Presidente Lula tem vocação para ser traído, diz Busato
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Da Redação
sexta-feira, 5 de maio de 2006
Atualizado às 08:19
Presidente Lula tem vocação para ser traído, diz Busato
O presidente nacional da OAB, Roberto Busato, afirmou ontem (4) que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem vocação para ser traído. "Ele começou a ser traído por seus amigos, por seus partidários e, agora, começa a ser traído também na aliança continental que se pretendia fazer com os seus irmãos da Venezuela e da Bolívia". A afirmação foi feita por Busato durante entrevista concedida hoje, referindo-se à atitude o presidente da Bolívia, Evo Morales, que teria confirmado a Lula que não interferiria na produção de gás natural pela Petrobras em território boliviano.
"Essa aposta que foi feita pelo governo brasileiro na eleição do presidente Evo Morales foi um vôo cego, um vôo que pode levar ao abismo tudo o que o Brasil investiu naquele país por meio da Petrobras, que é uma empresa pública", afirmou Busato, lembrando que foram aplicados nas operações da Petrobras naquele país aproximadamente US$ 3,5 bilhões e que choques como esse colocam em risco a integridade do Mercosul.
Na avaliação de Busato, a nacionalização e tomada militar das refinarias da Petrobras na Bolívia ferem os interesses brasileiros e são um atentado à soberania do país. Para ele, o Brasil pode recorrer a alguma Corte internacional para reclamar seus direitos depois de esgotar todos os seus canais de relações internacionais com o governo boliviano. "O que houve foi um descumprimento violento desses contratos com a Petrobras e, evidentemente, existem organismos internacionais que poderão regular esse assunto".
O presidente da OAB condenou, ainda, a criação da chamada "república bolivariana", como vem defendendo o presidente venezuelano, Hugo Chavez, e criticou as intervenções feitas por Chavez com o claro intuito de assumir a liderança na América Latina. "Nós não temos nenhuma familiaridade com o próprio Simon Bolívar, que foi um líder da América hispânica. E a América hispânica nunca conseguiu se unir, sempre esteve dividida, enquanto o Brasil conseguiu unificar seu território e sua população dentro de suas fronteiras", afirmou Busato. "Enquanto que na América hispânica os conflitos são baseados exatamente em quebras de soberania, ofensas, interferências no campo eleitoral dos outros países, o que nós não podemos aceitar".
A seguir, a íntegra da entrevista concedida pelo presidente nacional da OAB, Roberto Busato, ao programa Direto de Brasília da TV Bandeirantes:
P - Os presidentes do Brasil, Bolívia, Venezuela e da Argentina estão reunidos hoje em Porto Iguaçu, na Argentina. Discutem a situação criada com a decisão boliviana de nacionalizar e ocupar militarmente unidades da Petrobras naquele país. A OAB acha que o presidente Lula foi traído?
R - Parece que o presidente Lula tem uma vocação, a de ser traído. Ele começou a ser traído por seus amigos, por seus partidários e, agora, começa a ser traído também na aliança continental que se pretendia fazer com os seus irmãos da Venezuela e da Bolívia. O Brasil não pode aceitar um atentado à sua soberania da forma como feito pelo governo boliviano, ao tomar militarmente as refinarias da Petrobrás, e ao editar essa lei que Evo Morales acabou por baixar, contrariando todos os interesses brasileiros, apesar de, até à véspera, ele ter afirmado que não iria praticar tal ato contra os interesses do Brasil, como parceiro que é junto à Bolívia.
P - O que preocupa mais é que se soube hoje pela manhã que a Bolívia sequer participa da Organização Mundial do Comércio. Ou seja, o Brasil não pode denunciar o país pelos contratos rompidos com a Petrobrás, que iam até 2019. Para piorar, Evo Morales disse também que quer aumento nos preços do gás. Isso complica mais a situação?
R - Sem dúvida. Acho que o Brasil nesse ponto foi um tanto quanto imprevidente. Além disso, essa aposta que foi feita pelo governo brasileiro na eleição do presidente Evo Morales foi um vôo cego, um vôo que pode levar ao abismo tudo o que o Brasil investiu naquele país por meio da Petrobras, que é uma empresa pública. Aplicamos lá, aproximadamente, três bilhões e meio de dólares e estamos sujeitos a termos problemas para equilibrar as condições desse contrato que foi firmado com aquele país.
P - Na sua opinião, que medidas legais podem ser tomadas em relação a um ato como esse?
R - O Brasil poderá recorrer alguma Corte internacional depois, é claro, de esgotar todos os seus canais de relações internacionais com a equipe boliviana. Parece-me que a coisa anda mal neste ponto, no quesito dessas relações.
P - Contratos mal feitos, o senhor acredita?
R - Não, acredito que não se tratem de contratos mal feitos. Eu não acredito que a Petrobras, pelo porte e sua experiência no campo internacional, tenha feito contratos mal elaborados. O que houve foi um descumprimento violento desses contratos com a Petrobras e, evidentemente, existem organismos internacionais que poderão regular esse assunto.
P - O senhor enxerga na ação de Hugo Chavez um trabalho de quem quer assumir a liderança na América Latina?
R - Hugo Chavez tem feito um trabalho de péssima qualidade para a unidade continental. É uma pessoa altamente extravagante, que já dividiu o próprio país e colocou segmentos contra segmentos. O próprio Colégio de Advogados da Venezuela é hoje completamente dividido entre chavistas e anti-Chavez e Chavez tem espalhado esse sistema não-recomendável para toda a América-hispânica.
P - Ele está pregando aí uma tal de "república bolivariana".
R - E o que nós temos a ver com isso?
P - Pois é...
R - Nós não temos nenhuma familiaridade com o próprio Simon Bolívar, que foi um líder da América hispânica. E a América hispânica nunca conseguiu se unir, sempre esteve dividida, enquanto o Brasil conseguiu unificar seu território e sua população dentro de suas fronteiras. Não tivemos nenhum conflito maior com relação aos nossos vizinhos. Todos os conflitos que tivemos foram totalmente dirimidos por meio de tratados, acordos e relações diplomáticas amistosas com os nossos vizinhos. Enquanto que na América hispânica os conflitos são baseados exatamente em quebras de soberania, ofensas, interferências no campo eleitoral dos outros países, o que nós não podemos aceitar. Não podemos aceitar nem que Chavez venha ao Brasil dizer que apóia o presidente Lula para uma reeleição, assim como não podemos aceitar que o presidente Lula vá a um outro país e queira interferir em sua política eleitoral, como o fez por ocasião da eleição de Evo Morales, que, agora, lhe devolve o apoio recebido desta maneira.
P - Esses choques todos podem acabar com o Mercosul?
R - Eles colocam em risco porque o Mercosul nunca conseguiu se solidificar por inteiro. Se nós não conseguirmos superar um evento desses de forma tranqüila e íntegra, esses conflitos poderão sim definir uma nova posição para o Mercosul. Nós estamos vendo aí a Argentina um tanto quanto em cima do muro, como sempre fez. Aliás, eu não entendo porque o presidente Lula aceitou se reunir hoje com Evo Morales com a presença de Hugo Chavez. A Argentina tudo bem, que tem certo interesse nessa medida porque teve empresas afetadas por essa nova situação. Agora o jogo foi marcado, talvez, no aguardo de um resultado diverso.
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