Portaria confere efeitos retroativos a parecer da AGU sobre aquisições de propriedade rural por estrangeiros
Imbróglio refere-se ao direito de aquisição e arrendamento de propriedade rural por estrangeiro, limitado pela lei 5.709/71 e seu regulamento, o decreto 74.965/74.
Da Redação
quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014
Atualizado às 16:22
Assinada pelo advogado-Geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, e pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, a portaria interministerial 4, de 25 de fevereiro de 2014, publicada ontem no DOU, regulamenta os efeitos do parecer AGU/LA 1/10 a "situações jurídicas aperfeiçoadas no período compreendido entre 7 de junho de 1994 e 22 de agosto de 2010". (grifo nosso)
Aquisição de propriedade rural por estrangeiros
O imbróglio refere-se ao direito de aquisição e arrendamento de propriedade rural por estrangeiro, limitado pelas disposições da lei 5.709/71 e seu regulamento, o decreto 74.965/74.
Por meio do parecer GQ-22/94, aprovado pela Presidência da República mas não publicado no DOU (clique aqui para ver a diferença de efeitos), a AGU havia expressado entendimento segundo o qual a ressalva do §1°, do art. 1°, da lei 5.709/71, não havia sido recepcionada pela CF, cujo texto não admitia restrições de nenhuma ordem à atuação de empresas brasileiras, ainda que controlada por estrangeiros, que não as previstas no próprio texto da CF.
Em agosto de 2010, no entanto, a AGU mudou de opinião, trazendo a lume o parecer AGU/LA 1/10 e revogando o parecer GQ-22/94. Após algumas considerações acerca do "novo cenário da economia mundial", e com fundamento no tratamento restritivo ao capital estrangeiro conferido pelo ordenamento em outros setores da economia ("saúde, comunicações, pesquisa minerária, etc.") o Parecer AGU/LA 01/2010 concluiu pela recepção integral da lei 5.709/71 pela CF, tanto em sua redação originária (!), quanto após a EC 6/95.
O parecer AGU/LA 1/10 foi aprovado pela Presidência da República e publicado no DOU em agosto de 2010, passando a vincular os órgãos da administração direta Federal.
Em que pesem a todos os princípios gerais de direito e a todas as disposições legais em contrário - inclusive o art. 2°, § único, XIII, da lei 9.784/99, lembrado pelo próprio texto da portaria, segundo o qual é "vedada aplicação retroativa de nova interpretação" - a portaria pretende alcançar atos jurídicos perfeitos que não contrariaram a interpretação conferida à lei à época em que ocorreram.
Entendimento controverso
Ao lado da mudança de opinião, interpretações divergentes contribuíram para acirrar a insegurança jurídica sobre o tema.
Diante da recomendação expedida pelo CNJ ainda em julho de 2010, para que os Cartórios de Registro de Imóveis e Tabelionatos de Notas observassem as restrições contidas na lei 5.709/71 (portanto no mesmo sentido do Parecer AGU/LA 01/2010, entendendo pela recepção do diploma pela CF), a Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo emitiu orientação normativa em sentido contrário, entendendo que "para fins de apropriação privada de bem imóvel rural, a equiparação [entre empresa brasileira controlada por estrangeiro e empresa estrangeira] não tem amparo na Constituição de 1988".
Com esse fundamento, apareceram acórdãos do TJ/SP apoiados na não recepção das restrições da lei 5.709/71 pela CF.