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STJ

STJ reúne julgados sobre a questão do direito ao esquecimento

Matéria especial do STJ aborda direito ao esquecimento e relembra a Chacina da Candelária e o caso de Aída Curi.

Da Redação

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Atualizado às 08:24

O STJ divulgou neste domingo, 20, matéria especial acerca do direito ao esquecimento. No texto, são abordados os casos da Chacina da Candelária (REsp 1.334.097) e de Aída Curi (REsp 1.335.153), em que este direito foi evocado.

No primeiro caso, a 4ª turma do STJ reconheceu o direito ao esquecimento para um homem inocentado da acusação de envolvimento na chacina da Candelária, que anos depois de absolvido foi retratado pelo programa Linha Direta, da TV Globo.

Já no segundo caso, a mesma 4ª turma negou direito de indenização aos familiares de Aída Curi, por entender que, neste caso, "o acolhimento do direito ao esquecimento, com a consequente indenização, consubstancia desproporcional corte à liberdade de imprensa, se comparado ao desconforto gerado pela lembrança".

Chacina da Candelária

A 4ª turma do STJ reconheceu o direito ao esquecimento para um homem inocentado da acusação de envolvimento na chacina da Candelária, que anos depois de absolvido foi retratado pelo programa Linha Direta, da TV Globo. Ele foi apontado como coautor da chacina da Candelária.

No recurso, o homem sustentou que recusou pedido de entrevista feito pela TV Globo, mas mesmo assim o programa veiculado em junho de 2006 citou-o como um dos envolvidos na chacina, posteriormente absolvido.

Ele ingressou na Justiça com pedido de indenização, sob o argumento de que sua citação no programa levou a público, em rede nacional, situação que já havia superado, reacendendo na comunidade onde reside a imagem de chacinador e o ódio social, e ferindo seu direito à paz, anonimato e privacidade pessoal. Alegou, ainda, que foi obrigado a abandonar a comunidade para preservar sua segurança e a de seus familiares.

Ao analisar a ação, a 4ª turma entendeu que o réu condenado ou absolvido pela prática de um crime tem o direito de ser esquecido, pois se os condenados que já cumpriram a pena têm direito ao sigilo da folha de antecedentes e à exclusão dos registros da condenação no instituto de identificação, por maiores e melhores razões aqueles que foram absolvidos não podem permanecer com esse estigma, conferindo-lhes a lei o mesmo direito de serem esquecidos.

Concluiu, ainda, que a ocultação do nome e da fisionomia do autor da ação não macularia sua honra nem afetaria a liberdade de imprensa. A sentença então foi mantida e a emissora ao pagamento de indenização no valor R$ 50 mil.

Caso Aída Curi

A história desse crime foi apresentada no programa Linha Direta com a divulgação do nome da vítima e de fotos reais, o que, segundo seus familiares, trouxe a lembrança do crime e todo sofrimento que o envolve.

Os irmãos da vítima então entraram com ação contra a emissora com o objetivo de receber indenização por danos morais, materiais e à imagem. Por maioria de votos, o STJ entendeu que, nesse caso, o crime era indissociável do nome da vítima. Isto é, não era possível que a emissora retratasse essa história omitindo o nome da vítima.

Segundo os autos, a reportagem só mostrou imagens originais de Aída uma vez, usando sempre de dramatizações, uma vez que o foco da reportagem foi no crime e não na vítima. Assim, a turma decidiu que a divulgação da foto da vítima, mesmo sem consentimento da família, não configurou abalo moral indenizável.

Mesmo reconhecendo que a reportagem trouxe de volta antigos sentimentos de angústia, revolta e dor diante do crime, que aconteceu quase 60 anos atrás, a turma entendeu que o tempo, que se encarregou de tirar o caso da memória do povo, também fez o trabalho de abrandar seus efeitos sobre a honra e a dignidade dos familiares.

Esquecimento na internet

O direito ao esquecimento tem sido abordado na defesa dos cidadãos diante de invasões de privacidade pelas mídias sociais, blogs, provedores de conteúdo ou buscadores de informações.

O instituto vem ganhando contornos mais fortes em razão da facilidade de circulação e de manutenção de informação pela internet, capaz de proporcionar superexposição de boatos, fatos e notícias a qualquer momento, mesmo que decorrido muito tempo desde os atos que lhes deram origem.

Autor do enunciado 531, o promotor de Justiça do RJ Guilherme Magalhães Martins explica que o direito ao esquecimento não se sobrepõe ao direito à liberdade de informação e de manifestação de pensamento, mas ressalta que há limites para essas prerrogativas.

O promotor ainda esclarece que, apesar de não ter força normativa, o enunciado 531 remete a uma interpretação do CC referente aos direitos da personalidade, ao afirmar que as pessoas têm o direito de ser esquecidas pela opinião pública e pela imprensa.

O desembargador do TRF da 5ª região Rogério Fialho Moreira, que coordenou a Comissão de Trabalho da Parte Geral na VI Jornada, explica que este enunciado garante apenas a possibilidade de discutir o uso que é dado aos eventos pretéritos nos meios de comunicação social, sobretudo nos meios eletrônicos. De acordo com ele, na fundamentação do enunciado ficou claro que o direito ao esquecimento não atribui a ninguém o direito de apagar fatos passados ou reescrever a própria história.

"Não é qualquer informação negativa que será eliminada do mundo virtual. É apenas uma garantia contra o que a doutrina tem chamado de superinformacionismo. O enunciado contribui, e muito, para a discussão do tema, mas ainda há muito espaço para o amadurecimento do assunto, de modo a serem fixados os parâmetros para que seja acolhido o esquecimento de determinado fato, com a decretação judicial da sua eliminação das mídias eletrônicas", diz o magistrado.

Parâmetros que serão fixados e orientados pela ponderação de valores, de modo razoável e proporcional, entre os direitos fundamentais e as regras do CC sobre proteção à intimidade e à imagem, de um lado, e, de outro, as regras constitucionais de vedação à censura e da garantia à livre manifestação do pensamento.

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