Magistrado afastado da função não tem direito a férias
Descanso remunerado tem objetivo de compensar trabalhador pela rotina de suas atividades funcionais após determinado tempo.
Da Redação
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Atualizado às 14:19
A 2ª turma do STJ negou pedido de magistrado, afastado cautelarmente de suas funções, que queria ter direito a receber em dinheiro o valor correspondente às férias, acrescido do abono constitucional de um terço.
O colegiado baseou-se na jurisprudência do STJ, segundo a qual a falta de efetivo exercício da atividade impede o gozo de férias, uma vez que o descanso remunerado tem o objetivo de compensar o trabalhador pela rotina de suas atividades funcionais após determinado tempo. A decisão foi unânime.
No caso, o magistrado interpôs mandado de segurança contra ato do presidente do TJ, que não incluiu seu nome na lista de escala de férias de 2010. O ato do presidente do TJ/SP baseou-se na existência de processo administrativo disciplinar que determinou o afastamento cautelar do magistrado de suas funções jurisdicionais, até o julgamento final do processo.
O Tribunal estadual indeferiu o pedido, sustentando que magistrado cautelarmente afastado da jurisdição não tem direito às férias, enquanto durar o afastamento.
Em seu voto, o relator na Corte Superior, ministro Herman Benjamin, destacou que, no período relativo ao pedido de gozo de férias, o magistrado encontrava-se afastado de suas funções, não havendo, assim, a fadiga pela rotina de suas atividades funcionais. "Consequentemente, não há como sustentar o direito ao gozo de férias, dada a ausência de causa", afirmou o ministro.
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Processo Relacionado : RMS 33.579
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RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 33.579 - SP (2011/0008272-3)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : M.M.J.F.
ADVOGADO : PLAUTO SAMPAIO RINO E OUTRO(S)
RECORRIDO : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADOR : SANDRA YURI NANBA E OUTRO(S)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AFASTAMENTO CAUTELAR DE MAGISTRADO. AUSÊNCIA DE EFETIVO TRABALHO. GOZO DE FÉRIAS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Hipótese em que o Tribunal de origem, diante da existência de decisão proferida em Processo Administrativo Disciplinar 120.580/2008, na qual determina o afastamento cautelar do impetrante de suas funções jurisdicionais até final julgamento do processo administrativo, indeferiu pedido do impetrante de ser beneficiado com a concessão de férias.
2. É firme no STJ o entendimento de que a ausência de efetivo exercício da atividade impede o gozo de férias, porquanto estas têm por pressuposto recompensar o trabalhador com o descanso remunerado da rotina de suas atividades funcionais por determinado tempo.
3. In casu, no período relativo ao pleito de gozo de férias, o recorrente encontrava-se afastado de suas funções. Não ocorreu, portanto, fadiga pela rotina de suas atividades funcionais e não há como sustentar o direito ao gozo de férias, dada a ausência de causa.
4. Recurso Ordinário não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça:
"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, sem destaque e em bloco." Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Eliana Calmon, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 09 de outubro de 2012(data do julgamento).
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator):
Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança interposto por M.M.J.F., com fundamento no art. 105, II, "b", da CF/1988, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado (fl. 142, e-STJ):
Magistrado cautelarmente afastado da jurisdição não tem, enquanto durar o afastamento, direito às férias.
Em suas razões, o recorrente alega, em suma:
O afastamento cautelar do magistrado, sem nenhuma justa causa, sem o mínimo de garantia ao devido processo legal e do direito ao contraditório, concretizado de forma impositiva e discriminatório, sem nada absolutamente nada a justificar medida de extrema violência contra um ser humano, sua imagem, sua moral, sua reputação, sua carreira jurídica, deve ser tido e havido como verdadeira sanção abusiva, como punição injustificada, (...).
Bem por isso, jamais poderiam os Julgadores do Órgão Colegiado entender que este afastamento permitiria equiparação a um período de férias, ou de licença, ou de descanso regular (...) (fls. 157-158, e-STJ).
Argumenta que a não inclusão do seu nome na lista de escala de férias para o ano 2010 importou em "abuso de autoridade, violação de direito líquido e certo do qual é titular porque negou-lhe direito legítimo ao descanso, mais terça parte, prescritos na 'lex legum' (artigo 7º, inciso XVII) e na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (artigo 66)" (fl. 159, e-STJ).
Aduz ainda:
Não foi observada a igualdade entre os administrados (já que outros Juízes do TJSP estão afastados, sob licença saúde, definitivamente, inclusive; mas continuam a ter direito às férias remuneradas mais um terço" (fl.
Defende que "o direito às férias, prevista na Consolidação das leis Trabalhistas e na Constituição é um dos mais conhecidos institutos da legislação trabalhista brasileira" (fl. 163, e-STJ).
Contrarrazões às fls. 180-183, e-STJ.
O Ministério Público Federal, na pessoa do Subprocurador-Geral da República Antônio Fonseca, opinou pelo não provimento do presente recurso.
Eis a ementa do parecer ministerial.
ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO, AFASTAMENTO CAUTELAR. FÉRIAS. PERÍODO AQUISITIVO.
1 - In casu, não há que se falar em direito líquido à percepção de férias uma vez que o período de afastamento do recorrente não deve ser considerado como de efetivo exercício.Aplicação do princípio da razoabilidade. Precedente.
2 - parecer pelo não provimento do recurso ordinário.É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Os autos foram recebidos neste Gabinete em 9.4.2012.
Cuida-se, originariamente, de Mandado de Segurança interposto por M.M.J.F. contra ato do Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que não incluiu seu nome na lista de escala de férias do ano 2010, "negando-lhe a garantia constitucional e também ditada pela Lei Orgânica da Magistratura (gozo de férias de 60 dias por ano, mais a terça parte em pecúnia; ou indenização, mais uma terço)" (fl. 8, e-STJ).
Informam os autos que o Desembargador Presidente do TJ/SP, diante da existência de decisão proferida em Processo Administrativo Disciplinar 120.580/2008, na qual determina o afastamento cautelar do impetrante de suas funções jurisdicionais até final julgamento do processo administrativo, indeferiu pedido do impetrante de ser beneficiado com a concessão de férias.
Na hipótese em exame, busca o autor a concessão do gozo de férias relativas ao período em que esteve afastado de suas funções.
O Tribunal de origem denegou a segurança, sob os seguintes fundamentos:
Ainda que salutar a luta do impetrante para ser tido como em efetivo exercício, o certo é que, enquanto não decidido o procedimento administrativo em que determinado o seu afastamento cautelar, esse tempo não pode ser considerado para o deferimento de férias em pecúnia.
O impetrante não está trabalhando, de sorte que não pode dizer que lhe foi indeferido o gozo de férias, para receber indenização por isso, e nem preencheu o requisito de não ter trabalhado sem ter faltado além do limite para ter direito ao terço das férias (inciso XVII do caput do artigo 7o, em combinação com o § 3o do artigo 39, ambos da Constituição da República). As vantagens a que se refere o § 3o do artigo 27 da Lei Orgânica da Magistratura são aquelas relativas aos vencimentos (artigo 65 da Lei Orgânica da Magistratura).
Certo que os artigos 66, 67 e 68 da Lei Orgânica da Magistratura não condicionam o gozo de férias ao período de trabalho, mas afronta o princípio da eficiência administrativa (caput do artigo 37 da Constituição da República), o darem-se férias, que se destinam ao descanso, para quem já não está Trabalhando (fls. 1443-144, e-STJ).
Tenho que merece reparo o acórdão hostilizado.
A Lei Orgânica da Magistratura Nacional, em seu artigo 66, dispõe que "Os magistrados terão direito a férias, por sessenta dias, coletivas ou individuais".
Já artigo 27, em seu § 3º, da LC 35/1979 garante ao magistrado o recebimento de vencimentos e vantagens, senão vejamos:
Art. 27 -(...)
(...)
§ 3º - O Tribunal ou o seu órgão especial, na sessão em que ordenar a instauração do processo, como no curso dele, poderá afastar o magistrado do exercício das suas funções, sem prejuízo dos vencimentos e das vantagens, até a decisão final.
Contudo, como bem salientado pelo Parquet Federal, "a LOMAN não prevê a suspensão ou interrupção da contagem do 'tempo de serviço' tendo em vista o afastamento do magistrado em razão de procedimento administrativo instaurado no âmbito do TJ/SP" (fls. 205-206, e-STJ).
E ainda destacou o ilustre representante do Ministério Público que "o recebimento de férias não constitui vantagem, mas sim um direito do magistrado que para usufruí-lo precisa preencher os requisitos legais, dentre os quais está o do período aquisitivo que, por sua vez, relaciona-se ao efetivo exercício das atividades laborais" (fl. 206, e-STJ).
Ora, na espécie, no período relativo ao pleito de gozo de férias, o recorrente encontrava-se afastado de suas funções e, pois, não houve a fadiga pela rotina de suas atividades funcionais. Consequentemente, não há como sustentar o direito ao gozo de férias, dada a ausência de causa.
A exigência de que tenha sido exercido efetivamente o trabalho para fins de recebimento das férias está em sintonia com a própria razão de ser desse benefício.
O direito a férias tem como fundamento normas de higiene física e mental do indivíduo. Busca assegurar um período de descanso ao trabalhador que, fatigado pela rotina de suas atividades, já não possui o mesmo rendimento de antes.
Desse modo, o acórdão recorrido deve ser mantido por estar em sintonia com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual a ausência de efetivo exercício da atividade impede o gozo de férias, porquanto estas têm por pressuposto recompensar o trabalhador com o descanso remunerado da rotina de suas atividades funcionais por um determinado período.
Sobre o tema, cito:
ADMINISTRATIVO. GOZO DE FÉRIAS. PERÍODO DE AFASTAMENTO CONSIDERADO ILEGAL. AUSÊNCIA DE EFETIVO TRABALHO.
1. A ausência de efetivo exercício da atividade impede o gozo de férias, porquanto estas têm por pressuposto recompensar o trabalhador com o descanso remunerado da rotina de suas atividades funcionais por um determinado período.
2. O reconhecimento de período como de efetivo serviço para fins de cômputo temporal não implica reconhecer o direito a gozo de férias.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no RMS 20.521/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJe 08/04/2011).
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. GOZO DE FÉRIAS. PERÍODO DE AFASTAMENTO CONSIDERADO ILEGAL. IMPOSSIBILIDADE. RAZOABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
I - O efetivo trabalho é causa determinante para o gozo de férias.Aplicação do postulado da razoabilidade. Hipótese não configurada neste mandamus.
II - O reconhecimento de período como de efetivo serviço para fins de cômputo temporal não implica reconhecer o direito a gozo de férias.
Recurso ordinário desprovido.
(RMS 19.622/MT, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJ 11/09/2006).
RECURSO ORDINÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DE IMPUGNAÇÃO DE VITALICIEDADE. PERÍODO AQUISITIVO DE FÉRIAS. NÃO EXERCÍCIO EFETIVO DAS FUNÇÕES EM VIRTUDE DE AFASTAMENTO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO AO RECEBIMENTO DOS VALORES RELATIVOS A FÉRIAS. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
I - "Carece de direito líquido e certo às férias regulares e demais direitos conexos, como terço constitucional e conversão em pecúnia de 10 dias de férias, a impetrante que não trabalhou durante todo o período aquisitivo e cuja ausência das atividades laborais não se tenha dado em nenhuma das hipóteses a que a legislação prevê como se de efetivo exercício fosse."
II - Recurso ordinário desprovido.
(RMS 20238/AC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJ 20/03/2006).
Assim, tendo em vista a inexistência de efetiva prestação de serviços do recorrente durante o período aquisitivo, não há falar em direito a férias, menos ainda em terço constitucional e conversão de dias em pecúnia.
Ante o exposto, nego provimento ao presente Recurso Ordinário.
É como voto.