Coronavírus e setor aéreo: governos precisam intervir e rápido, diz Ricardo Fenelon Junior
Para ex-diretor da Anac, intervenção é para evitar colapso de todo um setor que presta um serviço absolutamente essencial.
Da Redação
domingo, 15 de março de 2020
Atualizado em 16 de março de 2020 09:00
Com a pandemia do coronavírus, diversos países começaram a fechar fronteiras na tentativa de conter a disseminação do covid-19. No Brasil, a American Airlines acaba de anunciar a suspensão de todas as rotas para o Brasil. A medida entra em vigor a partir desta segunda-feira, 16.
No comunicado divulgado, a companhia aérea informou que estão suspensos os voos de Nova York e Miami para o Rio de Janeiro; de Dallas, Nova York e Miami para São Paulo, e de Miami para Brasília e Manaus, até o dia 6 de maio. Na rota Dallas-São Paulo a suspensão vale até o dia 3 de junho. A outra rota operada pela companhia, entre São Paulo e Los Angeles, já havia sido suspensa na sexta-feira. A retomada será apenas em 24 de outubro.
Diante da situação, o ex-diretor da Anac, Ricardo Fenelon Junior, alerta que "é de suma importância" que os governos implementem de maneira rápida e eficaz medidas que evitem o colapso do transporte aéreo mundial.
"Não se trata da sobrevivência de empresa A, B ou C, mas sim de toda uma indústria que é essencial para as pessoas e para a economia mundial. A aviação civil, além de gerar direta e indiretamente milhões de empregos e milhões de dólares em inúmeras atividades econômicas, é essencial para o desenvolvimento global e para reduzir as distâncias entre os diversos povos."
Veja abaixo as considerações.
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Coronavírus e o setor aéreo: os governos precisam intervir e rápido
Uma das frases mais repetidas em eventos do setor aéreo é: "se você quiser ser um milionário, comece com um bilhão de dólares e abra uma companhia aérea, que mais cedo ou mais tarde você será um milionário". De autoria do bilionário inglês Richard Branson, fundador da Virgin Atlantic, a afirmação resume de forma descontraída a complexidade dessa indústria.
Intensivo em capital, tecnologia e pessoas, o transporte aéreo pode ser afetado por diversos fatores, como crise econômica, guerra, ataque terrorista, preço do petróleo, entre outros. Com a pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, não será diferente. A indústria da aviação civil já está sendo fortemente impactada pela crise, que pode vir a ser a maior da história. O cenário atual reúne um conjunto de variáveis que provavelmente nunca ocorreram de forma simultânea no passado e que colocam em risco o setor como um todo.
No primeiro capítulo do livro Introduction to Air Transport Economics, Bijan Vasigh explica que quando a atividade econômica está aquecida mais empregos são gerados, o que acaba resultando no aumento das chamadas viagens de negócio, uma fonte importante do faturamento das empresas aéreas. Além disso, o autor também comenta que com a redução do desemprego e o aumento da renda, sobra mais dinheiro para as famílias realizarem viagens de turismo. Tudo isso somado, gera um impacto positivo para as companhias aéreas.
Seguindo essa lógica, o inverso também é verdadeiro, pois a indústria da aviação é umas das primeiras a ser impactada pela redução da atividade econômica. De forma simplificada, a explicação é que as pessoas reduzem o número de viagens e a demanda cai. No caso do coronavírus, o impacto é ainda mais brusco, pois ninguém estava preparado para uma queda tão acentuada nas reservas do dia para a noite. A partir do momento que os países fecham fronteiras ou que reuniões e eventos são cancelados, não restam dúvidas de que muito menos passageiros estão utilizando o transporte aéreo.
No caso do novo coronavírus, há um fator adicional que é o medo. Mesmo com a divulgação pelas empresas de que o ar é renovado a cada 3 minutos no interior das aeronaves, que possuem potentes filtros contra bactérias e vírus, muitas pessoas estão deixando de voar pelo receio de se contaminarem dentro do avião. Fenômeno parecido ocorreu após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, quando milhões de pessoas deixaram de voar por medo. O prejuízo no país para o setor foi significativo, de aproximadamente 24 bilhões de dólares entre 2001 e 2002, com a recuperação vindo só a partir de 2004.
Ainda é cedo para prever exatamente qual vai ser o impacto do Covid-19. No início, quando o vírus estava concentrado na Ásia, a Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) divulgou uma previsão de que o setor aéreo mundial teria um prejuízo de aproximadamente 30 bilhões de dólares. Em menos de um mês, com o vírus se espalhando pelo mundo, a IATA já atualizou sua previsão para até 113 bilhões de dólares em prejuízos, estimativa que não contempla o transporte de cargas, apenas de passageiros.
Não é necessário estudar muitas estatísticas para entender o que já está ocorrendo. Na última semana, diversas imagens circularam nas redes sociais, em que os maiores aeroportos do mundo, normalmente abarrotados, mais parecem cidades abandonadas, em que se vê pouca ou nenhuma movimentação de pessoas.
Nesse sentido, é de suma importância que os governos ao redor do mundo estejam atentos e prontos para implementar de maneira rápida e eficaz medidas que evitem o colapso do transporte aéreo mundial. Não se trata da sobrevivência de empresa A, B ou C, mas sim de toda uma indústria que é essencial para as pessoas e para a economia mundial. A aviação civil, além de gerar direta e indiretamente milhões de empregos e milhões de dólares em inúmeras atividades econômicas, é essencial para o desenvolvimento global e para reduzir as distâncias entre os diversos povos.
*Ricardo Fenelon Junior é sócio do Fenelon Advogados, ex-diretor da Anac e mestre (LL.M.) em Direito Empresarial Internacional e Econômico pela Georgetown University.
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