Majorada indenização a trabalhadora obrigada a mostrar peças íntimas em revista
Quantum indenizatório mantido pelo Tribunal Regional escapava à razoabilidade.
Da Redação
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
Atualizado às 09:17
A 7ª turma do TST majorou de R$ 2 mil para R$ 16 mil a indenização concedida a uma trabalhadora que era obrigada a mostrar, parcialmente, suas peças íntimas em revistas realizadas pela empregadora.
A ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora do recurso, entendeu que o valor arbitrado foi desproporcional aos danos morais sofridos pela recorrente. Segundo a ministra, a quantia indenizatória violou o artigo 944 do CC/02. "Justifica-se a excepcional intervenção desta Corte a fim de revisar o quantum indenizatório estipulado e mantido pelo Tribunal de origem, eis que o valor escapa à razoabilidade, distanciando-se dos critérios recomendados pela jurisprudência para hipóteses similares", afirmou a relatora.
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Processo relacionado: RR - 4640458-30.2010.5.05.0000
Veja a íntegra da decisão.
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ACÓRDÃO
7.ª Turma
GMDMA/LPS/sm
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REVISTA ÍNTIMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO VALOR ARBITRADO. Demonstrada possível violação do art. 944 do Código Civil, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido.
II - RECURSO DE REVISTA. REVISTA ÍTNIMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO VALOR ARBITRADO. O Tribunal Regional consignou que a revista feita pela reclamada se deu sobre objetos pessoais da reclamante, assim como houve determinação para que fosse mostrada, parcialmente, as suas peças íntimas. O quantum indenizatório mantido pelo Tribunal Regional (dois mil reais) escapa à razoabilidade, distanciando-se dos critérios recomendados pela jurisprudência desta Corte para hipóteses similares. Assim, mister a majoração do valor para R$ 16.000,00 (dezesseis mil reais) em atenção às peculiaridades da espécie e aos parâmetros jurisprudenciais. Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n.° TST-RR-4640458-30.2010.5.05.0000, em que é Recorrente NAIARA DE JESUS SANTOS e Recorrida ITABUNA TÊXTIL S.A.
O Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 5.ª Região denegou seguimento ao recurso de revista interposto pela reclamante, com fundamento nas Súmulas 126, 221, II, e 296 do TST e na OJ 111 do SBDI-1 do TST.
Inconformada, a reclamante interpõe agravo de instrumento, sustentando que seu recurso de revista tinha condições de prosperar. Renova os argumentos relativos à majoração do valor fixado a título de danos morais.
Foram apresentadas contrarrazões e contraminuta.
Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, consoante o art. 83, § 2.º, II, do RITST.
É o relatório.
VOTO
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO
1 - CONHECIMENTO
Preenchidos os requisitos legais de admissibilidade, CONHEÇO do agravo de instrumento.
2 - MÉRITO
O recurso de revista da reclamante teve seu seguimento denegado pelo juízo primeiro de admissibilidade, aos seguintes fundamentos:
"PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS
Tempestivo o recurso (decisão publicada em 23/11/2009 - fl. 216; recurso apresentado em 07/12/2009 - fl.- 218).
Nos termos do ATO TRT5 de n° 0378/2009, publicado no DO de 19/11/2009, em virtude da greve dos servidores do Poder Judiciário Federal, no qual se enquadram os servidores do TRT da 5a Região, os prazos foram suspensos a partir do dia 18/11/2009, voltando a contar a partir do dia 14/12/2009, conforme ATO TRT5 de n° 0391/2009 (D.O 09/12/2009). Considerando que a petição do recurso fora protocolada no dia 07/12/2009, tempestivo é o presente apelo.
Regular a representação processual, fl(s). 92.
Desnecessário o preparo.
PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS
VALOR DA CONDENAÇÃO - CRITÉRIO DE FIXAÇÃO
Alegação(ões):
- violação do(s) art(s). 5.º, inciso V, da CF.
- violação do(s) art(s). 944 e 950 do Código Civil.
- divergência jurisprudencial.
A revista não se credencia ao trânsito.
Insurge-se a recorrente contra a decisão turmária, que manteve o decisum de primeiro grau, condenando a reclamada ao pagamento de danos morais na quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais).
Inviável o seguimento do recurso neste tópico, diante da conclusão da Turma, no sentido de que:
'In casu, de fato, conforme assinalo pelo ilustre magistrado de piso, entendo que a revista tal como se deu, ou seja, sobre objetos pessoais da obreira,assim como a determinação para que fosse mostrada, parcialmente, as sua peças íntimas constitui abuso do poder de fiscalização do empregador, decorrente do poder diretivo (art. 2.º), na medida em que era ônus seu adotar os procedimentos de segurança fornecidos pelo atual estado tecnológico, tais como a instalações de etiquetas nos produtos e câmeras.
Observe-se, por outro lado, que não restou provado os fatos articulados pela recorrente no sentido de ter sido acusada de furto, exsurgindo dos autos que houve, apenas, tratamento excessivamente rigoroso por parte de sua superior hierárquica, tendo a própria testemunha arrolada pela reclamante, que afirmou ter presenciado o ocorrido, negado essa acusação.
Destarte, neste diapasão, correta a fixação do dano moral em R$ 2.000,00.
É que, a míngua de critérios objetivos da Lei, a quantificação do montante devido a título de danos morais cabe ao prudente arbítrio do julgador, que não pode ser confundido com ato de pura arbitrariedade, sendo que os arts. 944 e 953 do Código Civil trazem parâmetros mínimos para tal quantificação que são a extensão do dano e a equidade.
Destarte, o arbitramento deve levar em consideração a posição social e econômica do ofensor e do ofendido, o grau de culpa do primeiro e o dano.
A par disso, deve-se ter em vista o caráter indenizatório e pedagógico da indenização do dano moral, pelo que o valor não pode ser fonte de enriquecimento ilícito da vítima nem meramente simbólico e irrisório para o ofensor.
Assim, tendo a decisão hostilizada observado tais parâmetros, impõe-se a sua manutenção (...)'.
O decisum hostilizado apresenta fundamentação amparada no conjunto fático probatório dos autos, a partir do qual firmou convencimento acerca do valor que deveria ser fixado a título de indenização, observando o intuito pedagógico, a proporcionalidade e a razoabilidade.
A irresignação recursal conduz, na verdade, à evidente tentativa de obter novo pronunciamento sobre matéria já exaurida, o que importaria, necessariamente, no reexame de fatos e provas, encontrando óbice na Súmula 126/TST e inviabilizando o seguimento do recurso, inclusive por divergência jurisprudencial.
Demais disso, a interpretação razoável dada pela Turma Julgadora às normas aplicáveis ao caso concreto, em verdade, não rende ensejo à admissibilidade do recurso de revista, à luz da regra expressa na Súmula 221, II, do Colendo TST.
Assim sendo, não se vislumbra à alegada violação dos dispositivos constitucionais e legais invocados nas razões revisionais.
Registre-se que arestos provenientes de Turma do TST, deste Tribunal ou de órgão não elencado na alínea 'a', do art. 896, da CLT, são inservíveis ao confronto de teses (CLT, art. 896 e OJ 111/SDI-I/TST).
Por outro lado, os demais julgados transcritos não aproveitam à demandante, diante da inespecificidade de que se revestem - Súmula 296 do TST.
CONCLUSÃO
DENEGO seguimento ao recurso de revista."
A reclamante pleiteia a majoração do valor arbitrado a título de indenização por danos morais. Alega que o valor de R$ 2.000,00 arbitrado a título de danos morais nega a justa indenização, posto que referido valor não atende o objetivo de punir a empresa, ressarcir os danos e prevenir que a atitude lesiva se repita. Renova a divergência jurisprudencial e a arguição de violação dos arts. 5.º, V, da Constituição Federal, 944 e 950 do Código Civil.
No caso em tela o Tribunal Regional ao manter o valor da indenização por danos morais consignou:
"In casu, de fato, conforme assinalo pelo ilustre magistrado de piso, entendo que a revista tal como se deu, ou seja, sobre objetos pessoais da obreira, assim como a determinação para que fosse mostrada, parcialmente, as sua peças íntimas constitui abuso do poder de fiscalização do empregador, decorrente do poder diretivo (art. 2o), na medida em que era ônus seu adotar os procedimentos de segurança fornecidos pelo atual estado tecnológico, tais como a instalações de etiquetas nos produtos e câmeras.
Observe-se, por outro lado, que não restou provado os fatos articulados pela recorrente no sentido de ter sido acusada de furto, exsurgindo dos autos que houve, apenas, tratamento excessivamente rigoroso por parte de sua superior hierárquica, tendo a própria testemunha arrolada pela reclamante, que afirmou ter presenciado o ocorrido, negado essa acusação.
Destarte, neste diapasão, correta a fixação do dano moral em R$ 2.000,00."
É consabido que, consoante entendimento pacífico desta Corte, o valor da indenização por danos morais só pode ser alterado na instância especial quando ínfimo ou exagerado.
Entretanto, tenho que, na espécie, justifica-se a excepcional intervenção desta Corte a fim de revisar o quantum indenizatório estipulado e mantido pelo Tribunal de origem (dois mil reais), eis que o valor escapa à razoabilidade, distanciando-se dos critérios recomendados pela jurisprudência para hipóteses similares.
Citam-se precedentes desta Corte:
"RECURSO DE REVISTA. (...) DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. Esta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que a revista visual de pertences dos empregados, feita de forma impessoal e indiscriminada, é inerente aos poderes de direção e de fiscalização do empregador e, por isso, não constitui ato ilícito. No presente caso, contudo, o quadro fático delineado no acórdão regional evidencia a existência de abuso de direito no procedimento de revista adotado pela ré. Consequentemente, ficou demonstrado o dano moral que teria atingido a autora, e o consequente sofrimento psíquico advinda do contato físico. Assim, ficou comprovado o ato ilícito praticado pelo reclamado. Por outro lado, o Tribunal Regional, ao fixar o valor da indenização em R$ 15.000,00 a título de danos morais, levou em consideração o dano sofrido, a condição da autora, o fim pedagógico e a capacidade econômica do reclamado. Tem-se, portanto, que foram observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade insertos no artigo 944 do Código Civil, o qual vincula a indenização à extensão do dano. Recurso de revista de que não se conhece." (RR - 324500-05.2008.5.09.0195, Rel. Min. Pedro Paulo Manus, 7.ª Turma, DEJT 19/11/2012)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REVISTA ÍNTIMA- INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL- VALOR ARBITRADO (R$ 20.000,00). Recurso de revista que não merece admissibilidade em face da aplicação da Súmula nº 126 desta Corte, do que dispõe o artigo 896, alínea -a-, da CLT, bem como porque não restou configurada, de forma direta e literal, nos termos em que estabelece a alínea -c- do artigo 896 consolidado, a alegada ofensa ao artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal, pelo que, não infirmados os fundamentos do despacho denegatório do recurso de revista, mantém-se a decisão agravada por seus próprios fundamentos. Ressalta-se que, conforme entendimento pacificado da Suprema Corte (MS-27.350/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 04/06/2008), não configura negativa de prestação jurisdicional ou inexistência de motivação a decisão do Juízo ad quem pela qual se adotam, como razões de decidir, os próprios fundamentos constantes da decisão da instância recorrida (motivação per relationem), uma vez que atendida a exigência constitucional e legal da motivação das decisões emanadas do Poder Judiciário. Agravo de instrumento desprovido." (AIRR - 31100-90.2009.5.19.0005, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, 2.ª Turma, DEJT 18/5/2012)
Destarte, levando-se em consideração as peculiaridades do caso concreto, entendo desproporcional o valor mantido pelo Tribunal Regional.
Por essas razões, afigura-se possível a tese de violação do art. 944 do Código Civil.
Assim, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.
Conforme previsão dos arts. 897, § 7.º, da CLT, 3.º, § 2.º, da Resolução Administrativa 928/2003 do TST e 229, § 1.º, do RITST, proceder-se-á de imediato à análise do recurso de revista na primeira sessão ordinária subsequente.
II - RECURSO DE REVISTA
1 - CONHECIMENTO
Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, passa-se ao exame dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista.
1.1 - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO VALOR ARBITRADO
Consoante os fundamentos lançados quando do exame do agravo de instrumento e aqui reiterados, CONHEÇO do recurso de revista por violação do art. 944 do Código Civil.
2 - MÉRITO
2.1 - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO VALOR ARBITRADO
Como consequência do conhecimento do recurso de revista por violação do art. 944 do Código Civil, DOU-LHE PROVIMENTO para aumentar o valor da indenização relativa ao dano moral sofrido pela autora, para R$ 16.000,00 (dezesseis mil reais).
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, I) por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista respectivo, a fim de que seja submetido a julgamento na primeira sessão ordinária subsequente; II) por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por violação do art. 944 do Código Civil, e, no mérito, dar-lhe provimento para arbitrar a quantia de R$ 16.000,00, a título de dano moral.
Brasília, 6 de Fevereiro de 2013.
DELAÍDE MIRANDA ARANTES
Ministra Relatora