Indenização do DPVAT pode ser cobrada de qualquer seguradora do consórcio
Pagamento parcial por um dos devedores não dispensa a obrigação dos demais solidários.
Da Redação
segunda-feira, 9 de julho de 2012
Atualizado às 15:28
A 4ª turma do STJ deu provimento a recurso especial para reconhecer a legitimidade passiva da Itaú Seguros em ação indenizatória relativa ao seguro DPVAT - Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre, ajuizada por uma mulher cujo marido morreu em acidente automobilístico.
Na ação, a mulher alegou que não recordava se havia recebido algum valor correspondente ao seguro. Em caso positivo, pediu a diferença entre o que era devido e o que foi efetivamente pago. Tendo sido confirmado o pagamento de parte da indenização prevista em lei por outra seguradora, o juízo de 1º determinou que a Itaú Seguros cobrisse o restante.
Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso especial, a jurisprudência do STJ entende que as seguradoras integrantes do consórcio do seguro DPVAT são solidariamente responsáveis pelo pagamento das indenizações securitárias, podendo o beneficiário cobrar o que é devido de qualquer uma delas.
Para ele, no caso em questão, é aplicável a regra disposta no artigo 275 do CC/02, segundo a qual, o pagamento parcial por um dos devedores não dispensa a obrigação dos demais solidários.
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Processo relacionado: REsp 1.108.715
Veja a íntegra da decisão.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.108.715 - PR (2008/0283386-8)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : M.R.S.
ADVOGADO : ANTÔNIO CAMARGO JÚNIOR E OUTRO(S)
RECORRIDO : ITAÚ SEGUROS S/A
ADVOGADOS : MILTON LUIZ CLEVE KUSTER E OUTRO(S)
RAFAELA POLYDORO KUSTER E OUTRO(S)
EMENTA
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SEGURO DPVAT. AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. LEGITIMIDADE DE SEGURADORA DIVERSA DA QUE REALIZOU O PAGAMENTO A MENOR. SOLIDARIEDADE PASSIVA. INCIDÊNCIA DO ART. 275, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
1. A jurisprudência é sólida em afirmar que as seguradoras integrantes do consórcio do Seguro DPVAT são solidariamente responsáveis pelo pagamento das indenizações securitárias, podendo o beneficiário cobrar o que é devido de qualquer uma delas.
2. Com efeito, incide a regra do art. 275, caput e parágrafo único, do Código Civil de 2002, segundo a qual o pagamento parcial não exime os demais obrigados solidários quanto ao restante da obrigação, tampouco o recebimento de parte da dívida induz a renúncia da solidariedade pelo credor.
3. Resulta claro, portanto, que o beneficiário do Seguro DPVAT pode acionar qualquer seguradora integrante do grupo para o recebimento da complementação da indenização securitária, não obstante o pagamento administrativo realizado a menor tenha sido efetuado por seguradora diversa.
4. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Senhor Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 15 de maio de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. Maria Rodrigues Stulp ajuizou ação de cobrança de indenização do seguro obrigatório por danos causados por veículos automotores de via terrestre - DPVAT em face de Itaú Seguros S/A, em razão do falecimento de seu esposo por acidente automobilístico. Asseverou que não se recordava se havia recebido algum valor a esse título, de modo que, para o caso positivo, pleiteou o recebimento da diferença ente o que era devido e o que foi efetivamente pago.
O Juízo de Direito da 4ª Vara Cível de Maringá/PR julgou procedente o pedido para que a seguradora ré pagasse a diferença entre o que já havia sido pago e o que era previsto em lei (fls. 70-73).
As partes apelaram, tendo o TJPR acolhido preliminar de ilegitimidade passiva da seguradora ré, nos termos da seguinte ementa:
AÇÃO DE COBRANÇA - PROCEDÊNCIA - APELAÇÃO - SEGURO OBRIGATÓRIO - DPVAT - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - COMPLEMENTAÇÃO PLEITEADA PERANTE SEGURADORA DIVERSA DAQUELA QUE EFETUOU O PAGAMENTO PARCIAL - IMPOSSIBILIDADE - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO - RECURSO PROVIDO.
1. Pretendendo a beneficiária o recebimento da diferença da indenização devida em razão de seguro obrigatório (DPVAT), deverá, para tanto, demandar contra a seguradora que efetuou o pagamento questionado, diferentemente do que ocorreria se se tratasse do pedido de recebimento integral, quando poderia acionar qualquer uma das seguradoras que integram o consórcio.
2. Não demonstrada a legitimidade da ré, extingue-se o feito sem apreciação do mérito (fl. 136).
Sobreveio recurso especial apoiado na alínea "c" do permissivo constitucional, aduzindo a recorrente ser parte legítima para o pagamento da indenização qualquer seguradora integrante do consórcio do seguro DPVAT, mesmo que já tenha havido pagamento parcial por outra seguradora. Colaciona como paradigmas acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina e Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (fls. 161-177).
Contra-arrazoado (fls. 182-186), o especial foi admitido (fls. 194-197).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. A controvérsia instalada nos autos e devolvida a esta Corte resume-se a saber se, para o recebimento de complementação da indenização securitária, é possível acionar seguradora pertencente ao consórcio do Seguro DPVAT, diversa daquela que realizara o pagamento administrativo a menor.
O acórdão recorrido, não reconhecendo a legitimidade da seguradora acionada, fundamentou sua conclusão nos seguintes termos:
Tem-se que a preliminar de ilegitimidade passiva argüida pela apelante merece prosperar. Embora se saiba que a Resolução nº 6, de 25 de março de 1986, do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), permite aos beneficiários do seguro DPVAT acionarem qualquer seguradora conveniada para arcar com o pagamento da indenização, verifica-se no presente caso, que a apelada recebeu parte da indenização da empresa seguradora Sul América Cia. Nacional de Seguro o que condiciona que a diferença exigida seja feita diretamente àquela que já lhe pagou parte da indenização.
Assim sendo, a apelada não poderá pugnar pela diferença do pagamento indenizatório perante qualquer das companhias integrantes do convênio mas sim, diretamente à empresa que regulou o sinistro, efetuou o pagamento a menor e que consequentemente deverá arcar com eventual complementação.
Parece inviável que após tendo a parte beneficiada ingressado com processo administrativo perante uma seguradora, e não satisfeita com o valor pago, ingresse em juízo em face de outra seguradora para receber a complementação, até porque, esta segunda empresa por óbvio não detém nenhum documento ou registro que lhe dê condições de verificar a regularidade do pagamento efetuado parcialmente pela primeira seguradora ou de aferir a legitimidade efetiva da postulação.
Note-se que somente se justificaria um posicionamento diverso se acaso a apelada estivesse pleiteando a integralidade da indenização referente ao seguro obrigatório, quando aí sim poderia acionar qualquer seguradora integrante do convênio, o que, no entanto, não ocorre no caso em tela (fl. 139).
3. Todavia, a meu juízo, a controvérsia possui solução diversa e explícita no ordenamento jurídico.
É sabido que o sistema protetivo do Seguro DPVAT, regulado essencialmente pela Lei n. 6.194/74, com suas alterações, assegura que o pagamento da indenização securitária poderá ser pleiteado a qualquer seguradora integrante do consórcio (art. 7º da Lei).
E esse entendimento vem sendo reiteradamente afirmado nesta Corte, verbis:
DIREITO CIVIL. SEGURO OBRIGATÓRIO. VEÍCULOS IDENTIFICADOS.
LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE DE QUALQUER SEGURADORA.
A indenização do seguro obrigatório (DPVAT) pode ser cobrada de qualquer seguradora que opere no complexo, mesmo antes da vigência da Lei n. 8.441/92, independentemente da identificação dos veículos envolvidos na colisão ou do efetivo pagamento dos prêmios.
Precedentes.
Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 602.165/RJ, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 18/03/2004, DJ 13/09/2004, p. 260)
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SEGURO OBRIGATÓRIO. DPVAT. Consórcio. Legitimidade de qualquer seguradora que opera no sistema.
De acordo com a legislação em vigor, que instituiu sistema elogiável e satisfatório para o interesse de todas as partes envolvidas, qualquer seguradora que opera no sistema pode ser acionada para pagar o valor da indenização, assegurado seu direito de regresso.
Precedente.
Recurso conhecido e provido.
(REsp 401.418/MG, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 23/04/2002, DJ 10/06/2002, p. 220)
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Cuida-se, com efeito, de solidariedade passiva, em razão da qual o credor tem direito a receber de um dos devedores, "parcial ou totalmente, a dívida comum" (art. 275 do Código Civil de 2002).
Como consectário, a própria legislação civil confere a solução para a hipótese de pagamento parcial por um dos devedores, nos termos do mencionado art. 275 do Código Civil de 2002:
Art. 275. [...] se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.
Parágrafo único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um ou alguns dos devedores.
Portanto, à luz da legislação acima citada, por se tratar de solidariedade passiva, o pagamento parcial não exime os demais obrigados solidários - esses por força de expressa previsão legal - quanto ao restante da obrigação, tampouco o recebimento de parte da dívida induz a renúncia da solidariedade pelo credor.
Assim, resulta claro que o beneficiário do Seguro DPVAT pode acionar qualquer seguradora integrante do grupo para o recebimento da complementação da indenização, não obstante o pagamento administrativo realizado a menor tenha sido efetuado por seguradora diversa.
Mutatis mutandis, confira-se o precedente:
CIVIL. SOLIDARIEDADE PASSIVA. TRANSAÇÃO. QUITAÇÃO PARCIAL. Havendo expressa manifestação das partes sobre a quitação parcial do débito em relação a um dos devedores, continuam os demais obrigados solidariamente pelo resto da dívida.
(AgRg no Ag 692.427/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/11/2007, DJ 26/11/2007, p. 165)
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4. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná para que retome o julgamento dos recursos de apelação interpostos por autora e ré, analisando as demais questões suscitadas, superada a tese acerca da ilegitimidade passiva da ré.
É como voto.
Brasília (DF), 15 de maio de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator