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Entrevista

Gilvandro de Araújo, conselheiro do Cade, sustenta interlocução do órgão com demais instituições

O conselheiro ainda reflete sobre o processo judicial atrelado ao viés administrativo.

Da Redação

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Atualizado às 09:20

O conselheiro Gilvandro de Araújo, do Cade, reforça a necessidade de interlocução do órgão de defesa da concorrência com demais instituições, especialmente as do Judiciário.

Ao comentar as vantagens, por exemplo, de se esperar a decisão administrativa, o conselheiro lembra que a decisão é título executivo, "o que por si só já facilita que a empresa ou o consumidor possa entrar com a ação de reparação de danos". "Nós já temos todo um lastro probatório montado. O Cade, para condenar a empresa, já observou provas, já sabe o que é relevante, o que não é relevante."

Aliás, nos últimos anos, houve um aumento das ações civis de reparação de danos por violações à concorrência. Até 2011, foram ajuizadas pouco mais de 20 ações desse tipo, mas o incremento da atuação do Conselho no combate a cartéis potencializa esse número.

Uma das problemáticas elencadas por Gilvandro decorre da capilaridade dos atos que são apurados no âmbito do Conselho. Em muitas situações, os cartéis, por exemplo, foram orquestrados em diferentes Estados.

Judicializada a questão, por meio de ações civis de reparação, pondera que "se todo juiz for arbitrar um valor, você teria um valor de reparação que pode quebrar a empresa", lembrando o art. 55º, § 3º, do CPC, que trata da conexão dos processos por relevância. Consta no dispositivo:

"Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. (...)

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles."

Assim, o conselheiro considera que uma eventual suspensão no Judiciário desses processos, para aguardarem a decisão do Cade, pode inclusive auxiliar as partes.

"Se não tem uma prova consubstanciada, terá que ir atrás dessa prova. É muito mais difícil, o processo fica muito mais moroso. Essas coisas faz com que reflitamos sobre uma articulação desses processos de ação de reparação que são decorrentes da condenação do Cade por conduta anticompetitiva."

Um caso emblemático, por exemplo, foi a condenação de seis empresas no chamado cartel do cimento. "Quanto teve de gente lesada em um cartel de 20 anos? Quantas ações gerariam?"

De acordo com o Gilvandro, o órgão de defesa da concorrência se dedica a antever situações problemáticas, e ciente de que a judicialização é uma delas, esforça-se por incorporar algumas práticas.

"Quando pensamos em política de TCC, acordo de leniência, naturalmente isso nos atinge. Procuramos, então, trazer aquilo que é a visão do Judiciário. Qual a visão do Judiciário? Vamos seguir. O que o Judiciário entende como prova? Vamos utilizar como prova. E o contraditório? Há a sustentação oral da mesma forma."

Interlocução

Gilvandro crê que é chegado o momento de considerar possibilidades como uma decisão judicial ter impacto em uma multa administrativa. E também maior interlocução com MP, CGU, PF e outros órgãos.

"Não se trata de quem é melhor, e sim, o que cada um pode fazer de melhor. A nossa expertise, por exemplo: somos muito bons em carteis, buscar prova, fazer as conexões. O MPF, por sua vez, tem capilaridade, está no Brasil inteiro. Será que não compensaria pensar no processo atrelado ao viés administrativo? O debate não é a autonomia, mas qual a melhor solução para a política pública. As instituições devem esquecer 'o que posso fazer' e sim 'como contribuo para resolver a situação'."

Uma ideia apontada, por exemplo, é criar a cultura de previsão nos contratos da regra de arbitragem para dirimir os conflitos particulares.

"Pensar em uma regra de arbitragem para dirimir eventuais infrações às regras econômicas é um show. São cartéis que envolvem o Poder Público. Condenei cartéis que atingiram INSS, portas giratórias nas agências do BB. Se você institucionaliza também a reparação do dano através da arbitragem, você desafoga o Judiciário. E está concatenado com a lógica do compliance."