Recusa de vigilante em perseguir bandido não caracteriza insubordinação
8ª turma do TST afastou a demissão por justa causa.
Da Redação
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Atualizado às 15:45
A 8ª turma do TST manteve decisão que afastou a justa causa aplicada na dispensa de um vigilante que se negou a participar da perseguição de um assaltante que teria furtado uma moto do estacionamento da usina empregadora e que teria trocado tiros com pessoas que moravam nas dependências da empresa.
A usina alegou que o empregado praticou ato de insubordinação e que sua atitude colocou em risco a segurança do patrimônio da empresa. Já o trabalhador aduziu que não havia sido treinado para usar espingarda de calibre 12 e que não conhecia a região onde o bandido se encontrava, uma vez que a perseguição ia ser realizada fora da usina. Também afirmou que a reclamada não tinha coletes a prova de balas para fornecer aos vigilantes.
A desembargadora convocada Maria Laura Franco Lima de Faria, relatora, aplicou o entendimento do TRT da 19ª região, segundo o qual não caracteriza insubordinação a recusa do vigilante em perseguir ladrão sem a habilitação do porte de arma adequado e os equipamentos de segurança indispensáveis à perseguição.
"Tendo em vista as assertivas fáticas registradas pela decisão, insuscetíveis de reexame nesta Corte Superior, o conhecimento do recurso de revista encontra óbice na súmula 126 do TST. Ademais, cabe acrescentar que os arestos colacionados são inespecíficos, pois não partem das mesmas premissas fáticas delineadas pelo Regional no presente feito (súmula 296 do TST)", finalizou a relatora.
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Processo relacionado: AIRR - 433-22.2010.5.19.0059
Veja a íntegra do acórdão.
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ACÓRDÃO
(8ª Turma)
GJCMLF/eld/bv
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO CONTRATUAL. JUSTA CAUSA. O processamento do Recurso de Revista mostra-se inviável haja vista que seria necessário o reexame do conjunto fático-probatório delineado pelo Tribunal Regional, o que se impede nesta instância recursal por aplicação da Súmula nº 126 do TST. Agravo de Instrumento não provido.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APLICAÇÃO DA PENALIDADE PREVISTA NO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. Não se verifica ofensa direta ao art. 5º, LV, da CR, na medida em que o Regional consignou o intuito procrastinatório, tendo em vista a clara intenção de reapreciação da matéria contida no Recurso Ordinário. Agravo de Instrumento não provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-433-22.2010.5.19.0059, em que é Agravante USINA CAETÉ S.A. - UNIDADE MARITUBA e Agravado I.S.
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto contra decisão mediante a qual se denegou seguimento ao Recurso de Revista.
Procura-se demonstrar a satisfação dos pressupostos para o processamento do Recurso obstado.
O Reclamante apresentou Contraminuta ao Agravo de Instrumento e Contrarrazões ao Recurso de Revista.
O processo não foi remetido ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, do RI/TST.
É o relatório.
VOTO
1 - CONHECIMENTO
Atendidos os pressupostos extrínsecos do Agravo de Instrumento, conheço do Recurso.
2 - MÉRITO
Mantenho a decisão agravada por seus próprios e jurídicos fundamentos, in verbis:
RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / JUSTA CAUSA / FALTA GRAVE
Alegação(ões):
- violação do(s) art(s). 482, "h", da CLT.
- divergência jurisprudencial.
Irresigna-se contra a decisão Regional ao afastar a justa causa à dispensa do empregado que alega ter praticado ato de insubordinação. Aduz que o empregado, na função de vigilante, não justificou a ausência na ronda que lhe competia executar. Afirma que a atitude do empregado colocou em risco a segurança do patrimônio da empresa.
Consta do acórdão:
"... Da prova ministrava emerge que o reclamante tem razão. Primeiro, colhe-se no interrogatório do Autor:
"foi chamado pelo líder da turma, J.E.S., para participar da perseguição a um assaltante que teria furtado uma moto do estacionamento da usina e que havia trocado tiros com pessoas que moravam nas dependências da usina; que o líder da turma quis entregar a ele depoente uma espingarda calibre 12 para que o depoente se juntasse ao grupo que iria perseguir o bandido; que ele depoente se recusou a participar da perseguição, argumentando que não havia sido treinado para usar espingarda de calibre 12 e que não conhecia a região onde o bandido se encontrava, uma vez que a perseguição ia ser realizada fora da usina, e ele depoente mora em Penedo;" (f. 229/230).
E mais:
"que ele depoente usava em serviço um revolver calibre 38 e geralmente só fazia ronda nas dependências da usina, eventualmente apenas tendo feito ronda nos canaviais para verificação de focos de incêndios; que a perseguição ao bandido ia ser feita no povoado CONRADINHO, situado 03km ou 05km da usina; que ele depoente também se recusou a participar da perseguição, porque a reclamada não tinha coletes a prova de balas para fornecer aos vigilantes; que, por ter se recusado a participar da perseguição ao bandido, ele depoente foi dispensado; (...) que o J.E. mais 04 vigilantes fizeram a perseguição ao bandido, mas não tiveram sucesso em localizá-lo; (...)".
A única testemunha apresentada pelo reclamante em juízo, J.C.S., conforme consta na ata de f. 230/232, ratifica suas alegações, revelando serem verdadeiras as afirmações contidas na inicial quanto à inexistência de treinamento e preparo para as atribuições que foram determinadas naquela diligência, principalmente quanto ao uso da arma calibre 12 e à ausência de colete à prova de bala.
A testemunha da reclamada, ao narrar os fatos ensejadores da rescisão, também não destoa da versão do reclamante na inicial quanto ao tipo de atividade, à arma que teria que usar, ao seu despreparo para a atividade e à inexistência de condições de segurança para ação (f. 232/233).
Vê-se, pois, que o reclamante foi dispensado por justa causa porque se recusou a perseguir ladrões que haviam roubado e agredido empregados nas dependências da reclamada.
Todavia, conforme pode ser observado às f. 229/233, a prova testemunhal demonstrou que os assaltantes a serem perseguidos estavam armados, inclusive um deles havia matado um empregado da reclamada anteriormente à perseguição.
Ficou claro também que a ronda foi realizada no canavial da reclamada e em outras localidades (povoados da região). Além disso, a prova testemunhal evidenciou que na época em que houve a perseguição aos assaltantes, a reclamada não fornecia colete a provas de balas para os seguranças, o que veio a fazer pouco tempo depois da dispensa do autor.
Desponta do que foi exposto que a empresa não podia exigir do seu empregado tarefas típicas da polícia, nem o empregado estava obrigado a atendê-las, não se enquadrando a hipótese em atos de indisciplina ou insubordinação.
Nestes termos, tem-se que a dispensa do reclamante foi sem justa causa e, consequentemente, é improcedente a ação de consignação em pagamento, sendo devidas ao autor as verbas rescisórias decorrentes da dispensa injusta reconhecida: aviso prévio, férias proporcionais com 13º, salário proporcional e FGTS com 40%..."
O Tribunal, com base na prova dos autos, afastou a justa causa aplicada na dispensa do empregado por entender que o não cumprimento da ordem da empregadora nas circunstâncias em que se deu, ou seja, perseguir ladrão que havia praticado roubo em suas dependências sem a habilitação e equipamentos de segurança indispensáveis para tal, não caracterizou a insubordinação alegada.
A pretensão da parte recorrente, assim como exposta, importaria, necessariamente, no reexame de fatos e provas, o que encontra óbice na Súmula 126/TST e inviabiliza o seguimento do recurso, inclusive por divergência jurisprudencial.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / PARTES E PROCURADORES / LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Alegação(ões):
- violação do(s) art(s). 5º, LV, da CF.
Insurge-se contra a multa aplicada no importe de 1% sobre o valor da causa fundamento de interposição de embargos com intuito meramente protelatório.
Consta dos embargos de declaração:
"... De início já se observa relevante contradição do discurso apresentado nos embargos, pois a embargante alega que embora fosse lícita a ordem determinada na vigência do contrato de trabalho, o reclamante teria o direito de pedir a rescisão indireta, mas não estaria autorizado a descumprir a ordem. Ora, os casos que a lei autoriza a rescisão indireta coincidem, justamente, com as hipóteses de justa causa do empregador, ou seja, somente podem ser invocadas quando a realidade vivenciada pelo empregado não for compatível com o que se espera do curso regular de um contrato de trabalho, nos termos do disposto no art. 483 da CLT.
Assim, se o empregado poderia rescindir indiretamente o contrato, como afirma a embargante, por conclusão lógica poderia se negar ao seu cumprimento, pois se trata de direito de defesa contra uma atitude do empregador que não se coaduna com seu poder diretivo.
Não obstante os argumentos acima expostos, tem-se a nítida certeza de que os presentes embargos não tiveram outro escopo senão de rediscutir a matéria já suficientemente analisada no acórdão de f. 277/283.
De uma simples leitura do acórdão, fica evidente que a decisão foi tomada depois de acurada análise de todas as circunstâncias fático-probatórias que cercaram a controvérsia, passando pela observação jurídica do caso, que revelou situação irregular de utilização de trabalho com exigência de cumprimento de funções típicas de polícia, excedendo os deveres decorrentes da relação de emprego, mormente diante da demonstração do despreparo do autor para manejar a arma fornecida pela empresa, bem como na ausência de fornecimento de equipamentos de proteção para um possível confronto armado com ladrões.
A conclusão chegada no acórdão não deixou margem a qualquer dúvida quanto ao afastamento da justificativa utilizada pela empresa para demitir por justa causa o empregado, de modo a tornar insubsistentes os fundamentos dos embargos, seguindo-se a transcrição apenas como forma de reforço à fundamentação alhures referida:
"Desponta do que foi exposto que a empresa não podia exigir do seu empregado tarefas típicas da polícia, nem o empregado estava obrigado a atende-las, não se enquadrando a hipótese em atos de indisciplina ou insubordinação." (f. 282).
Não houve em nenhum momento omissão, mas entendimento diverso do pretendido pelo reclamado, o que não justifica a oposição de embargos como sucedâneo do recurso específico, com o intuito de reformar a decisão.
Os embargos declaratórios atuam como meio de aperfeiçoamento do julgado, estando seu manejo autorizado nas hipóteses de ocorrência de omissão, contradição ou quando haja manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso, nos termos da regra inserta no art. 897-A da CLT. Até mesmo o prequestionamento a que se refere a Súmula n. 297 do TST, não afasta uma das hipóteses de cabimento dos embargos declaratórios, que é a omissão. Da leitura do referido verbete, se depreende que só cabe falar em prequestionamento da matéria, quando a decisão não adota tese explícita a respeito de assunto agitado no recurso, servindo, portanto, os embargos, para provocar o pronunciamento do Tribunal acerca de determinada questão.
Nestes termos, não houve justificativa para oposição dos presentes embargos, nem mesmo nos fundamentos lançados no seu corpo, que destoam da realidade observada nos autos.
Há nítida falta de adequação com os requisitos previstos no art. 897-A da CLT, afigurando-se os presentes embargos como protelatórios e responsável pelo atraso injustificado da ação em prejuízo do autor, em colisão direta com o disposto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal.
Nestes termos, conheço e rejeitos os embargos, condenando a USINA CAETÉ S/A - UNIDADE MARITUBA ao pagamento de multa de 1% sobre o valor da causa, pela oposição de embargos procrastinatórios, nos termos do art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil..."
O Tribunal observou que a recorrente apresentou embargos de declaração com intenção manifestamente procrastinatória, e resistiu sem justificativa plausível ao andamento do processo, motivo pelo qual ao julgá-los aplicou multa de 1% sobre o valor da causa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do CPC.
A condenação foi imposta com fundamento na legislação processual civil aplicável à trabalhista diante do permissivo do art. 769 da CLT. Por essa razão, não vislumbro nenhuma afronta à literalidade do art. 5º, LV, da Constituição Federal.
Acresça-se que o Regional declarou a nulidade do ato de demissão por justa causa, considerando que não caracteriza insubordinação a recusa do Vigilante em perseguir ladrão, que havia praticado roubo nas dependências da empresa, sem a habilitação do porte de arma adequado e sem colete à prova de balas.
Tendo em vista as assertivas fáticas registradas pela decisão, insuscetíveis de reexame nesta Corte Superior, o conhecimento do recurso de revista encontra óbice na Súmula nº 126 do TST. Ademais, cabe acrescentar que os arestos colacionados são inespecíficos, pois não partem das mesmas premissas fáticas delineadas pelo Regional no presente feito (Súmula nº 296 do TST).
Junte-se a isso, em relação à imposição da multa por Embargos de Declaração protelatórios, que não se verifica ofensa direta ao art. 5º, LV, da CR, na medida em que o Regional consignou o intuito procrastinatório, tendo em vista a clara intenção de reapreciação da matéria contida no Recurso Ordinário.
Registre-se, por oportuno, que a aplicação da penalidade prevista no artigo 538, parágrafo único, do CPC, não constitui medida que se opõe ao prequestionamento da matéria, mas que evita a utilização distorcida dos embargos de declaração para, imotivadamente, prolongar o deslinde da controvérsia submetida a juízo.
Confirmada a ordem de obstaculização do Recurso de Revista, nego provimento ao Agravo de Instrumento.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao Agravo de Instrumento.
Brasília, 24 de outubro de 2012.
MARIA LAURA FRANCO LIMA DE FARIA
Desembargadora Convocada Relatora