro Municipal, acabou reconhecendo a importância do sanitarista, dando a ele o epíteto de "pasteur dos trópicos".