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Entrevista

"Ficha limpa é insuficiente para barrar candidatos", diz Walter Guilherme

Em entrevista, o desembargador aposentado fala da PEC dos 75, da redução da maioridade penal e da relação entre política e o Judiciário.

Da Redação

terça-feira, 12 de maio de 2015

Atualizado às 09:04

"Ficha limpa é insuficiente para barrar candidatos." A afirmativa é do desembargador aposentado Walter de Almeida Guilherme, consultor da banca Almeida Guilherme Advogados Associados. Em entrevista ao Diário do Grande ABC, Guilherme avaliou que a lei da ficha limpa é boa, mas ainda insuficiente para impedir candidaturas irregulares com a Justiça.

Guilherme também falou sobre a PEC da bengala, destacando ponto positivo, mas entende que, se futura lei complementar ampliar a regra a juízes estaduais e federais, haverá engessamento do Judiciário. Concluiu dizendo que vê 70 anos como uma idade razoável. Para o desembargador aposentado, melhor do que estipular uma entrada mínima para ingresso no Supremo, como foi questionado, seria estipular um limite de permanência.

Sobre a indicação de Luiz Edson Fachin para ministro do Supremo, ele acredita na aprovação. Apesar de entender que é difícil para a opinião pública, considerando que Fachin advogou para o MTST, mas desconsidera que o novo ministro decidiria partidariamente (algo) para retribuir favor.

Ao comentar a Operação Lava Jato, Guilherme apontou tom de vaidade do juiz Sérgio Moro, mas ponderou que, aparentemente, está julgando com isenção.

Aposentado como desembargador convocado pelo STJ, contou que retirou, recentemente, o registro da OAB. "Agora vou ser advogado, com número da OAB de recém-formado".

Confira a íntegra da entrevista.

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O sr. atuou no início de carreira na região e se aposentou como ministro do STJ. Como foi essa experiência?

Fiquei em Mauá, como promotor, em 1974. Foram 20 anos no Ministério Público, de 1969, logo depois que me formei na USP, até 1989, quando era procurador de Justiça. Fui parar no Tribunal de Justiça (de São Paulo), a maior parcela, na parte criminal. Eu me tornei desembargador em 1997. Fiquei quatro anos no TRE/SP, sendo dois como presidente (2010 e 2011). Foram 26 anos no Judiciário. Depois disso, um amigo, no ano passado, me questionou se eu aceitaria ficar um tempo no STJ. O máximo era de 65 anos e eu já estava para me aposentar, com 69 anos. O presidente Falcão me convocou. Fiquei período de oito meses. Eu me aposentei ministro nessas circunstâncias. Foram 46 anos de carreira. Agora vou ser advogado, com número da OAB de recém-formado, porque na minha época não existia. E estou estudando psicanálise.

Como o sr. avalia a PEC dos 75, aprovada, recentemente, pelo Senado?

Foi aprovada para os tribunais superiores, por enquanto, STF e TCU, estendendo de 70 para 75 anos a aposentadoria compulsória. Acredito que nesta idade ainda está apto a fazer julgamento. Tenho 70 e continuo com condições plenas. Estava, por exemplo, no STJ. Esse é o aspecto positivo: a experiência vasta de julgador, continuando a prestar serviços. Vejo esse ponto como lucratividade. Por outro lado, se a futura lei complementar for avalizada e ampliar essa regra para juízes estaduais e federais haverá, de fato, engessamento do Poder Judiciário. É a questão de oxigenação. Rodízio de juízes é bom. Somando de um lado e de outro acredito que 70 anos já é razoável, suficiente.

Não seria necessário aumentar o limite mínimo para entrar no Supremo, por exemplo?

A vitaliciedade é garantia importante, mas não veria com maus olhos certo limite. Não mais do que 30 anos, como ocorre no âmbito militar. Não acho a melhor solução ficar período muito longo. Aumentar para 45 anos a idade mínima, talvez, fosse razoável. O que gostaria que acontecesse é não deixar tanto tempo, por exemplo, 40 anos. Isso não é modelo ideal. Não é bom para a sociedade alguém se perpetuar no cargo nesta maneira. Deveria se estipular limite de permanência.

Se fala tanto que a Suprema Corte, o Judiciário, está se politizando. Como o sr. considera esta avaliação?

Entendo que o Poder Judiciário e, é inevitável, que no momento de decidir o faça ponderando politicamente. Não é possível interpretar a Constituição - essa é função mais importante do Supremo -, se não tiver cálculo político e falo isso excluindo por completo político-partidária. Isso jamais poderia acontecer, porque o juiz perderia sua imparcialidade. Agora julgar de certa forma entendendo as consequências políticas das suas decisões é importante. Acho impossível não decidir neste sentido, politicamente. A política é mundo do juízo de valor. Se faz opções, jamais afastando-se da lei, dentro da interpretação que é dado a fazer. Juiz tem de medir as consequências de sua escolha.

No Supremo, dois então advogados Geral da União, Gilmar Mendes, indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e Dias Toffoli, por Luiz Inácio Lula da Silva, são criticados justamente por esta questão. Não deveria existir certo distanciamento?

Como fui juiz e promotor durante tantos anos acredito que não vai se colocar credo partidário em suas decisões. Citam também que o Ricardo Lewandowski era amigo da família do Lula. Na hora de decidir, creio na imparcialidade. Ele pode ter suas convicções. É impossível não concluir com a consciência. Dizer que juiz é neutro é absolutamente falso. Juiz nunca é neutro. Não pode. Ninguém é. O que precisa é ser imparcial.

Em relação à polêmica sobre a indicação do advogado Luiz Edson Fachin ao STF pela presidente Dilma Rousseff, o sr. avalia que passa mesmo neste momento conturbado?

Acredito que passa. Se ele for nomeado não vai influenciar no ponto de vista político. Anula aquilo que possa ter de parcialidade. Mas concordo que para a opinião pública é difícil por ter advogado para o MTST. É preciso que a sociedade confie. Para resguardar. Intrinsecamente não vejo razão para colocar em dúvida. Mas sei que juiz tem de ser e parecer imparcial, sério, honesto. Poderia então se estabelecer certas restrições. A Constituição só fala: notável saber jurídico e reputação ilibada. São duas necessidades, além de idade superior a 35 anos. Talvez colocar quem já ocupou um ou outro cargo. Só que não veria isso com bons olhos. Desconsidero que ele decidiria partidariamente (algo) para retribuir favor. Não entendo assim.

O sr. acredita que o julgamento do Mensalão foi partidário, como alegam alguns líderes petistas?

Considero que não. Se aproximou o máximo possível da imparcialidade.

Mas a pressão da mídia, na sua opinião, pode ter influenciado na decisão?

Há pressão inegável da mídia, em geral, para prender as pessoas. O mais tempo possível e mais rápido possível. Em muitos casos, há clamor da sociedade. Só que não dá para dizer que é decisivo. É elemento inevitável. Vou dar exemplo. A sociedade não entende para qual motivo serve a prisão preventiva. Quando eu era do tribunal, em milhares de casos, o que mais satisfazia era conceder a liberdade, desde que entendesse que estava dentro da lei. Existe dificuldade. Isso porque a mídia diz, amigos dizem e parentes dizem. Cometeu homicídio e vai sair pela porta da frente? Esse é o questionamento. Inverto a situação. Prende e fica até quando? E se for absolvido? Quem vai ressarcir? Fica um, dois anos preso. Tem a vida destruída. Agora o que realmente causa grande preocupação é que sai e demora muito para ser julgado. Mas não se pode condenar ninguém antes do processo.

A ação do momento é a Operação Lava Jato, que apura crimes na Petrobras. Como o sr. vê a atuação do juiz Sérgio Moro?

Sempre achei perigosa a vaidade. Alguns não deixam de vestir a carapuça. Se ele fosse candidato, não digo presidente, mas seria eleito para qualquer posto de alta relevância. Provavelmente, ele gosta. Mas aparentemente o Moro está julgando com isenção e sendo razoável nas decisões. Sobre a operação em si, eu só julguei um caso no STJ, um dos primeiros de habeas corpus. Naquela situação até disse que os bandidos estão perdendo a noção das coisas. O (ex-gerente da estatal) Pedro Barusco teria dito que recebeu US$ 70 milhões (de propina). Se assessor desviou isso, imagina um diretor? Mas só me habituei a julgar as coisas lendo os processos.

A proposta de redução da maioria penal tramita no Congresso com chance de aprovação. O sr. defende esta medida?

Sou absolutamente descrente da pena de prisão tal qual é cumprida. É inócua. De maneira geral, não preenche nenhum dos requisitos. Falar em ressocialização é risível. Sugerir na prevenção de cometer crime, também não. Quem está disposto a isso não pensa na consequência. A função preventiva não cumpre. Resta a única coisa que poderia entender: a vítima se sente um pouco confortável. Mas a pena não pode ser só para isso. Preso sempre volta pior do que entrou, invariavelmente. Sobre o ponto de vista de utilidade não vejo nenhuma na redução de 18 para 16. Mas acho que 16 anos dentro das circunstâncias está apto para discernir. Possui a mesma imputabilidade daquele que tem 18. Neste aspecto concordo com a redução, do ponto de vista conceitual. Mas não acredito que seria benéfico. Seria inútil, não vai melhor em nada para a sociedade.

O que é possível se fazer para valer efetivamente a lei da ficha limpa?

Batalhei bastante pela aplicação desta lei. É boa, mas concordo que é falha e insuficiente para barrar (todas as candidaturas com condenação em segundo grau). Seria necessário fechar as brechas. Foi um passo. Outros tantos precisam ser dados. Como tornar mais rápida e eliminar antagonismos. Há várias leis que se contrapõem uma a outra. Não é conjunto harmonioso. Isso permite que de fato condenados fiquem impunes. A lei eleitoral está defasada, desatualizada, não há dúvida. Sofre com multiplicidade de recursos, em termos gerais. Precisa ficar mais ágil e eficaz. Entretanto, a maioria sabe quem são os políticos desonestos e são reeleitos. A legislação está para proteger eleitor de si mesmo.

Como o sr. enxerga a eterna briga entre MP e Judiciário na questão da legalidade da investigação da Promotoria?

Defendo que o MP possa investigar. É órgão bem equipado. Pode e deve. Isso está há anos no Supremo. Há quem se destina a prova colhida? Ao MP. Nada mais natural que possa investigar. Ele apresenta a denúncia formal. Dá para fazer em conjunto com a polícia civil. A única coisa é que só não pode escolher o que investigar.

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