Concessão de coleta de lixo em debate
A decisão da Prefeitura de São Paulo
Da Redação
quinta-feira, 4 de agosto de 2005
Atualizado em 3 de agosto de 2005 12:59
Coleta
Concessão de coleta de lixo em debate
A decisão da Prefeitura de São Paulo de retomar o questionamento da concessão da coleta de lixo domiciliar traz à tona o debate sobre os limites da delegação de serviços públicos no País. Segundo noticiou a imprensa, parecer do secretário de Negócios Jurídicos sustenta que o serviço de coleta não se trataria de uma concessão, pois esta tem de ser explorada por "conta e risco do particular" e envolver necessariamente "relação direta com o usuário".
Segundo Floriano de Azevedo Marques Neto, do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques, Advocacia, um dos formuladores do modelo jurídico da concessão paulistana, o raciocínio é totalmente descabido. Quando o poder público delega ao particular a exploração de um serviço público, transfere ao concessionário a prerrogativa de organizar a sua prestação (por sua conta) e uma parcela dos riscos disso decorrentes (por seu risco), explica ele.
Na concessão paulistana estão presentes os dois elementos. O concessionário recebe uma ampla margem de liberdade para organizar os serviços, assumindo obrigações de resultado (manter a cidade permanentemente asseada). Assume também parcela de riscos (variações de custos, risco nos investimentos - principalmente em aterros sanitários -, e especialmente o risco de variação nas quantidades).
O risco de inadimplência do usuário não faz parte do núcleo da definição de concessão. É freqüente que concessionárias de serviços públicos consigam judicial ou administrativamente o reequilíbrio econômico dos contratos por força da elevada inadimplência dos usuários (principalmente em serviços que não podem ser interrompidos). "O fato dos pagamentos saírem da municipalidade, não desnatura a concessão. A tarifa de serviços públicos é muitas vezes complementada com recursos públicos (subsídios) sem descaracterizar a concessão", explica o sócio. Recentemente, essa foi a solução imposta pelo judiciário para a gratuidade das viagens dos passageiros idosos nas linhas intermunicipais e interestaduais e foi a solução tomada administrativamente pelo Governo do Estado de São Paulo para reduzir a tarifa do pedágio nas marginais da rodovia Castelo Branco. "Se fosse correto esse entendimento, por exemplo, não seriam possíveis as concessões patrocinada e administrativa previstas na lei federal nº 11.079/04", afirma o advogado.
Outro argumento que Azevedo Marques considera despropositado é dizer que não pode haver concessão por inexistir relação direta com o usuário. "Trata-se de uma idéia duplamente equivocada: essa tal relação direta sequer seria exigida pois há vários exemplos de concessão em que ela sequer existe como é o caso da concessão do serviço de transmissão ou geração de energia elétrica em que o concessionário não trava relação com o usuário; porém no serviço de coleta de lixo há inegável relação, pois quem determina quanto de lixo deverá ser recolhido num dado dia é o usuário e quem define a forma de prestação (dias de coleta, horário) é a concessionária.A ninguém ocorreria dizer que os usuários do serviço de coleta não podem reclamar, como consumidor, da concessionária que não tiver recolhido seus resíduos de modo adequado".
O mais grave, segundo o advogado, é que a posição da Prefeitura "se reveste de uma ilegalidade assombrosa". Quem definiu que os serviços de coleta de lixo seriam explorados em regime de concessão foi a lei. Não uma, mais duas. A lei federal nº 9.784/95 (art. 2º) expressamente autoriza a concessão dos serviços de limpeza urbana, dispensando até autorização legal. E a lei municipal nº 13.478/02 expressamente previu e regulou como seria a concessão dos serviços de coleta de lixo.
"No nosso sistema jurídico, quando a lei define um regime de exploração, não cabe ao jurista ou ao administrador negar a lei por professar entendimento discordante. Isso é próprio do direito islâmico, onde vale a posição dos Aiatolás. Se a administração entende que a opção das leis federal e municipal é inaceitável, o único remédio é a argüição de inconstitucionalidade perante o Supremo e o Tribunal de Justiça, respectivamente. Enquanto forem vigentes as leis, as opiniões, sustentáveis ou esdrúxulas, são somente expressões de visões pessoais, nada mais. Não tem o condão de ditar o Direito."
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Fonte: Edição nº 165 do Litteraexpress - Boletim informativo eletrônico da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques, Advocacia.
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