MPF se manifesta ao Supremo contra exigência de inscrição de defensor público na OAB
Para Augusto Aras, embora desenvolvam atividades análogas às de advogados privados, defensores exercem atividade pública.
Da Redação
segunda-feira, 18 de maio de 2020
Atualizado às 09:19
O procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se no Supremo contrário ao pleito da OAB referente à exigência de inscrição de defensores públicos nos quadros da instituição como requisito para o exercício de suas funções.
Os processos são REs representativos do tema 1.074 da sistemática da repercussão geral. A OAB questiona acórdãos do TRF da 3ª região e do STJ.
A ação, na origem, é da Apadep - Associação Paulista de Defensores Públicos, que impetrou MS coletivo contra ato da OAB/SP, que indeferiu pedido de cancelamento da inscrição de defensores públicos junto àquele órgão. O objetivo da Apadep era o reconhecimento do direito para que seus representados livremente optassem pela inscrição e que esta não fosse requisito para o desempenho de suas funções.
Decisão em 2ª instância estabeleceu a obrigatoriedade de os defensores públicos estarem inscritos na OAB para o exercício de suas funções, afastando a submissão daqueles profissionais aos ditames da lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) naquilo em que este diploma conflitar com as disposições contidas na legislação específica, atinente à carreira da Defensoria Pública.
Dessa decisão, houve recurso especial e dois extraordinários, propostos pela Apadep e pela OAB/SP. A ordem alegou quebra de isonomia entre advogados e defensores. A associação questionou ofensa à livre associação. No STJ, houve a decisão de que não é necessária a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil para que os defensores públicos exerçam suas atividades. Ficou esclarecido que a carreira está sujeita a regime próprio e a estatutos específicos, submetendo-se à fiscalização disciplinar por órgãos próprios, e não pela OAB.
No âmbito do STF, a OAB requer anulação da decisão do STJ e reforma da decisão do TRF3, para reconhecer a necessidade de inscrição na Ordem. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral do caso.
O procurador-geral sugere a fixação das seguintes teses pelo STF: que o Estatuto da Advocacia (art. 3º) seja interpretado conforme a CF; e que seja declarada a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da lei 8.906/94, que submete os defensores públicos ao Estatuto da Advocacia e à fiscalização feita pela OAB.
Para Aras, a inclusão dos defensores públicos no Estatuto da Advocacia foi inovação da lei 8.906/94, uma vez que os estatutos precedentes (decreto 20.784/1931 e lei 4.215/63) voltavam-se exclusivamente para a advocacia como profissão liberal, autônoma, não se cogitando que a advocacia pública, exercida por órgãos com competências e estatutos específicos, fosse submetida ao estatuto de entidade sui generis, desvinculada da Administração Pública. "O advogado privado exerce múnus público, mas sua atividade é exercida em caráter privado. Distingue-se dos agentes do Estado, sendo a natureza pública de sua atividade inerente ao cargo que ocupa", explica.
Já os defensores públicos, embora desenvolvam atividades advocatícias análogas às realizadas por advogados privados, o fazem no exercício do cargo público. Sua capacidade postulatória decorre do vínculo estatutário desses profissionais com a Administração. Por isso, a competência da OAB não se estende aos defensores públicos.
A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos hipossuficientes. "O tratamento constitucional conferido à Defensoria Pública deixa claro o propósito de estabelecer o órgão como instituição singular e independente, além de evidenciar que as atribuições de seus membros não se confundem com a advocacia privada", afirma Aras, no parecer.
Os defensores públicos têm vínculo funcional com o Estado, submetem-se a concurso público e regem-se apenas pelo estatuto e normas próprios do órgão ao qual são vinculados. Por isso, não há fundamento para exigir vinculação e submissão desses agentes públicos a estatuto regente de advogados privados. "A OAB não tem poder correicional sobre os defensores públicos", conclui.
- Processo: RE 1.240.999
Leia a íntegra da manifestação.