Carlos Ayres de Britto, novo ministro do STF
Veja a entrevista de Ayres de Britto
Da Redação
quarta-feira, 7 de maio de 2003
Atualizado às 08:13
Carlos Ayres de Britto, novo ministro do STF
Lula anunciou em Aracaju (SE) o nome do advogado sergipano Carlos Ayres de Britto, como um dos indicados para ocupar uma das três vagas de ministro do STF que foram abertas devido à aposentadoria dos atuais titulares.
O advogado e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFSE) Carlos Ayres de Britto, escolhido pelo presidente para ocupar uma das vagas abertas no STF, tem forte perfil político. Em 1990, ele concorreu a deputado pelo PT e tentou disputar o Senado em 2002, mas teve o nome rejeitado pela convenção do partido.
Em entrevista ao jornal Correio Braziliense, Britto faz uma avaliação do Poder Judiciário e diz defender o controle externo deste Poder. Veja:
CORREIO BRAZILIENSE - Sempre foi um projeto do senhor chegar ao STF?
AYRES BRITTO - Nunca pensei, jamais cogitei. Porém, o professor Celso Bandeira de Mello, lá em São Paulo, lançou a minha pré-indicação, me pediu para não refugar o convite que ele trabalharia junto com outros luminares do direito brasileiro. O fato é que eu encarei por esse prisma e coloquei meu nome à disposição. Agora estamos chegando ao final de um processo vitorioso.
CORREIO - O senhor chega ao Supremo num momento de discussões polêmicas. Há dias, o próprio presidente Lula defendeu que seja aberta a ''caixa-preta do Judiciário''. Qual o pensamento do senhor sobre o controle externo da Justiça?
BRITTO - Simpatizo com a idéia do controle externo, embora por mecanismos até não-convencionais. Chamemos esse mecanismo de heterodoxo. Por exemplo, eu considero a TV Justiça um poderoso e eficaz mecanismo de controle externo do Judiciário. O problema do controle externo está na composição de um conselho que exerça esse papel. Contanto que não interfira no mérito das causas julgadas pelo Poder Judiciário. Penso que, desse conselho, não deva fazer parte nenhuma pessoa do Poder Executivo, para que não haja o menor risco de ofender a independência do Judiciário.
CORREIO - Diz-se que a falta do controle externo é a causa das irregularidades que têm surgido no Poder Judiciário. O senhor concorda?
BRITTO - Não tenho elementos para dar uma resposta assim, de bate-pronto. Mas enquanto cidadão e estudioso do direito, longe das instâncias judiciais, acho que é uma idéia a ser discutida com carinho, com abertura.
CORREIO - Como o senhor avalia o Poder Judiciário?
BRITTO - Entendo que a partir da Constituição de 1988 o Judiciário vem fazendo um esforço de aperfeiçoamento, de depuração de seu funcionamento. O recrutamento que se fez foi mais criterioso, do ponto de vista da imparcialidade dos concursos. A magistratura vem se qualificando, assim como o Ministério Público.
CORREIO - Qual a punição que o senhor defende para casos de venda de sentenças?
BRITTO - Se apurada a venda de sentenças, a punição tem de ser drástica, de acordo com a própria legislação penal, que é severa na matéria.
CORREIO - Outro ponto polêmico com o qual o senhor vai lidar como ministro do Supremo é a cobrança de contribuição de inativos, prevista na proposta de reforma da Previdência que o governo encaminhou ao Congresso. Qual a sua opinião a respeito disso?
BRITTO - No passado, eu já me posicionei contra a taxação de inativos por legislação ordinária. Agora, o presidente Lula está propondo a taxação por meio de emenda constitucional. Não é uma proposta coincidente com a do professor Fernando Henrique Cardoso. Os aspectos da nova reforma são múltiplos. Eu estou me debruçando sobre a reforma para vê-la, ponto por ponto, e não tenho ainda um raciocínio fechado. Estou analisando para ver até que ponto existe constitucionalidade ou não.
CORREIO - Um dos pontos da proposta de reforma tributária governo que mais se discute é a forma de cobrança do ICMS. Os estados do Nordeste querem que a cobrança ocorra no local de destino dos produtos. Como o senhor vai lidar com essa questão?
BRITTO - Do ponto de vista de política legislativa, é claro que eu gostaria que o eixo fosse alterado e o local da cobrança fosse o local de destinação da mercadoria e não de produção. Porque está caracterizado que os estados produtores saem aquinhoados e os estados consumidores, que ficam perifericamente, distantes dos centros produtores, ficam prejudicados. Quanto à constitucionalidade, estou impedido de fazer pré-julgamento.
CORREIO - O senhor é filiado ao PT há mais de 12 anos. No Supremo, muito provavelmente vai ter que votar recursos contra pontos polêmicos das reformas. Tendo sido indicado pelo presidente Lula, o senhor vai ter liberdade suficiente para votar contra o governo?
BRITTO - Eu tenho que ser independente por dever de ofício e como respeito ao Judiciário enquanto instituição. Do ponto de vista desse processo, quero dizer que nem o ministro Márcio Thomaz Bastos nem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva me impuseram qualquer dever de fidelidade ou qualquer condição de alinhamento com as teses do governo.
CORREIO - O senhor se considera um jurista progressista?
BRITTO - Sim. Digamos, eu sou até moderado, ponderado. Sou muito zen no meu jeito de ser. Eu tenho sensibilidade social. Acho que nossa Constituição é socialmente inclusiva nos seus valores básicos e nos seus princípios estruturantes. Então eu procuro interpretar a Constituição segundo essa vertente inclusivamente social.
CORREIO - O senhor falou que defende a participação do povo nas decisões. O governo Lula vem fazendo isso?
BRITTO - Acho que sim. O Lula tem esse compromisso. A história de vida dele é nessa direção.
CORREIO - Qual a opinião do senhor sobre o PT, partido ao qual é filiado?
BRITTO - Eu sou convictamente petista. Acho que é o partido que mais tem condições de responder aos desafios do novo tempo. Uma coisa que eu admiro muito no PT é esse compromisso mais orgânico, mais visceral, com a ética administrativa. Acho isso notável do ponto de vista partidário.
CORREIO - O sr. teme ser discriminado pelos seus futuros colegas no Supremo que não são tão manifestos quanto à postura político-partidária?
BRITTO - O que me cabe é cortar o cordão umbilical rente, tanto com o PT quanto com o meu escritório de advocacia. E eu farei isso.
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