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Ação de improbidade contra juízes de tribunal do trabalho é rejeitada

Atos ilegais não podem ser confundidos com improbidade administrativa, que é caracterizada pela conduta dolosa do agente quando viola os princípios constitucionais da administração pública (artigo 11 da lei 8.429/92. O ministro Teori Albino Zavascki fundamentou assim seu voto ao rejeitar ação de improbidade administrativa contra dois juízes do TRT da 11ª região. A decisão do ministro relator foi acompanhada integralmente pela Corte Especial do STJ.

Da Redação

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Atualizado às 10:11


Ilegalidade x Improbidade

Ação de improbidade contra juízes de tribunal do trabalho é rejeitada


Atos ilegais não podem ser confundidos com improbidade administrativa, que é caracterizada pela conduta dolosa do agente quando viola os princípios constitucionais da administração pública (artigo 11 da lei 8.429/92 - clique aqui). O
ministro Teori Albino Zavascki fundamentou assim seu voto ao rejeitar ação de improbidade administrativa contra dois juízes do TRT da 11ª região. A decisão do ministro relator foi acompanhada integralmente pela Corte Especial do STJ.

No caso, os dois juízes trabalhistas, no exercício da presidência do TRT, assinaram portarias para afastar das funções dois juízes substitutos para que eles proferissem sentenças pendentes em processos que tramitavam em varas do trabalho de Manaus. Um dos juízes afastados interpôs recurso no TST, que concedeu liminar para suspender os efeitos da portaria. Entendeu-se que foram impostas punições sem respaldo legal ao juiz substituto.

A decisão apontou que nas portarias de suspensão foi utilizada a expressão "puxão de orelha", demonstrando a intenção punitiva. No recurso ao STJ, os juízes do TRT afirmaram que, por serem "agentes políticos", só poderiam ser acusados de crime de responsabilidade e, portanto, a acusação de improbidade não se aplicaria a eles. Alegaram que não houve dolo, má-fé ou desonestidade, pois apenas afastaram os juízes substitutos de tarefas burocráticas para que prolatassem as sentenças atrasadas. Segundo eles, as sentenças em atraso feririam o artigo 35, inciso II, da Loman (clique aqui).

 

Na visão do relator, não há nenhuma norma constitucional que imunize agentes políticos, com exceção do presidente da República, de processos por improbidade. O ministro Teori Zavascki observou que ele mesmo já proferiu votos nesse sentido.

 

Contudo, o relator destacou que a jurisprudência pacificada na 1ª seção do STJ e a grande maioria da doutrina especializada apontam que a improbidade não se confunde com simples ilegalidade. "A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente, razão pela qual é indispensável, para sua caracterização, que a conduta seja dolosa", explicou. O ministro Zavascki destacou que em nenhum momento na ação se comprovou a suposta improbidade.

A suspensão para a prolação das sentenças acompanhada da expressão "puxão de orelha" foi considerada equivalente a uma pena disciplinar não prevista na Loman e, portanto, ilegal. "Como se percebe,o fundamento da demanda tem relação com o juízo sobre a legalidade do ato praticado, não com a improbidade da conduta de quem o praticou", esclareceu. O relator afirmou que o dolo deveria ser comprovado, o que não ocorreu.

Confira abaixo a íntegra da decisão.

__________

Superior Tribunal de Justiça

AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Nº 30 - AM (2010/0157996-6) (f)
RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
REQUERENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
REQUERIDO : SOLANGE MARIA SANTIAGO MORAIS
ADVOGADO : IRINEU DE OLIVEIRA E OUTRO(S)
REQUERIDO : BENEDITO CRUZ LYRA
ADVOGADO : IRINEU DE OLIVEIRA E OUTRO(S)

EMENTA

AÇÃO DE IMPROBIDADE ORIGINÁRIA CONTRA MEMBROS DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO. LEI 8.429/92. LEGITIMIDADE DO REGIME SANCIONATÓRIO. EDIÇÃO DE PORTARIA COM CONTEÚDO CORRECIONAL NÃO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA. INEXISTÊNCIA DE IMPROBIDADE.

1. A jurisprudência firmada pela Corte Especial do STJ é no sentido de que, excetuada a hipótese de atos de improbidade praticados pelo Presidente da República (art. 85, V), cujo julgamento se dá em regime especial pelo Senado Federal (art. 86), não há norma constitucional alguma que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4.º. Seria incompatível com a Constituição eventual preceito normativo infraconstitucional que impusesse imunidade dessa natureza (Rcl 2.790/SC, DJe de 04/03/2010).

2. Não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10.

3. No caso, aos demandados são imputadas condutas capituladas no art. 11 da Lei 8.429/92 por terem, no exercício da Presidência de Tribunal Regional do Trabalho, editado Portarias afastando temporariamente juízes de primeiro grau do exercício de suas funções, para que proferissem sentenças em processos pendentes. Embora enfatize a ilegalidade dessas Portarias, a petição inicial não descreve nem demonstra a existência de qualquer circunstância indicativa de conduta dolosa ou mesmo culposa dos demandados.

4. Ação de improbidade rejeitada (art. 17, § 8º, da Lei 8.429/92).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia CORTE ESPECIAL do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, rejeitar a ação de improbidade, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Massami Uyeda, Humberto Martins, Maria Thereza de Assis Moura, Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Cesar Asfor Rocha, Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Gilson Dipp, Eliana Calmon, Francisco Falcão e João Otávio de Noronha, e, ocasionalmente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi e o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Convocados os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão e Raul Araújo e a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti para compor quórum.

Esteve presente, dispensada a sustentação oral, o Dr. Rodrigo Alves Chaves.

Brasília, 21 de setembro de 2011.

MINISTRO ARI PARGENDLER

Presidente

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

Trata-se de ação de improbidade administrativa originária (fls. 03-11), proposta pelo Ministério Público Federal contra Solange Maria Santiago Morais e Benedito Cruz Lyra, juízes do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região, objetivando a imposição das sanções previstas no art. 12, III, da Lei 8.429/92. Proposta perante a 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas, a ação veio a este Tribunal por força de decisão da Corte Especial, proferida no julgamento do AgRg na Rcl 2.115/AM (Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 16/12/2009 - fls. 907-915). Com a subida dos autos a esta Corte, o Ministério Público Federal em sua manifestação de fls. 931/946, suscitou, (a) preliminarmente, a incompetência desta Corte Superior para o julgamento originário da demanda; (b) e, subsidiariamente, seu regular prosseguimento. No julgamento do AgRg na AIA 30 (DJe de 10/02/2011), a Corte Especial indeferiu o pedido relativo à declaração de incompetência deste Tribunal. Foi interposto recurso extraordinário pelo Ministério Público Federal (fls. 996/1.015), o qual foi inadmitido (fls. 1.029/1.030). Essa decisão transitou em julgado em 09 de maio de 2011 (fl. 1.033).

Afirmada a competência originária do STJ, cumpre proferir o juízo inicial de recebimento da ação, nos termos do art. 17, § § 8º e 9º da Lei 8.429/92. A petição inicial descreve os fatos nos seguintes termos:

(...)

III - DOS FATOS

Trata-se de Representação 1.13.000.000750/2004-18 instaurada para apurar atos ilegais praticados pela Presidente do Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região que caracterizam a ingerência indevida da requerida na atividade dos juízes de 1ª grau do TRT/11ª Região.

Consta da mencionada representação que a MM. Juíza Presidente e Corregedora do TRT/11ª Região, Dra. Solange Maria Santiago Morais, editou a portaria 202 (fls. 322), com a finalidade de afastar do exercício de suas funções o Dr. Joaquim Oliveira de Lima, Juiz do Trabalho Substituto, no período de 06 a 12.3.2003, para que prolatasse quatro sentenças atrasadas relativas a processos da 3ª Vara do Trabalho de Manaus.

No dia 08.9.2003, nova Portaria de 722 (fl. 322) foi editada, designando um auxiliar instituído para prolatar as sentenças que se encontravam atrasadas, uma vez que o Dr. Joaquim Oliveira de Lima não havia cumprido determinação da Portaria 202. E, ainda, editou uma terceira Portaria 814 (fl. 334) determinando o afastamento do Juiz do Trabalho Substituto, do dia 8/10/2003 ao dia 15/10/2003, para que o mesmo cumprisse definitivamente as pendências relativas aos processos das 3ª e 8ª Varas.

Novamente, através da Portaria 855 (fl. 333) editada pelo MM. Juiz Benedito Cruz Lyra -Presidente em exercício do TRT da 11ª Região em 16/10/2003, foi prorrogado até o dia 19/10/2003 o afastamento do juiz substituto mencionado. E, pela quinta vez, a MM. Juíza Solange Maria Santiago Morais prorrogou até o dia 20/10/2003, por intermédio da Portaria 862 (fl. 332), os efeitos da supracitada Portaria 855.

De acordo com a documentação apresentada, constata-se que o Juiz substituto mencionado foi afastado das sua funções por cinco Portarias, sendo quatro emitidas pela MM. Juíza Presidente e Corregedora do TRT da 11ª Região, e uma emitida pelo então Presidente do TRT/AM em exercício, MM. Juiz Benedito Cruz Lyra, sem a observância do princípio do devido processo legal, princípio este previsto na Constituição Federal.

Houve, ainda, conforme consta na Representação, o afastamento sumário, do dia 7/10/2003 até 09/10/2003, da Juíza Substituta Ana Eliza Oliveira Praciano, em decorrência da Portaria 803 (fl. 18), motivada pelo fato de a magistrada ter deixado de prolatar 10 (dez) sentenças, relativas a processos da 13ª Vara do Trabalho de Manaus.

Quando informada pela magistrada que as referidas sentenças já haviam sido prolatadas, ou seja, os motivos ensejadores da referida Portaria eram inexistentes, a Juíza Corregedora exigiu a emissão de uma certidão da Secretaria da 13ª Vara do Trabalho de Manaus, que atestasse a inexistência de sentenças a serem prolatadas.

Somente no dia 09/10/2003, quando de posse do ofício enviado pela Secretaria da referida Vara, que atestava a inexistência do motivo que ensejou o afastamento da Juíza Substituta, a MM. Juíza Corregedora fez com que se publicasse nova Portaria revogando os efeitos da Portaria 803, ordenando a permanência da magistrada Ana Eliza Praciano como auxiliar da 2ª Vara do Trabalho de Manaus, conforme portaria 780/2003 (fl. 19).

Mais uma vez, no dia 20/01/2004, através da Portaria 51 (fl. 19), resolveu a Juíza Presidente e Corregedora afastar a Juíza Substituta Ana Eliza de Oliveira Praciano de suas funções, nos dias 21 e 22/01/2004, para que prolatasse quatro sentenças de embargos à execução, referentes a processos da 2ª Vara do Trabalho de Manaus.

Não conformada com aquele afastamento, a MM. Juíza apenada interpôs recurso ordinário perante o Col. TST, obtendo em julgamento de cautelar incidental, o deferimento de medida liminar de suspensão do ato, em decisão do Min. José Luciano Castilho Pereira, que encontrava-se no exercício da Presidência.

É de grande valia observar que, em seu despacho, o Ministro José Luciano argumentou que 'como se observa pela leitura do artigo 42 da LOMAN, as únicas penas disciplinares admitidas são as de advertência, censura, remoção compulsória, disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, aposentadoria compulsória e demissão', concluindo que 'verifica-se num exame apriorístico, como é próprio das liminares, que a citada Portaria sustentada na Resolução do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região, impôs à magistrada, ora requerente, penalidade sem respaldo legal, tornando-se dessa maneira, passível de reparos'.

Na documentação apresentada, constata-se a intenção punitiva da magistrada ao emitir portarias de suspensão, uma vez que utilizou a expressão 'puxão de orelha' para designá-las, conforme fl. 64.

Tais irregularidades evidenciam a prática de atos de improbidade administrativa que violamprincípios constitucionais da Administração Pública (...) (fls. 07/09).

Os requeridos apresentaram suas manifestações por escrito (fls. 968/982), em conformidade com art. 17, § 7º, da Lei 8.429/92. Alegam que: (a) não há amparo legal para aplicação da lei de improbidade administrativa em face de integrantes de Tribunal Regional do Trabalho, já que, por serem agentes políticos, somente podem ser "acusados de crime de responsabilidade"; (b) os atos não foram praticados com dolo, má-fé ou desonestidade, pois não tiveram qualquer intenção de contrariar a lei, bem assim, os princípios que regem a administração pública, tampouco objetivaram prejudicar, de qualquer maneira, os juízes. "Ao revés, (....) ficaram temporariamente desobrigados de exercitar as tarefas burocráticas da vara onde atuavam para se dedicar apenas a atualizar o seu trabalho de prolação de sentenças atrasadas"; (c) as Portarias foram editadas com base nos arts. 38, IX, do Regimento Interno do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região e 656, § 2º, da CLT, já que os juízes Ana Eliza e Joaquim Oliveira "estavam com diversas sentenças atrasadas, descumprindo expressamente o disposto no art. 35, II, da LOMAN". Pedem, assim, a rejeição da petição inicial. O Ministério Público (fl. 1.035), por sua vez, reitera o pedido de recebimento da inicial nos termos do art. 17, § 9º, da Lei 8.429/92.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):

1. Sem razão os requeridos quando sustentam que, por serem agente políticos - membros do Tribunal Regional do Trabalho -, não estão submetidos ao regime da Lei 8.429/92, mas unicamente ao da Lei 1.079/1950, que trata de crimes de responsabilidade. Essa Corte Especial, na Rcl 2.790/SC, de que fui relator (DJe de 04/03/2010), deixou assentado que, excetuada a hipótese de atos de improbidade praticados pelo Presidente da República, não há

norma constitucional alguma que imunize os agentes públicos de qualquer das sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4.º. Na oportunidade, proferi voto nos seguintes termos:

1.Não está inteiramente pacificada no STF a questão relacionada com a legitimidade ou não do duplo regime sancionatório dos agentes políticos em decorrência de atos de improbidade. Em julgamento pioneiro sobre a aplicação ou não da Lei 8.429/92 a Ministro de Estado, vingou no Supremo Tribunal Federal, por escassa maioria, o entendimento de que "o sistema constitucional brasileiro distingue o regime de responsabilidade dos agentes políticos dos demais agentes públicos. A Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4.º (regulado pela Lei 8.429/1992), e o regime fixado no art. 102, I, c (disciplinado pela Lei 1.079/1950). Se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4.º) pudesse abranger também atos praticados por agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, c, da Constituição", razão pela qual "somente o STF pode processar e julgar Ministro de Estado no caso de crime de responsabilidade e, assim, eventualmente, determinar a perda do cargo ou a suspensão de direitos políticos" (STF, Recl. 2.138, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, DJ 10.04.2008).

A corrente contrária sustentou que a Constituição não impede, mas, ao contrário, admite expressamente (no § 4.º do art. 37) a duplicidade de regime (civil e penal) para os ilícitos deimprobidade. Ademais, nem todos os atos de improbidade previstos na Lei 8.429/92 estão tipificados como crimes de responsabilidade pela Lei 1.079/50, razão pela qual o duplo regime somente se configuraria, se proibido fosse, em relação às tipificações coincidentes, não quanto às demais. Mesmo para essa corrente, todavia, a aplicação da Lei 8.429/92 deve ser mitigada em relação aos agentes políticos, para os quais não é admissível a imposição da sanção de perda do cargo ou de suspensão dos direitos políticos, ao menos em juízo de primeiro grau ou antes do trânsito em julgado. Relativamente a esses agentes, a referida Lei deve, portanto, ser adotada, mas com ablação dessas sanções. São ilustrativos desta polêmica, além dos votos proferidos naquele precedente e em outros julgados do STF, os que constam da ADI 2.860-0, Min. Pertence, DJ 19.12.2006.

2.Um ponto comum pode ser identificado nas duas correntes: implícita ou explicitamente, ambas reconhecem e procuram superar a perplexidade de submeter agentes políticos detentores dos cargos de maior nível institucional e de responsabilidade política do País (que, em matéria penal, têm foro por prerrogativa de função, mesmo por crimes que acarretam simples pena de multa pecuniária) à possibilidade de sofrerem sanção de perda do cargo ou de suspensão de direitos políticos em processo de competência de juiz de primeiro grau. Ainda quando subordinada a aplicação da pena ao trânsito em julgado, o processo nem sempre teria condições de ser apreciado pelos Tribunais Superiores, cuja competência é restrita a hipóteses de ofensa à Constituição (STF) ou às leis federais (STJ), sendo-lhes vedado o reexame dos fatos da causa.

Cada corrente dá a esse problema solução a seu modo: uma simplesmente imuniza os agentes políticos da aplicação da Lei de Improbidade e a outra afasta ou mitiga a aplicação das sanções mais graves, acima indicadas.

Certamente por influência dessa preocupação comum, há nas duas correntes a invocação cumulativa de elementos argumentativos de natureza substancialmente diferente: fundamentos de ordem instrumental (regime de competência para julgar a ação de improbidade ou o crime deresponsabilidade) são trazidos para sustentar conclusões de natureza material (duplicidade do regime jurídico do ilícito, sua tipificação e seus agentes). Percebe-se, outrossim, que disposições normativas infraconstitucionais, especialmente as da Lei 1.079/50, são reiteradamente invocadas como elementos de argumentação para interpretar o sistema sancionador constitucional, invertendo, de certo modo, o sentido da hierarquia das normas, que deve ser vertical, mas de cima para baixo, e não o contrário.

3. Olhada a questão sob o ângulo exclusivamente constitucional e separados os elementos de argumentação segundo a sua natureza própria, é difícil justificar a tese de que todos os agentes políticos sujeitos a crime de responsabilidade (nos termos da Lei 1.079/50 ou do Decreto-lei 201/67) estão imunes, mesmo parcialmente, às sanções do art. 37, § 4.º, da Constituição. É que, segundo essa norma constitucional, qualquer ato de improbidade está sujeito às sanções nela estabelecidas, inclusive à da perda do cargo e à da suspensão de direitos políticos. Ao legislador ordinário, a quem o dispositivo delegou competência apenas para normatizar a "forma e gradação" dessas sanções, não é dado limitar o alcance do mandamento constitucional. Somente a própria Constituição poderia fazê-lo e, salvo em relação a atos de improbidade do Presidente da República adiante referidos, não se pode identificar no texto constitucional qualquer limitação dessa natureza.

4. Realmente, as normas constitucionais que dispõem sobre crimes de responsabilidade podem ser divididas em dois grandes grupos: um que trata exclusivamente de competência para o processo e julgamento de tais crimes, estabelecendo foro por prerrogativa de função; e outro que dispõe sobre aspectos objetivos do crime, indicando condutas tipificadoras. Situado no primeiro grupo, o art. 52 estabelece que "compete privativamente ao Senado Federal: I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; II - processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade". Nos termos do art. 96, III, compete privativamente "aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes (...) de responsabilidade (...)". Segundo o art. 102, I, c, compete ao Supremo Tribunal Federal "processar e julgar, originariamente, (...) nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente". Nos termos do art. 105, I, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, nos crimes de responsabilidade, "os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais". E, nos termos do art. 108, I, aos Tribunais Regionais Federais compete processar e julgar, originariamente, nos crimes de responsabilidade, "os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, (...) e os membros do Ministério Público da União (...)".

Ora, não se pode identificar nessas normas do primeiro grupo - de natureza exclusivamente instrumental - qualquer elemento que indique sua incompatibilidade material com o regime do art. 37, § 4.º, da Constituição. O que elas incitam é um problema de natureza processual , concernente à necessidade de compatibilizar as normas sobre prerrogativa de foro com o processo destinado à aplicação das sanções por improbidade administrativa, nomeadamente as que importam a perda do cargo e a suspensão dos direitos políticos.

5.O segundo grupo de normas constitucionais é o das que indicam o elemento objetivo da conduta caracterizadora do crime de responsabilidade. A teor do § 2.º do art. 29-A, "constitui crime de responsabilidade do Prefeito Municipal: I - efetuar repasse que supere os limites definidos neste artigo; II - não enviar o repasse até o dia vinte de cada mês; ou III - enviá-lo a menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária". E, nos termos do § 3.º do mesmo artigo, "constitui crime de responsabilidade do Presidente da Câmara Municipal o desrespeito ao § 1.º deste artigo", segundo o qual "a Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores". No caput do art. 50 tipifica-se como "crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada" de comparecimento de Ministro de Estado ou de "quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República" quando convocados pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, para "prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado". Essas mesmas autoridades, a teor § 2.º do mesmo art. 50, cometem crime de responsabilidade com "a recusa, ou o não atendimento, no prazo de trinta dias, bem como a prestação de informações falsas", em face de pedidos de informações feitos pelas Mesas da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal. No art. 85, estabelece a Constituição que "são crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União; II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País; V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária; VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais". Segundo o § 6.º do art. 100, "o Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatório incorrerá em crime de responsabilidade". E, finalmente, no § 1.º do art. 167 está determinado, "sob pena de crime de responsabilidade", que "nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão (...)".

Como se percebe, a única alusão a improbidade administrativa como crime de responsabilidade, nesse conjunto normativo do segundo grupo, é a que consta do inciso V do art. 85, ao considerar crime de responsabilidade os atos praticados pelo Presidente da República contra a "probidade na administração", dando ensejo a processo e julgamento perante o Senado Federal (art. 86). Somente nesta restrita hipótese, conseqüentemente, é que se identifica, no âmbito material , uma concorrência de regimes, o geral do art. 37, § 4.º, e o especial dos arts. 85, V, e 86.

É certo que não se pode negar ao legislador ordinário a faculdade de dispor sobre aspectos materiais dos crimes de responsabilidade, tipificando outras condutas além daquelas indicadas no texto constitucional. É inegável que essa atribuição existe, especialmente em relação a condutas de autoridades que a própria Constituição, sem tipificar, indicou como possíveis agentes do crime. Todavia, no desempenho de seu mister, ao legislador cumpre observar os limites próprios da atividade normativa infraconstitucional, que não o autoriza a afastar ou a restringir injustificadamente o alcance de qualquer preceito constitucional. Por isso mesmo, não lhe será lícito, a pretexto de tipificar crimes de responsabilidade, excluir os respectivos agentes das sanções decorrentes do comando superior do art. 37, § 4.º.

6.O que se conclui, em suma, é que, excetuada a hipótese de atos de improbidade praticados pelo Presidente da República (sujeitos, por força da própria Constituição, a regime especial), não há norma constitucional alguma que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4.º.

Seria igualmente incompatível com a Constituição eventual preceito normativo infraconstitucional que impusesse imunidade dessa natureza. O que há, inegavelmente, é uma situação de natureza estritamente processual , que nem por isso deixa de ser sumamente importante no âmbito institucional, relacionada com a competência para o processo e julgamento das ações de improbidade, já que elas podem conduzir agentes políticos da mais alta expressão a sanções de perda do cargo e à suspensão de direitos políticos. Essa é a real e mais delicada questão institucional que subjaz à polêmica sobre atos de improbidade praticados por agentes políticos. Ora, a solução constitucional para o problema, em nosso entender, está no reconhecimento, também para as ações de improbidade, do foro por prerrogativa de função assegurado nas ações penais.

Cumpre registrar, ademais, que o fato aqui imputado aos requeridos, Juízes de Tribunal Regional do Trabalho, não encontra tipificação como crime de responsabilidade. A disposição normativa de tipificação de membro de tribunal de segundo grau é a do art. 39-A, parágrafo único da Lei 1.079, de 10 de abril de 1950, que se refere a desembargador como sujeito ativo e que remete aos crimes contra lei orçamentária, os quais, por sua vez, somente podem ser praticados pelo Presidente e respectivo substituto quando no exercício da Presidência do Tribunal.

2. Todavia, no caso, não há como superar positivamente o juízo de admissibilidade da ação. A jurisprudência pacificada no âmbito da 1ª Seção, que julga recursos da espécie, acompanhando entendimento maciço da doutrina especializada (v.g.: "Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública: corrupção: ineficiência ", Fábio Medina Osório, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007; "Improbidade Administrativa ", Emerson Garcia e

Rogério Pacheco Alves, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 296-299), enfatiza o entendimento de que não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A

improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente, razão pela qual é indispensável, para a sua caracterização, que a conduta do agente seja dolosa (condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92), ou pelo menos eivada de culpa grave (condutas do artigo 10). Nesse sentido: ERes 479.812, 1ª Seção, de minha relatoria, DJ de 27/09/10; EResp 917.437, 1ª Seção, Min. Castro Meira, DJ de 22/10/10; REsp 827.445, 1ª T., de minha relatoria, DJ de 08/03/10; REsp 734.984/SP, 1 T., Min. Luiz Fux, DJe de 16.06.2008; AgRg no REsp 479.812/SP, 2ª T., Min. Humberto Martins, DJ de 14.08.2007; REsp 842.428/ES, 2ª T., Min. Eliana Calmon, DJ de 21.05.2007; REsp 841.421/MA, 1ª T., Min. Luiz Fux, DJ de 04.10.2007; REsp 658.415/RS, 2ª T., Min. Eliana Calmon, DJ de 03.08.2006; REsp 626.034/RS, 2ª T., Min. João Otávio de Noronha, DJ de 05.06.2006; e REsp 604.151/RS, de que fui relator para o acórdão, DJ de 08.06.2006, com a seguinte ementa:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. LEI 8.429/92, ART. 11. DESNECESSIDADE DE OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. EXIGÊNCIA DE CONDUTA DOLOSA.
(...)
2. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência do STJ associam a improbidade administrativa à noção de desonestidade, de má-fé do agente público. Somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a configuração de improbidade por ato culposo (Lei 8.429/92, art. 10). O enquadramento nas previsões dos arts. 9º e 11 da Lei de Improbidade, portanto, não pode prescindir do reconhecimento de conduta dolosa.

3. Recurso especial provido.

Em voto de relator nos ERes 479.812, 1ª Seção, DJ de 27/09/10, acompanhado por unanimidade, registrei:

Realmente, o princípio da legalidade impõe que a sanção por ato de improbidade esteja associada ao princípio da tipicidade. Reflexo da aplicação desses princípios é a descrição, na Lei 8.429, de 1992, dos atos de improbidade administrativa e a indicação das respectivas penas.

Tais atos estão divididos em três grandes 'tipos', cujos núcleos centrais estão assim enunciados:

'(...) auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta Lei' (art. 9.º); ensejar, por 'qualquer ação ou omissão dolosa ou culposa (...),' a 'perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei' (art. 10); e violar, por 'qualquer ação ou omissão (...)', 'os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições' (art. 11).

Apenas para as condutas do art. 10 está prevista a forma culposa, o que significa dizer que, nas demais, o tipo somente se perfectibiliza mediante dolo. A tal conclusão se chega por aplicação do princípio da culpabilidade, associado ao da responsabilidade subjetiva, por força dos quais não se tolera responsabilização objetiva nem, salvo quando houver lei expressa, a penalização por condutas meramente culposas. O silêncio da lei, portanto, tem o sentido eloqüente de desqualificar as condutas culposas nos tipos previstos nos arts. 9.º e 11. Deve-se considerar, a propósito, que o § 6.º do art. 37 da Constituição, ao estatuir a regra geral da responsabilidade civil objetiva do Estado, preservou, quanto a seus agentes causadores do dano, a responsabilidade de outra natureza, subordinada a casos de dolo ou culpa. Sua responsabilidade objetiva, em conseqüência, demandaria, no mínimo, previsão normativa expressa, que, ademais, dificilmente se compatibilizaria com a orientação sistemática ditada pelo preceito constitucional. Não é por acaso, portanto, que, no âmbito da Lei 8.429/92 (editada com o objetivo de conferir maior efetividade aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, inscritos no caput do mesmo dispositivo da Constituição), há referência a 'ação ou omissão, dolosa ou culposa' no art. 5.º, que obriga ao ressarcimento do dano, em caso de lesão ao patrimônio público, e no art. 10, que descreve uma das três espécies de atos de improbidade, qual seja a dos atos que causam prejuízo ao erário. O silêncio da lei com respeito ao elemento subjetivo na descrição dos outros dois tipos de atos de improbidade - os que importam enriquecimento ilícito (art. 9.º) e os que atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11) - certamente não pode ser interpretado como consagração da responsabilidade objetiva, diante de sua excepcionalidade em nosso sistema.

Trata-se de omissão a ser colmatada a luz do sistema e segundo o padrão constitucional, que é o da responsabilidade subjetiva.

3. Pois bem. A presente ação de improbidade administrativa imputa a membros do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (Solange Morais e Benedito Lyra) a prática do ilícito previsto no art. 11, I da Lei 8.429/92 ("Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência "). Alegou-se que a requerida Solange Maria editou a Portaria 202 de 25 de fevereiro de 2003 (fl. 636), do seguinte teor:

A PRESIDENTE E CORREGEDORA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 11ª REGIÃO, no uso de suas atribuições legais e regimentais, e CONSIDERANDO que compete ao Presidente do Tribunal, na qualidade de Corregedor, exercer vigilância sobre o cumprimento dos deveres e sobre os prazos para prolação da sentença (art. 22, X. do Regimento Interno); CONSIDERANDO, ainda, que o Exmº Sr. Dr. Joaquim Oliveira de Lima, Juiz do Trabalho Substituto, deixou de prolatar sentenças em 4 (quatro) processos, cujas publicações encontram-se em atraso;

RESOLVE DETERMINAR o afastamento do Exmº Sr. Dr. Joaquim Oliveira de Lima, Juiz do Trabalho Substituto, de suas funções, no período de 6 a 12.3.2003, especificamente para prolatar as 4 (quatro) sentenças atrasadas e relativas a processos da 3ª Vara do Trabalho de Manaus. Dê-se ciência. Publique-se. SOLANGE MARIA SANTIAGO MORAIS Juíza Presidente do TRT da 11ª Região.

Nessa linha, alegou-se que foram editadas as demais Portarias, de conteúdo semelhante, indicadas na inicial. À exceção da Portaria 855, assinada pelo requerido Benedito Lyra (no exercício da Presidência do TRT), todas foram editadas pela requerida Solange Morais, então presidente e corregedora daquele Tribunal, a saber:

(a) Portaria 722 de 08 de setembro de 2003 (fl. 638): designa o magistrado Joaquim Oliveira para "auxiliar na 8º Vara de Manaus, no período de 9 a 18.9.2003, especificamente para prolatar as sentenças atrasadas e relativas a processos da 8º Vara do Trabalho de Manaus" (fls. 638/642);

(b) Portaria 814 de 08 de outubro de 2003 (fl. 645): determina o afastamento do juiz Joaquim Oliveira, "de suas funções, a partir das 9h30min do dia 8.10, até o dia 15.10.2003, para solucionar definitivamente as pendências relativas a processos das MM 8ª e 3ª Vara do Trabalho de Manaus ";

(c) Portaria 855 de 16 de outubro de 2003 (fl. 646): prorrogou até o dia 19.10.2003 os efeitos da portaria 814, "para solucionar definitivamente as pendências relativas a processos das MM 8ª e 3ª Varas do Trabalho de Manaus ";

(d) Portaria 862 de 20 de outubro de 2003 (fl. 648): prorrogou até o 20.10.2003, mais uma vez, os efeitos da portaria 814, "para solucionar definitivamente as pendências relativas a processos das MM 3ª Vara do Trabalho de Manaus ".

(e) Portaria 803 (fl. 32): determina o afastamento da magistrada Ana Eliza Oliveira Praciano, "de suas funções, no período de 7. a 9.10.2003, especificamente para prolatar as 10 (dez) sentenças atrasadas e relativas a processos a 13ª Vara do Trabalho de Manaus" ; e

(f) Portaria 51 de 20 de janeiro de 2004 (fl. 33-34): também determina o afastamento da juíza Ana Eliza, "de suas funções, nos dias 21.01 e 22.01.2004, especificamente para prolatar as 4 (quatro) sentenças de embargos à execução atrasadas e relativas a processos da 2ª Vara do Trabalho de Manaus".

Ora, a petição inicial, embora enfatize a ilegalidade dessas Portarias, em nenhum momento afirma ter havido conduta dolosa de parte dos demandados. No concernente ao elemento subjetivo da conduta, limitou-se o Ministério Público a referir que, ao editarem essas Portarias "para prolação de sentenças atrasadas ", os demandados intencionalmente aplicaram uma pena disciplinar - "uma vez que foi utilizada a expressão 'puxão de orelha '" - não prevista no rol taxativo do art. 42 da LC 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) e, assim agindo, "os magistrados ampliaram o rol de espécies de sanção punitiva para magistrados que porventura possuam pendências processuais", com esses atos, "violaram um dos princípios basilares do ordenamento jurídico brasileiro, qual seja o da legalidade, uma vez que não observaram a determinação contida na lei (...) esse princípio significa que todo o administrador está, no exercício de sua atividade funcional, vinculado aos dispositivos legais, sob pena de prática de ato inválido" (fl. 10).

Como se percebe, o fundamento da demanda tem relação com juízo sobre a legalidade do ato praticado, não com a improbidade da conduta de quem o praticou. Na verdade, cumpria ao autor da ação descrever de forma clara e verossímil que a conduta dos agentes foi movida, não com a intenção indicada nas Portarias, mas com a má intenção de desvirtuar dolosamente os princípios constitucionais que regem a administração da justiça. Nada disso consta da inicial, nem se pode deduzir da narrativa dos fatos.

Pelo contrário, cumpre registrar que o próprio Pleno do Tribunal editou a Resolução Administrativa 129-A de 21 de outubro de 2003 (posterior à edição de algumas das Portarias objeto da ação de improbidade), "por unanimidade de votos", em que resolveu manter "as providências tomadas pela Exma. Juíza Solange Maria Santiago Morais, Presidente e Corregedora do Tribunal, com relação ao atraso de sentenças e andamentos de processos, até que se esgotem suas funções como Corregedora" (fl. 616). Posteriormente, na sessão administrativa ocorrida no dia 13 de janeiro de 2004, o Pleno do Tribunal - considerando "o que ficou estabelecido na Resolução Administrativa 129-A/2003 ", "que a Exma. Sra. Juíza Ana Eliza Oliveira Praciano se encontra com 8 (oito) sentenças em atraso desde o dia 19/12/2003, conforme informações da 2ª VT de Manaus" e "que a Exma. Sra. Juíza Presidente deu conhecimento ao Tribunal Pleno que a prolação das referidas sentenças vem sendo adiada desde o dia 30/10/2003 e que foi adiada mais uma vez para o dia 16/01/2004"

(...) -, resolveu "autorizar que a Presidência tome as medidas cabíveis, quanto à regularização das aludidas sentenças " (Resolução Administrativa 13/2004 - fl. 719). Em suma: os atos praticados pelos demandados foram, direta ou indiretamente, chancelados pelos membros do TRT da 11ª Região que participaram das referidas sessões administrativas.

Sinale-se que não foi colocada em dúvida a idoneidade da conduta desses demais integrantes daquele Tribunal.

Em suma: o que a petição inicial descreve é, simplesmente, a prática de atos eivados de ilegalidade, não a prática de atos de improbidade. Ora, a ilegalidade, ainda que existente, por si só não autoriza a instauração de ação destinada a aplicar as severas sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92 para condutas eivadas de improbidade.

4. Ante o exposto, voto no sentido de rejeitar a ação, nos termos do art. 17, § 8º, da Lei

8.429/92.

É o voto.

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

Relator

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