Moro diz que impunidade alimenta ciclo do crime e processos judiciais não bastam
Ministro da Justiça diz que contribuição da advocacia é "essencial" neste debate.
Da Redação
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019
Atualizado às 14:53
Em palestra que abriu o calendário de eventos do IASP e marcou o início da gestão do presidente Renato de Mello Jorge Silveira, o ministro da Justiça Sérgio Moro esteve nesta quinta-feira, 7, na primeira reunião-almoço realizada pelo Instituto em 2019.
Durante sua fala, ele abordou as propostas apresentadas nesta semana sobre o pacote anticrime e afirmou que a impunidade alimenta o ciclo do crime e que, "os processos judiciais não são suficientes para resolver o problema, precisam haver reformas mais gerais".
A ideia do pacote, defendeu o ex-juiz, é apresentar um projeto que trate de corrupção, crime organizado e crime violento em conjunto. "Eu reconheço que existe muito mais a ser proposto e que pode ser feito, mas esse projeto inicial visa adotar medidas muito simples, fáceis de serem explicadas e sem prejuízo de que outras iniciativas relevantes sejam adotadas. Essas medidas não significam que nossa ação se limita a elas."
Conforme o ministro, muita coisa não depende de lei e sim da atuação do executivo. A exemplo dos presídios, que demandam maiores investimentos. Mas também ponderou que a baixa eficiência na aplicação dos recursos é um desafio a ser enfrentado: "Não depende propriamente de lei mas sim de uma reorganização burocrática."
Admitindo o problema da superlotação dos presídios, Moro disse que o sistema carcerário não comporta o endurecimento de modo geral e que o projeto visa somente o endurecimento em relação à criminalidade mais grave e seletiva, não havendo o incremento de penas.
Ciente da contraversão do tema, o ex-juiz defendeu a prisão em segunda instância alegando que o STF já decidiu por quatro vezes, desde 2016, que a execução provisória da pena não é inconsistente com o princípio da presunção de inocência. "Não acredito que o Supremo vá mudar de posicionamento, mas é importante que a lei traga isso com maior clareza. Na minha opinião, presunção de inocência tem a ver com a prova. A prova tem que ser categórica para a condenação criminal. Não está relacionada, necessariamente, a questão dos recursos."
"Embora, talvez, a redação da Constituição sugira a interpretação em se aguardar o trânsito em julgado, tudo é passível de interpretação. Não precisamos interpretar os dispositivos constitucionais literalmente".
Acerca da prescrição, Moro é enfático: trata-se, disse, de uma falha do sistema: "O processo deve acabar em absolvição ou condenação."
Outra polêmica entre os advogados criminalistas, a questão da legítima defesa foi tratada de forma defensiva pelo ministro. Ele alegou ter atendido reclamação das forças de segurança e das corporações policiais, mas que não se está dando um passo a mais em qualquer sentido, já que o agente policial responderá por excessos, conforme está na lei. "Não existe, de maneira nenhuma, uma licença para matar ou um afrouxamento da legítima defesa. O que existe é um aclaramento de situações que já ocorrem na prática."
Em relação ao famigerado 'plea bargain', ele refutou o argumento de que o mecanismo pode prejudicar inocentes alegando que o sistema convencional também é falho.
Mais adiante, reforçou a contribuição da advocacia para o debate e o aperfeiçoamento das medidas propostas: "O ministério está à disposição para críticas e sugestões. O espaço jurídico é o mais profícuo para o debate."
Durante o evento, o ministro sentou-se à mesa com Modesto Carvalhosa, Ives Gandra Martins, Rui Celso Reali Fragoso e os criminalistas Miguel Reale Júnior e Antônio Claudio Mariz de Oliveira.
Fotos: Felipe Lampe
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