Jornal é condenado por veiculação de notícia falsa
Periódico publicou matéria acusando pessoas inocentes da morte de uma médica.
Da Redação
quarta-feira, 25 de abril de 2012
Atualizado às 08:45
A 9ª câmara de Direito Privado do TJ/SP condenou um jornal de Sorocaba a indenizar uma mulher por veiculação de notícia falsa.
Segundo o relatório, a autora foi chamada à casa de sua sobrinha quando o marido desta a encontrou morta. Apesar de nunca ter sido considerada suspeita do crime - o laudo de exame necroscópico nem sequer indicou morte criminosa -, o periódico publicou matéria intitulada "Médica é encontrada morta em salão de festas da própria casa - Tanto o marido como a tia da vítima são considerados suspeitos".
De acordo com a desembargadora Lucila Toledo, relatora, apesar de o jornal ter corrigido a notícia no dia seguinte, "os fatos noticiados foram apresentados sem fidelidade pelo órgão de imprensa. A falsidade justifica que, apesar da neutralidade da narrativa, os réus sejam responsabilizados pelo dano moral, claramente caracterizado".
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Processo: 0051760-16.2009.8.26.0602
Veja a íntegra da decisão.
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2012.0000147556
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0051760-16.2009.8.26.0602, da Comarca de Sorocaba, em que são apelantes/apelados FUNDAÇÃO UBALDINO DO AMARAL (MANTENEDORA DE) e JORNAL CRUZEIRO DO SUL (MANTIDO POR) sendo apelado/apelante S.R..
ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento aos recursos dos réus e deram provimento parcial ao recurso adesivo V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GALDINO TOLEDO JÚNIOR (Presidente sem voto), ANTONIO VILENILSON E JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA.
São Paulo, 10 de abril de 2012.
Lucila Toledo
RELATOR
VOTO Nº 02448
APELAÇÃO Nº 0051760-16.2009.8.26.0602
COMARCA: SOROCABA
APELANTES E RECIPROCAMENTE APELADOS: FUNDAÇÃO UBALDINO DO AMARAL (MANTENEDORA DE) E OUTRO E S.R. (ADESIVAMENTE) RESPONSABILIDADE CIVIL IMPRENSA - NOTÍCIA FALSA - ATO ILÍCITO - SENTENÇA PROCEDENTE PARA CONDENAR AO PAGAMENTO DE R$ 28.851,00 JUROS A PARTIR DO ATO ILÍCITO - NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS DOS RÉUS DADO PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO ADESIVO
Autora e réus insurgem-se contra sentença a fls. 114, cujo relatório adoto, que julgou procedente pedido de indenização por dano moral decorrente de notícia falsa veiculada em jornal dos réus, em R$ 28.851,00.
Os réus informaram que a notícia foi corrigida no dia seguinte.
A autora apresente recurso adesivo, para que a indenização seja aumentada para R$ 250.000,00 e publicada integralmente a sentença, no jornal que veiculou a falsa afirmação.
Em contrarrazões, cada parte sustenta seu ponto de vista.
É o relatório.
A autora foi chamada para a casa de sua sobrinha, quando o marido dela a encontrou morta.
Apenas isso.
Na publicação no jornal dos réus, veiculou-se a seguinte notícia:
"Médica é encontrada morta em salão de festas da própria casa - Tanto o marido como a tia da vítima são considerados suspeitos".
É incontroverso que marido e tia nunca foram considerados suspeitos. O laudo de exame necroscópico nem sequer indicou morte criminosa.
É verdadeiro que os réus corrigiram a falsidade no dia seguinte:
"Diferente do que foi publicado na edição de ontem do Cruzeiro do sul, o marido A.M.N., e a tia da vítima, S.R., não são considerados suspeitos".
Ainda assim, não se altera a dor moral decorrente da indicação da autora como suspeita pela morte de parente querida, a quem simplesmente foi acudir quando encontrado o corpo, antes mesmo que se conhecesse a realidade da morte.
A publicação foi precipitada, uma vez que antecedeu conclusão técnica a respeito da causa da morte, no inquérito policial.
Os fatos noticiados foram apresentados sem fidelidade pelo órgão de imprensa. A falsidade justifica que, apesar da neutralidade da narrativa, os réus sejam responsabilizados pelo dano moral, claramente caracterizado.
Mesmo que a linguagem jornalística não seja técnico jurídica, existe grande diferença entre ser testemunha de um crime (que nem ocorreu, na hipótese) e ser suspeito da prática do delito.
Mesmo um jornalista pode entender a distância entre ser ouvido de um modo ou de outro, pela autoridade policial.
A indenização foi bem fixada, com base no número de jornais que circularam, de modo que a sentença não comporta reparo, no arbitramento.
Os juros, contudo, tratando-se de ato ilícito, incidem a partir da publicação; e não partir da sentença.
A publicação da decisão judicial é desnecessária, não só porque o jornal retificou a informação espontaneamente, como também porque a Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, de modo que não cabe o pedido de condenação à publicação da sentença.
Considerado o fato de que a indenização por dano moral é sempre definida por arbitramento judicial, a sucumbência deve sempre ser suportada integralmente pelo ofensor, independentemente de o valor sugerido pela vítima não ser inteiramente acolhido.
Pelo meu voto, nego provimento aos recursos dos réus e dou provimento parcial ao recurso adesivo, apenas para que os juros incidam a partir do evento danoso.
LUCILA TOLEDO
RELATORA