TJ/RJ mantém absolvição de réu que estava preso apenas com base em relatos policiais
Colegiado entendeu que apenas fortes indícios não se mostram suficientes à prolação de um decreto condenatório.
Da Redação
segunda-feira, 18 de maio de 2020
Atualizado às 14:52
Os desembargadores da 4ª câmara Criminal do TJ/RJ decidiram, por unanimidade, manter a absolvição de um homem acusado de associação para o tráfico, receptação e corrupção ativa. O acusado havia sido preso preventivamente após depoimentos de policiais militares.
Consta nos autos que PMs receberam uma denúncia anônima que apontava o acusado como gerente do tráfico na região e a residência como o local onde materiais provenientes de roubo de carga eram colocados.
Em depoimento, um dos policiais afirmou que no local foram apreendidos um radiotransmissor e roupas e calçados femininos, de várias marcas e todos com etiquetas.
Em sua defesa, o homem disse que na residência só havia blusas velhas que sua esposa iria doar na igreja. Afirmou também que os sapatos femininos seriam revendidos.
Ainda segundo o processo, ao ser informado que seria levado, junto com sua esposa, para a delegacia, o acusado teria oferecido aos policiais a quantia de R$10 mil para que não cumprissem seu trabalho.
O acusado alegou que não ofereceu qualquer dinheiro aos policiais, "até porque mora de aluguel e estava desempregado, já que havia acabado de sair da cadeia e lutava para sobreviver".
Absolvição
Para o desembargador João Ziraldo Maia, relator da apelação interposta pelo MP, em casos como o presente, em que a prova se limita aos depoimentos prestados pelos policiais militares responsáveis pelo flagrante, o que deve ser analisado é seu conteúdo, se são harmoniosos e se estão em consonância não só com a primeira narrativa, feita em sede policial, mas também entre si e com o restante do conjunto probatório.
De acordo com o magistrado, na hipótese vertente, as versões são uníssonas, "mas entendo que o trabalho efetuado pela Polícia Civil a partir do flagrante foi totalmente insatisfatório, pelo que não restou, como bem salientou a sentenciante, comprovado à saciedade o criminoso atuar do réu".
Em relação à receptação, no entendimento do desembargador a origem ilícita dos bens não ficou comprovada, já que "sequer foram encaminhados para perícia".
Quanto ao crime de associação para o tráfico, "apenas o fato de o réu ter sido apontado anonimamente como gerente do tráfico local e um radiotransmissor ter sido apreendido em sua residência, ambas as situações comprovadas a partir da narrativa dos policiais militares, não podem embasar um decreto condenatório, até porque não há certeza de que estava ligado e na frequência do tráfico".
"É fato que a palavra dos policiais, especialmente em casos como o presente, posto harmônica, de per si, é motivo suficiente para embasar um decreto condenatório em relação ao crime de corrupção ativa, mas o que se verifica é que não tendo restado comprovados os crimes de receptação ou mesmo de associação para o tráfico, não se vê razão para que fosse oferecida quantia para que não fosse preso."
O magistrado defendeu que "há fortes indícios da prática de todos os crimes narrados na denúncia, mas, repita-se, fortes indícios não se mostram suficientes à prolação de um decreto condenatório, como pretende o parquet".
Sendo assim, o colegiado votou pela manutenção da absolvição.
A advogada Thaís Menezes atuou pelo homem absolvido.
- Processo: 0071810-23.2017.8.19.0038
Veja o acórdão.