STF suspende novamente julgamento sobre regularização de terras quilombolas
Três ministros votaram na matéria, que tramita na Corte há 13 anos.
Da Redação
quinta-feira, 9 de novembro de 2017
Atualizado às 16:52
Os ministros do STF retomaram, em sessão plenária desta quinta-feira, 9, o julgamento de ADIn que questiona decreto presidencial de 2003 (4.887/03) que trata da regulamentação fundiária das terras ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos. Embora a Constituição garanta a posse definitiva das propriedades pelos quilombolas, o processo de reconhecimento das terras e o marco temporal de ocupação foram questionados Democratas.
Ajuizada pelo DEM, a ação tramita na Corte desde 2004. Já votaram o relator, ministro aposentado Cezar Peluso, pela procedência da ação para declarar a inconstitucionalidade do decreto presidencial com efeito ex nunc; a ministra Rosa Weber, divergindo do relator para jugar improcedente a ADIn; e, em voto-vista, o ministro Dias Toffoli, que julgou parcialmente procedente a ADIn.
Para Toffoli, o decreto está de acordo com a Constituição, apenas deve ser dada interpretação conforme ao art. 2º, § 2º do decreto, para esclarecer que só devem ser titularizadas áreas ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas na data de promulgação da CF/88, salvo comprovação de perda da posse em função de atos ilícitos de terceiros.
Após o voto, pediu vista o ministro Fachin.
Voto-vista
O ministro Dias Toffoli iniciou seu voto observando que, mesmo após a abolição da escravatura, muitas comunidades quilombolas surgiram, pois não houve política pública do Estado para inserir os negros na sociedade. Toffoli traçou panorama histórico dos atos normativos que se seguiram à promulgação da Constituição e da sua aplicação ao reconhecimento das terras das comunidades quilombolas. "Vide desde logo os dispositivos que reconhecem a importância da relação dos povos tribais com o território", afirmou, citando em seguida a Convenção da OIT.
A partir de contextualização normativa, passou à análise das impugnações feitas na ação. Ele esclareceu que o autor impugna o ato normativo sob perspectiva formal, afirmando que seu conteúdo só poderia ser veiculado por meio de lei. Para Toffoli, no entanto, o decreto não padece do referido vício, uma vez que trouxe de forma válida conteúdo normativo dentro das balizas da constitucionalidade e da legalidade.
Acerca da identificação dos remanescentes das comunidades dos quilombos e os critérios de autodefinição, Toffoli também rebateu argumento do autor de que a identificação dos remanescentes titulares do direito seria feita por mera manifestação de vontade do interessado. O ministro explicou que o reconhecimento da propriedade passou a exigir melhor definição da expressão "remanescentes das comunidades dos quilombos", conceito este de fundamental importância na identificação dos titulares do direito conferido pelo dispositivo. Toffoli acrescentou que o decreto não incide em inconstitucionalidade ao adotar o critério da autodefinição como fundamental à identificação dos remanescentes das comunidades dos quilombos.
O ministro destacou que não se questiona o critério utilizado no decreto 4.887, tendo-se definido no § 2º do art. 2º como terras ocupadas "as utilizadas para garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural". Para ele, a titulação deve recair não somente nos espaços em que o grupo mora ou vive, mas também sobre as áreas comunais, de cultivo, de estoque de recursos naturais, aquelas utilizadas para o lazer, para manifestações culturais, religiosas, para sua forma de convivência - contanto que sejam as utilizadas.
Marco temporal
No entanto, o ministro entendeu que deve ser estabelecido um marco temporal para garantir o direito dos quilombolas. Pelo entendimento, somente devem ser titularizadas as áreas que estavam ocupadas do dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. em diante.
"Não é ampliando, numa interpretação extensiva, sem limite temporal futuro, que se vai efetivar esse relevante direito. Pelo contrário, talvez tenha sido essa tentativa de ampliar em demasia o seu alcance que tenha retardado e tornado ainda mais complexa a demarcação e a titulação definitiva dessas terras."
Assim, julgou parcialmente procedente a ADIN, apenas para dar interpretação conforme ao parágrafo 2º do art. 2º, para esclarecer que só devem ser titularizadas áreas ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas na data de promulgação da CF (inclusive as efetivamente utilizadas para garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural), salvo comprovação da suspensão ou perda de posse em decorrência de atos ilícitos praticados por terceiros.
Terminado o voto-vista, ministro Edson Fachin destacou a importância e complexidade do tema, cujo julgamento no STF teve início em 2012, pedindo vista dos autos.
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Processo: ADIn 3.239
Veja o voto do ministro Toffoli.