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CPC/15

STJ fixa parâmetros para analisar ponderação de princípios no CPC/15

No caso concreto, sociedade muçulmana apontava ofensa religiosa em vídeo de funk. No recurso, alegou que TJ/SP violou CPC em acórdão ao fazer ponderação entre princípios constitucionais.

Da Redação

quinta-feira, 28 de março de 2019

Atualizado às 11:18

Ao examinar pela primeira vez no STJ uma alegação de nulidade por violação ao § 2º do art. 489 do CPC/15, a 3ª turma fixou uma série de parâmetros para a análise da fundamentação da decisão recorrida quanto à exigência de ponderação entre normas ou princípios jurídicos em colisão.

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De acordo com o ministro Villas Bôas Cueva, relator do caso julgado, a nulidade da decisão por violação do dispositivo só deve ser declarada "na hipótese de ausência ou flagrante deficiência da justificação do objeto, dos critérios gerais da ponderação realizada e das premissas fáticas e jurídicas que embasaram a conclusão, ou seja, quando não for possível depreender dos fundamentos da decisão o motivo pelo qual a ponderação foi necessária para solucionar o caso concreto e de que forma se estruturou o juízo valorativo do aplicador".

O caso

O recurso examinado na turma foi interposto pela Sociedade Beneficente Muçulmana, autora de ação contra o Google por suposta ofensa à liturgia religiosa islâmica no vídeo do funk Passinho do Romano, publicado no YouTube, o qual cita trechos do Alcorão.

A partir da ponderação entre a liberdade de expressão e a inviolabilidade das liturgias religiosas, dois princípios constitucionais, o TJ/SP concluiu não haver ofensa e rejeitou o pedido de indenização e de retirada do vídeo.

No recurso ao STJ, a entidade muçulmana alegou que o Tribunal estadual violou os arts. 1.022 e 489, §§ 1º e 2º, do CPC/15, visto que não teria enfrentado todos os argumentos expostos pela parte autora nem observado os critérios previstos na lei processual no que diz respeito à técnica de ponderação em caso de conflito entre normas.

Para a recorrente, houve deficiência de fundamentação diante da omissão quanto aos motivos para priorizar o direito à liberdade de expressão, em detrimento do direito à proteção da liturgia e da crença religiosa; e também em razão da não explicitação dos critérios gerais da ponderação realizada entre tais princípios.

Situação peculiar

Em seu voto, o ministro Cueva destacou que se trata de caso peculiar, já que a reforma do CPC incluiu um rol de novos artigos destinados a orientar os juízes sobre como proceder diante de colisão entre normas, garantindo assim meios para que a interpretação corresponda à entrega de uma prestação jurisdicional efetiva, conforme o artigo 93, IX, da CF.

O relator ressaltou ainda que, apesar da possível insegurança jurídica causada pela inserção do parágrafo 2º no artigo 489 do CPC/15 - que não deixou claro como e em quais casos deve ser utilizada a ponderação -, é preciso lembrar que o CPC tem como objetivo a criação de uma jurisprudência íntegra, estável e coerente, e é com base nisso que se tem de interpretar a norma.

"Pode-se entender o parágrafo 2º do artigo 489 do CPC/15 como uma diretriz que exige do juiz que justifique a técnica utilizada para superar o conflito normativo, não o dispensando do dever de fundamentação, mas, antes, reforçando as demais disposições correlatas do novo código, tais como as dos artigos 10, 11, 489, parágrafo 1º, e 927."

Critérios

Segundo o relator, o § 2º do art. 489 visa assegurar "a racionalidade e a controlabilidade da decisão judicial, sem revogar outros critérios de resolução de antinomias, tais como os apresentados na lei de introdução às normas do Direito brasileiro".

Em seu voto, acompanhado de forma unânime pela 3ª turma, o ministro estabeleceu algumas balizas para o exame da fundamentação quanto à ponderação.

Segundo ele, "a pretensão de rever o mérito da ponderação aplicada pelo tribunal de origem não se confunde com a alegação de nulidade por ofensa ao artigo 489, parágrafo 2º, do CPC/15". O dever das instâncias recursais competentes, acrescentou, é conferir, em cada situação, se a técnica da ponderação foi bem aplicada e, consequentemente, se a decisão judicial possui fundamentação válida.

"O exame da validade/nulidade da decisão que aplicar a técnica da ponderação deve considerar o disposto nos arts. 282 e 489, § 3º do CPC/15, segundo os quais a decisão judicial constitui um todo unitário a ser interpretado a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé, não se pronunciando a nulidade quando não houver prejuízo à parte que alega ou quando o mérito puder ser decidido a favor da parte a quem aproveite."

Competência

Ao considerar o caso em exame, o relator salientou que não cabe ao STJ, a pretexto de apreciar recurso especial baseado apenas na alegada violação ao CPC, adentrar o mérito da ponderação entre duas normas constitucionais, "sob pena de se exceder na sua atribuição de uniformizar a interpretação da legislação Federal".

Assim, a 3ª turma definiu que, "em recurso especial, a pretensão de revisão do mérito da ponderação efetuada pelo tribunal de origem pressupõe que se trate de matéria infraconstitucional, além da indicação, nas razões recursais, das normas conflitantes e das teses que embasam a sustentada violação/negativa de vigência da legislação Federal".

Além disso, estabeleceu que, "tratando-se de decisão fundamentada eminentemente na ponderação entre normas ou princípios constitucionais, não cabe ao STJ apreciar a correção do entendimento firmado pelo tribunal de origem, sob pena de usurpação de competência do STF".

Caso concreto

A turma não reconheceu as nulidades apontadas pela Sociedade Beneficente Muçulmana. Quanto à alegada violação do art. 1.022 do CPC, os ministros concluíram que o TJ/SP enfrentou todas as questões necessárias à solução da controvérsia, além de ter apresentado de forma clara os motivos fáticos e jurídicos que levaram o juízo a decidir pela prevalência da liberdade de expressão.

Sobre a ponderação de princípios, o colegiado, com base nos parâmetros propostos pelo relator, não reconheceu deficiência de fundamentação e entendeu que a competência para avaliar a correção do julgamento realizado pela Justiça paulista, por se tratar de matéria constitucional, é do STF.

Leia o acórdão.

Informações: STJ.