Editais de leilão podem ser publicados na imprensa em geral
Divulgação de editais de leilão em órgão da imprensa oficial somente é exigido quando o credor não possuir meios de arcar com despesas de publicação na imprensa em geral.
Da Redação
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
Atualizado às 15:24
Certame
Editais de leilão podem ser publicados na imprensa em geral
A 3ª turma do STJ deu provimento ao REsp interposto pela Centralpack Embalagens Ltda. objetivando impugnar acórdão exarado pelo TJ/PR, no julgamento de apelação, que anulou a arrematação dos bens de massa falida da sociedade IMPATOL - Indústria de Madeiras Toledo Ltda por falta de publicação de edital do leilão no Diário da Justiça.
Apesar do dispositivo da antiga lei de Falências (lei 11.101/05), a falta de publicação do edital de leilão em veículo oficial não anula o pregão.
Na decisão, a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, apontou que o edital foi publicado na imprensa local, afixado no juízo e divulgado ainda por meio de folhetos e na internet. Portanto, do ponto de vista prático, não teriam ocorrido prejuízos efetivos e suficientes para anular o ato.
"Modernamente, a legislação tem se orientado no sentido de exigir publicação de editais de leilão na imprensa em geral, determinando-a em órgão da imprensa oficial apenas quando o credor não possuir meios de arcar com tais despesas", afirmou a relatora.
A ministra determinou a aplicação de multa de 1% sobre o valor da causa à massa falida, na posição de recorrida.
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Processo: REsp 1.195.855
Veja a íntegra do acórdão.
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RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: CENTRALPACK EMBALAGENS LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADOS: PEDRO ANTÔNIO C S FURLAN E OUTRO(S) / OSMAR MENDES PAIXÃO CÔRTES E OUTRO(S)
RECORRIDO: IMPATOL - INDÚSTRIA DE MADEIRAS TOLEDO LTDA E OUTROS
ADVOGADOS: ALEXANDRE LASKA DOMINGUES E OUTRO(S) / INOR SILVA DOS SANTOS - SÍNDICO
EMENTA
FALÊNCIA. LEILÃO. PUBLICAÇÃO DE EDITAL EM JORNAL. AUSÊNCIA DE PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO DA JUSTIÇA. IRRELEVÂNCIA. FINALIDADE DA NORMA PREENCHIDA. INSTRUMENTALIDADE DE FORMAS. APROVEITAMENTO DO ATO. ARREMATAÇÃO MANTIDA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ APLICADA
1. A afirmação claramente inverídica incluída em contrarrazões de apelação justifica a aplicação de pena por litigância de má-fé.
2. A publicação do edital de leilão em jornal, somada à sua afixação na sede do juízo e divulgação por fôlderes e Internet consubstanciam meios suficientes de publicidade do ato judicial. A ausência de publicação em órgão da imprensa oficial, isoladamente, não justifica a anulação da arrematação, dado o princípio da instrumentalidade das formas.
3. Recurso especial provido para restabelecimento da sentença.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Dr(a). DANIEL AUGUSTO TEIXEIRA DE MIRANDA, pela parte RECORRENTE: CENTRALPACK EMBALAGENS LTDA.
Brasília (DF), 06 de dezembro de 2011 (Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto por CENTRALPACK EMBALAGENS LTDA - MICROEMPRESA objetivando impugnar acórdão exarado pelo TJ/PR no julgamento de recurso de apelação.
Ação: de embargos à arrematação, proposta por IMPATOL INDÚSTRIA DE MADEIRAS TOLEDO LTDA., ANTÔNIO JOAQUIM TORMENA e RAINELDES TORMENA em face de BANCO ITAÚ S/A e de CENTRALPACK EMBALAGENS LTDA. A arrematação impugnada se deu nos autos do processo de falência da sociedade IMPATOL que, no processo, atua em nome próprio, em defesa dos bens arrecadados, nos termos do art. 36 da LF/45.
Sentença: julgou improcedente o pedido, sendo impugnada por IMPATOL mediante recurso de apelação.
Acórdão: deu provimento ao recurso de apelação nos termos da seguinte ementa:
FALÊNCIA. VENDA DE IMÓVEL DA MASSA EM LEILÃO. NECESSIDADE DA PUBLICAÇÃO DOS EDITAIS NO DIÁRIO DA JUSTIÇA. NULIDADE. RECURSO PROVIDO.
Recurso especial: interposto por CENTRALPACK com fundamento nas alíneas 'a' e 'c' do permissivo constitucional. Alega violação do art. 117 da LF/45, que não exigiria a publicação de edital no Diário da Justiça para o leilão de bens da massa, bem como do art. 244 do CPC, que determina que as nulidades processuais somente sejam decretadas se demonstrado efetivo prejuízo (fls. 387 a 402).
Admissibilidade: o recurso não foi admitido na origem, motivando a interposição do Ag 1.241.518/PR, a que dei provimento para melhor apreciação da controvérsia.
Medida cautelar: ajuizada pelo recorrente (MC 18.347/PR), objetivando atribuir efeito suspensivo ao recurso especial. Inicialmente neguei a medida liminar pleiteada mas, tendo em vista a iminência da realização de novo leilão para venda do bem controvertido, reconsiderei a decisão, suspendendo o ato e determinando a imediata inclusão deste recurso especial em pauta para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cinge-se a controvérsia a avaliar, sob a ótica dos arts. 117 e 205 da LF/45, bem como do art. 244 do CPC, se a ausência de publicação do edital de leilão de bem arrecadado pela massa falida no Diário da Justiça, por si só, justifica a anulação da sua arrematação por terceiro.
I - Os fundamentos de nulidades alegados, e o objeto específico deste recurso especial
Uma série de supostas nulidades foram alegadas na petição inicial dos embargos de arrematação, que deram origem a este recurso especial. Um total de oito alegações. O embargante sustentou que: (i) o leiloeiro teria sido nomeado pelo juiz da causa, violando o disposto no art. 117, §1º, da LF/45, que determina ser do síndico a incumbência dessa nomeação; (ii) não teria havido intimação dos falidos: (ii.1) acerca do laudo de avaliação originalmente elaborado; (ii.2) da redução do preço do bem, posteriormente promovida; (iii) não teria havido atualização do valor do laudo às vésperas do certame; (iv) o edital de arrematação teria sido publicado em jornal de grande circulação com menos de 20 dias de antecedência em relação à venda do bem (LF/45, art. 117); (v) não teria havido a indispensável intimação do representante do MP; (vi) não teria havido a intimação pessoal de um dos falidos, Raineldes Tormena; (viii) a lienação teria se dado por preço vil; (vii) não teria havido publicação do edital no Diário da Justiça;
Em todo o processo verificou-se tendência de rejeição de todas essas alegações, sem exceção. Isso ocorreu no primeiro parecer exarado pelo MP, em primeiro grau de jurisdição (fls. 257 a 271, e-STJ); na sentença (fls. 280 a 285, e-STJ); e no parecer do MP em segundo grau (fls. 356 a 367, e-STJ). Essas alegações de nulidade foram rejeitadas, de acordo com essas peças processuais, por diversos fundamentos, entre os quais se destacam:
(i) a responsabilidade pela fiscalização do trabalho do síndico é do juízo da falência, de modo que a nomeação direta de leiloeiro por este não geraria qualquer prejuízo;
(ii) quanto à avaliação do bem: (ii.1) os falidos foram intimados da primeira delas; (ii.2) quanto à segunda avaliação, os falidos tomaram ciência do respectivo valor quando intimados do edital de leilão;
(iii) houve atualização do valor do bem avaliado, consoante destacou o MP a fls. 365 (e-STJ), além disso, vendido o bem pelo valor cheio da avaliação, não poderia haver preço vil mesmo que se considerasse a suposta valorização do imóvel;
(iv) o edital de arrematação foi afixado na sede do juízo no prazo fixado pela LF/45, o que seria suficiente para dar-lhe ampla publicidade.
Ainda, foi ainda divulgado por outros meios, como Internet, fôlderes e publicação em jornal de circulação local;
(v) o representante o MP compareceu aos autos e declarou expressamente ter tomado ciência do edital de leilão com a antecedência necessária, não obstante a falha na respectiva certificação nos autos;
(vi) o falido Raineldes Tormena estava foragido da polícia à época em que se promoveu a tentativa de sua intimação pessoal, de modo que, em local incerto e não sabido, foi intimado por edital;
(vii) não haveria nulidade pela falta de publicação do edital no Diário da Justiça por dois motivos: primeiro, porque tal exigência não constaria da Lei de Falências antiga, tampouco da nova; segundo, porque,segundo observou o MP ao opinar em primeiro grau de jurisdição, "basta analisar o caderno principal, às fls. 1748/1749, para se concluir que o edital do leilão, de forma resumida, mas suficiente, foi publicado no Diário da Justiça nº 7.153, de 4 de julho de 2006".
Somente por ocasião do julgamento do recurso de apelação essa tendência se inverteu, mas apenas com relação a um dos argumentos desenvolvidos pelos embargantes. Assim, o TJ/PR rejeitou todos os fundamentos de nulidade alegados na inicial, numa linha de argumentação semelhante à exposta acima, mas anulou o ato pela falta de publicação do edital na imprensa oficial.
O objeto deste recurso especial, portanto, se resume apenas a esse item, sendo impossível, nesta sede, descer a outros argumentos de nulidade.
II - A necessidade de publicação do edital de leilão no Diário da Justiça. Alegada violação dos arts. 117 e 205 da LF/45, além de 244 do CPC
II.1) A preliminar suscitada nas contrarrazões
Para apreciar o pedido formulado no recurso especial, de declaração de validade da arrematação promovida, é necessária a abordagem de uma questão preliminar. Nas contrarrazões a este recurso especial, os recorridos afirmaram que a fundamentação do recurso especial "não infirma integralmente a decisão, porquanto sequer aborda o tema sob o prisma do artigo 205 da LF como fez o acórdão". Se procedente essa alegação, o recurso especial inapelavelmente esbarraria no óbice do Enunciado 283 da Súmula/STF.
Contudo, está dito, com todas as letras, no recurso especial: "Outrossim, não se pode inferir tal exigência do contido no art. 205 do mesmo diploma legislativo.
Obviamente, tal disposição - a do art. 205 - refere-se à publicação dos demais editais pertinentes ao processo de falência. Trata-se de norma geral, que cede espaço ante a disposição especial contida na mesma lei". Assim, a afirmação feita pelo recorrido em suas contrarrazões é inverídica, objetivando, em verdade, induzir esta Corte em erro, o que consubstancia litigância de má-fé nos expressos termos do art. 17, II, do CPC.
Aplico, portanto, de antemão, já pela conduta temerária manifestada na preliminar, multa de 1% sobre o valor da causa ao recorrido, com fundamento no art. 18 do CPC.
II.2) Mérito
No mérito, a controvérsia está estabelecida em torno da interpretação de três artigos da LF/45: o art. 117, o art. 118 e o art. 205. O primeiro deles determina que:
Art. 117. Os bens da massa serão vendidos em leilão público, anunciado com dez dias de antecedência, pelo menos, se se tratar de móveis, e com vinte dias, se de imóveis, devendo estar a ele presente, sob pena de nulidade, o representante do Ministério Público.
Esse artigo, como se vê, não menciona a necessidade de prévia publicação de editais no órgão de imprensa oficial.
O segundo deles disciplina que:
Art. 118. Pode também o síndico preferir a venda por meio de propostas, desde que a anuncie no órgão oficial e em outro jornal de grande circulação, durante trinta dias, intervaladamente, chamando concorrentes (sem destaque no original)
Esse dispositivo, segundo o recorrente, evidenciaria que a venda por leilão dispensaria a publicação na imprensa oficial, já que a exigiria apenas para a venda por meio de propostas.
Por fim, o último dos dispositivos dispõe:
Art. 205. A publicação dos editais, avisos, anúnicos e quadro geral dos credores será feita por duas vezes, no órgão oficial, da União ou dos Estados, e, quando for o caso, nos órgãos oficiais dos Estados em que o devedor tenha filiais ou representantes, indicará o juízo e o cartório e será precedida das epígrafes 'Falência de...' ou 'Concordata Preventiva de (...).
Para o recorrido, esse artigo consubstanciaria uma regra geral aplicável a todos os "anúncios" relacionados ao antigo processo de falência. Como o art. 117 afirma que o leilão deverá ser "anunciado com dez dias de antecedência", essa regra seria de aplicação obrigatória.
Para solucionar a questão, é necessário, em primeiro lugar, afastar o argumento dos recorrentes de que o art. 205 seria uma mera regra geral que não se aplicaria às hipóteses do art. 117, que seriam específicas. Parece claro que, se o art. 117 fala de um anúncio, sem estabelecer a forma de sua publicidade, a regra geral deve a ele ser aplicável. Assiste razão, portanto, neste ponto, ao recorrido. A solução da questão não passa pela interpretação literal dos dispositivos em conflito.
O que tem de ser considerada, contudo, é a finalidade da norma. A antiga Lei de Falências foi promulgada em 21 de junho de 1945. Conquanto a última redação de seu art. 205 tenha sido dada pela Lei 9.462/1997, toda a estrutura da lei obedece às necessidades da época de sua elaboração.
Nesse sentido, como bem observou o recorrente, a publicação dos editais no Diário da Justiça não preenche mais, nos dias de hoje, a mesma finalidade que preenchia na época. Tal exigência fazia mais sentido em um tempo em que a imprensa brasileira não era suficientemente organizada, de modo a contar com eficientes veículos de comunicação atingindo todas as localidades. Tanto que, modernamente, a legislação tem se orientado no sentido de exigir publicação de editais de leilão na imprensa em geral, determinando-a em órgão da imprensa oficial apenas quando o credor não possuir meios de arcar com tais despesas. Nesse sentido, a título exemplificativo, é o dispositivo do art. 687, §1º do CPC e do art. 22 da Lei 6.830/80.
Disso decorre que, do ponto de vista prático, não há prejuízos ao certame com a publicação dos editais de leilão em órgão da imprensa local, afixação na sede do juízo, distribuição de fôlderes e publicação em sítio na Internet. Sem prejuízos efetivos, cabe invocar, como bem observado pelo recorrente, o princípio da instrumentalidade das formas para decretar a validade do ato. Vale citar, nesse sentido, que a alegação de prejuízos presumidos feita pelo acórdão recorrido não é suficiente para o afastamento da regra do art 244 do CPC.
Tais argumentos já seriam suficientes para o provimento do recurso especial. Ressalta-se, porém, como reforço argumentativo, o fato de que, segundo se depreende da análise dos termos do processo, a publicação dos editais na imprensa oficial ocorreu, ainda que em forma resumida. Isso é ressaltado pelo MP em seu parecer exarado em primeiro grau de jurisdição (fl. 265, e-STJ).
Dessarte, a nulidade da arrematação reconhecida pelo TJ/PR não pode ser mantida.
Forte nessas razões, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento, reformando o acórdão recorrido para o fim de restabelecer a sentença.