Cadastro de contribuinte divide o meio jurídico
Veja a matéria de Gilmara Santos da Gazeta Mercantil
Da Redação
segunda-feira, 30 de junho de 2003
Atualizado em 27 de junho de 2003 15:54
Veja abaixo a matéria da jornalista Gilmara Santos da Gazeta Mercantil.
Cadastro de contribuinte divide o meio jurídico
Advogados questionam a constitucionalidade da proposta. O governo federal está empenhado em acabar com o crime de lavagem de dinheiro. Para isso, anunciou no início do mês as primeiras quatro medidas, de um total de 12, previstas no pacote de combate à lavagem de dinheiro elaborado pelo Ministério da Justiça e pelo Banco Central. No entanto, as medidas criaram divergências dentro do meio jurídico e a possibilidade de sua constitucionalidade ser questionada junto ao Supremo Tribunal Federal é grande. O problema, segundo os advogados, estaria em duas das quatro medidas anunciadas: a criação de um cadastro geral de correntistas, gerenciado pelo Banco Central e a obrigatoriedade de identificação de saques e depósitos bancários em valor superior a R$ 100 mil.
"O projeto é inconstitucional porque fere o sigilo bancário e atenta contra os direitos individuais", afirma o advogado Milton Zlotnik, do escritório Zlotnik Advogados Associados. Para o advogado, o Banco Central está generalizando os correntistas brasileiros. "Se uma pessoa tem um ganho mensal elevado, se o valor for declarado no imposto de renda, se os impostos sobre este valor forem pagos e o dinheiro não for proveniente de atos ilícitos, nada há de irregular", exemplifica Zlotnik. "O correntista só pode ter o seu sigilo bancário quebrado por meio de solicitação da Receita Federal, com base em um argumento de acusação plausível, e cabe ao consumidor sua defesa por mandado de segurança devidamente analisado e assinado por um juiz", diz o advogado.
Para o advogado Osmar Simões, do escritório Motta, Fernandes Rocha Advogados, o governo federal está no caminho certo para combater esse crime, no entanto, ele afirma que não deveria ser criado um cadastro para as contas correntes. "Essa medida é um cheque em branco que pode ter propósitos nobres como também obscuros", argumenta Simões. Segundo o advogado, a violação estaria no na Lei 4.595/64, que regula o sistema bancário e estabelece o sigilo bancário. Além disso, comenta Simões, a própria Constituição Federal garante o direito ao sigilo. "Não está previsto na Constituição a questão do sigilo bancário, mas ela garante o sigilo à privacidade, que os dados pessoais não sejam divulgados e se enquadraria perfeitamente o sigilo bancário", comenta.
Para Simões, o problema está no fato do governo transferir para terceiros a responsabilidade de fiscalização. "Cabe ao Estado identificar os atos ilícitos e fazer as investigações necessárias", diz o advogado, comentando que as pessoas que praticam atos ilícitos vão procurar mecanismos mais engenhosos para fazer. "As coisas não se resolvem com essa simplicidade", conclui Simões.
O advogado André Marques Gilberto, do escritório Araújo e Policastro Advogados afirma que à primeira vista há suspeita de inconstitucionalidade tornar os dados de todos os correntistas disponíveis ao Banco Central. "O próprio governo está estudando a constitucionalidade do projeto, talvez haja mudanças, temos que aguardar", pondera.
"Não considero inconstitucional porque o Banco Central já tem acesso aos dados e o sigilo bancário não pode ser entendido como forma de limitar a atuação dos órgãos para fins de fiscalização", comenta José Eduardo Queiroz, do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados. Para Queiroz, o governo necessita de mecanismos de viabilidade de informações para realizar a fiscalização. "O sigilo bancário das pessoas será preservado, mas o governo tem muita dificuldade instrumental para detectar a lavagem de dinheiro", finaliza Queiroz.
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