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Multa

STJ debate critérios para fixação de astreintes

Ministro Raul pediu vista em processo na 4ª turma.

Da Redação

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Atualizado às 16:08

O ministro Raul Araújo pediu vista na 4ª turma do STJ em processo que trata da fixação de astreintes. O recurso em análise tem como pano de fundo multa no valor de R$ 1 mil por dia, fixada em tutela antecipada, para que a instituição financeira baixasse o gravame do veículo da autora, o que só foi feito 407 dias depois, e por meio de ofício do juiz ao Detran.

Na sessão desta quinta-feira, 29, o ministro Luis Felipe Salomão apresentou voto-vista divergindo da relatora, ministra Gallotti.

Dispersão na jurisprudência

Inicialmente, antes de apresentar o voto aos colegas da turma, o ministro Salomão ponderou sobre a pertinência da afetação do caso para julgamento na 2ª seção. Isso porque o ministro verificou a existência de dispersão na jurisprudência nos critérios de fixação de astreintes e sua exigibilidade.

Analisando os precedentes, S. Exa. constatou que o critério na 3ª turma é voltar ao momento em que o valor foi fixado e, se naquele momento, houve excesso, altera o valor; em caso negativo, independentemente do valor que a multa alcançou, mantém o valor, sem considerar um teto, desde que se não mostre abusiva no momento da fixação.

Já na 4ª turma, os parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade da multa diária são considerados em correspondência com o valor principal, de modo que o colegiado tende a reduzir o valor das astreintes a patamares mais módicos, "à vista da exacerbação da multa cominatória".

"Acho ruim para um Tribunal como o nosso; o critério é lotérico: se for para a 3ª turma, mantém a multa; na 4ª, reduz para o valor da obrigação."

A relatora, porém, compreendeu que o caso concreto não era o ideal para a afetação do recurso, especialmente porque considera que o limite não seja o valor do dano material, e sim que a multa é exorbitante desde quando fixada.

No caso, a ministra reduziu o valor, que atualmente está em R$ 407 mil, para R$ 33 mil, utilizando como parâmetro o valor da indenização por dano moral e material determinado na sentença.

Proporcionalidade e razoabilidade

Com a negativa de afetação, o ministro Salomão prosseguiu com a leitura do voto-vista. Consignou inicialmente que a multa cominatória é acessória e coadjuvante, não se revelando como mais bem jurídico perseguido pelo autor.

Nesse sentido, ora se sobressai o valor da efetividade da tutela judicial, ora a vedação ao enriquecimento sem causa. "Às vezes paga-se multa que supera o interesse principal em juízo. E frequentemente a multa é reduzida, muito embora na contramão da obrigação do devedor que se quedou inerte."

Assim, avaliou que o melhor caminho levará em conta a um só tempo o momento em que a multa é aplicada e o momento em que se converte em crédito, considerando que diante da "feição coercitiva" da multa, o magistrado espera que, em verdade, ela não incida concretamente.

Nesse sentido, ponderou acerca da vinculação do valor da multa com a expressão monetária do valor principal, levando-se em conta a proporcionalidade, a razoabilidade e a dignidade da pessoa humana.

Parâmetros

No voto, o ministro Salomão elencou quatro parâmetros que deveriam guiar o juiz na fixação das astreintes. São eles: (i) o valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado, (ii) o tempo/periodicidade; (iii) a capacidade econômica e a capacidade de resistência do devedor; e por fim (iv) o princípio do dever do credor de mitigar o próprio prejuízo e a possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado para cumprimento da obrigação.

No caso concreto, a tutela antecipada foi em 7/2/13, determinando à instituição financeira que em prazo de 72h, sob pena de multa diária de R$ 1 mil, fizesse o registro de gravame e se abstivesse de fazer a busca e apreensão. A citação e intimação da ré foi em 14/4/13, mas o cumprimento da determinação se deu 407 dias depois, por ordem do juízo. A sentença fixou R$ 33 mil de danos morais e materiais, valor pago pela instituição financeira em 15/5/14. Então, a agravante requereu o pagamento das astreintes do saldo devedor em razão da recalcitrância no cumprimento.

"A multa coercitiva tinha como intento principal a retirada do gravame sob o veículo da autora e se abstivesse de fazer a busca e apreensão. A obrigação principal era a liberação incondicional do veículo, permitindo sua transferência, e por conseguinte o valor do automóvel na época, de R$ 110 mil. A multa não foi apta a levar a instituição a cumprir. A opção pelo descumprimento lhe pareceu mais vantajosa."

Para Salomão, o próprio credor poderia ter requerido ao juiz que oficiasse diretamente ao Detran para alcançar a pretensão, "mostrando a desnecessidade da multa".

Concluindo que o valor de mais de R$ 400 mil "foge muito à razoabilidade" tendo em conta o valor da obrigação principal (o veículo), reduziu a multa para R$ 100 mil, corrigidos monetariamente, dando parcial provimento ao agravo da instituição.

A ministra Gallotti, embora ressaltando que concorda com todos os critérios do ministro Salomão, reiterou voto considerando que o valor do bem em disputa não era o do veículo, e sim o dos danos fixados na sentença.

"Em momento algum foi a autora desapossada do carro. A multa correu 407 dias não apenas por inadvertida inação da instituição financeira, mas também da parte que, diante da sentença, e em todo momento da tramitação processual em que vigia a antecipação de tutela, não tomou essa providência de pedir ao juiz simples ofício dirigido ao Detran. Não havia sequer necessidade dessa tutela antecipada."

Salomão ainda destacou que a autora teve o carro bloqueado por todo o período, e não seria "razoável" imputar todo o desgaste a ela, mas Gallotti argumentou que não consta no acórdão que ela ficou com o veículo parado, ou que tentou vender. Após o voto-vista do Salomão, pediu vista o ministro Raul.

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