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Estácio de Sá não consegue reverter indenização por bala perdida que atingiu aluna

A 2ª seção do STJ negou recurso da Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá Ltda., mantendo decisão que a condenou a pagar indenização pelos danos causados a uma aluna, atingida por bala perdida em seu campus universitário no RJ.

Da Redação

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Atualizado às 15:33


Responsabilidade

Estácio de Sá não consegue reverter indenização por bala perdida que atingiu aluna

A 2ª seção do STJ negou recurso da Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá Ltda., mantendo decisão que a condenou a pagar indenização pelos danos causados a uma aluna, atingida por bala perdida em seu campus universitário no RJ.

Para a Estácio, sua situação seria similar à de outras organizações em julgados do próprio STJ, os quais afirmam não existir responsabilidade das empresas por disparos de arma de fogo efetuados por terceiros. Por isso, tentou o recurso chamado embargos de divergência, alegando que a decisão da 3ª turma sobre a indenização discordava do entendimento da 4ª turma em outros processos. Mas a 2ª seção, que reúne as duas turmas responsáveis por direito privado, negou a existência de conflito entre os entendimentos.

Segundo a universidade, o entendimento da 4ª turma seria de que bala perdida não constitui risco inerente à atividade principal da empresa. Os julgados nesse sentido dizem respeito a vítimas em sala de cinema e no interior de ônibus.

"Diante da mesma circunstância, a 3ª e a 4ª turmas concluíram de maneira diametralmente oposta: enquanto a 3ª turma entendeu pela responsabilidade da empresa, a 4ª turma entende tratar-se de fortuito externo, que exonera de responsabilidade a prestadora de serviços", sustentou a empresa.

Avisos ignorados

O ministro Raul Araújo enfatizou que a decisão da 3ª turma apontou claramente a diferença dos casos. Nesse julgamento, os ministros esclareceram que apesar de o fato "aluna baleada no campus" não estar entre os riscos normais da atividade principal de uma universidade, no caso houve falha da entidade em proteger a integridade física dos estudantes. A Estácio ignorou os avisos e advertências dos criminosos situados em sua vizinhança, que alertaram com antecedência dos tiroteios que realizaram no local nesse dia.

As instâncias ordinárias afirmaram que a universidade recebeu panfleto tratando do fechamento do comércio local em protesto contra a atuação da PM e, ao manter-se em funcionamento, a instituição assumiu o risco pelos resultados. "Seria previsível que os marginais, em represália à conduta da ré em manter o campus aberto, tomassem uma atitude mais grave, como a que ocorreu", afirma a sentença.

Ao comparar essa hipótese com a da vítima dentro do ônibus, o relator ressaltou que, em condições normais, o risco de ser uma cliente atingida por bala perdida não está inserido na atividade econômica explorada pela empresa, o que afasta sua responsabilidade. Quanto aos disparos efetuados a esmo por portador de deficiência mental em cinema de shopping center, o ministro apontou que a turma havia entendido ser evento imprevisível e inevitável dentro das condições normais de funcionamento de um centro comercial.

"Consideradas as condições em que ocorrido cada caso concreto, dentro da normalidade dos riscos inerentes à atividade empresarial ou levando-se em conta a assunção de risco extraordinário pelo demandado, como na situação do acórdão embargado, foram dadas soluções diferentes para as hipóteses confrontadas, não havendo, assim, divergência de teses jurídicas", concluiu o relator.

Veja abaixo a decisão.

__________

AgRg nos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 876.448 - RJ

(2011/0066360-0)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO

AGRAVANTE : SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA

ADVOGADOS : DIEGO BARBOSA CAMPOS E OUTRO(S) SÉRGIO BERMUDES

AGRAVADO : L.G.N. E OUTROS

ADVOGADOS : GLICIA PINTO DANTAS E OUTRO JOÃO TANCREDO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. ALUNA BALEADA EM CAMPUS UNIVERSITÁRIO. PARTICULARIDADES DO CASO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ACÓRDÃOS CONFRONTADOS. SITUAÇÕES DISTINTAS. EMBARGOS LIMINARMENTE INDEFERIDOS. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Inadmissíveis os embargos de divergência se manifestamente distintas as bases fáticas entre os casos confrontados. Consideradas as condições em que ocorrido cada evento concreto, dentro da normalidade dos riscos inerentes a atividade empresarial, nos paradigmas, ou levando-se em conta a assunção de risco extraordinário pelo demandado, como na situação do acórdão embargado, foram dadas soluções diferentes para as hipóteses confrontadas, não havendo, assim, divergência de teses jurídicas.

2. Agravo regimental não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Seção, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 25 de maio de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO RAUL ARAÚJO

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO:

SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA ingressa com agravo regimental inconformada com a decisão de fls. 1.326 a 1.331, assim fundamentada:

"Cuida-se de Embargos de Divergência opostos por SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA contra o acórdão da egrégia Terceira Turma desta Corte, de relatoria do eminente Ministro SIDNEI BENETI , assim ementado:

"RECURSOS ESPECIAIS - RESPONSABILIDADE CIVIL - ALUNA BALEADA EM CAMPUS DE UNIVERSIDADE - DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS - ALEGAÇÃO DE DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, CONSISTENTE EM GARANTIA DE SEGURANÇA NO CAMPUS RECONHECIDO COM FATOS FIRMADOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM - FIXAÇÃO - DANOS MORAIS EM R$ 400.000,00 E ESTÉTICOS EM R$ 200.000,00 - RAZOABILIDADE, NO CASO - PENSIONAMENTO MENSAL - ATIVIDADE REMUNERADA NÃO COMPROVADA - SALÁRIO MÍNIMO - SOBREVIVÊNCIA DA VÍTIMA - PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA - INVIABILIDADE - DESPESAS MÉDICAS - DANOS MATERIAIS - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO - JUROS MORATÓRIOS - RESPONSABILIDADE CONTRATUAL - TERMO INICIAL - CITAÇÃO - DANOS MORAIS INDIRETOS OU REFLEXOS - PAIS E IRMÃOS DA VÍTIMA - LEGITIMIDADE - CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL - TRATAMENTO PSICOLÓGICO - APLICAÇÃO DA SÚMULA 7/STJ .

1.- Constitui defeito da prestação de serviço, gerando o dever de indenizar, a falta de providências garantidoras de segurança a estudante no campus, situado em região vizinha a população permeabilizada por delinqüência, e tendo havido informações do conflagração próxima, com circulação de panfleto por marginais, fazendo antever violência na localidade, de modo que, considerando-se as circunstâncias específicas relevantes, do caso, tem-se, na hipótese, responsabilidade do fornecedor nos termos do artigo 14, § 1º do Código de defesa do Consumidor.

2.- A Corte só interfere em fixação de valores a título de danos morais que destoem da razoabilidade, o que não ocorre no presente caso, em que estudante, baleada no interior das dependência de universidade, resultou tetraplégica, com graves conseqüências também para seus familiares.

3.- A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a pensão mensal deve ser fixada tomando-se por base a renda auferida pela vítima no momento da ocorrência do ato ilícito. No caso, não restou comprovado o exercício de atividade laborativa remunerada, razão pela qual a pensão deve ser fixada em valor em reais equivalente a um salário mínimo e paga mensalmente.

4.- No caso de sobrevivência da vítima, não é razoável o pagamento de pensionamento em parcela única, diante da possibilidade de enriquecimento ilícito, caso o beneficiário faleça antes de completar sessenta e cinco anos de idade.

5.- O ressarcimento de danos materiais decorrentes do custeio de tratamento médico depende de comprovação do prejuízo suportado.

6.- Os juros de mora, em casos de responsabilidade contratual, são contados a partir da citação, incidindo a correção monetária a partir da data do arbitramento do quantum indenizatório, conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal.

7.- É devida, no caso, aos genitores e irmãos da vítima, indenização por dano moral por ricochete ou préjudice d'affection, eis que, ligados à vítima por laços afetivos, próximos e comprovadamente atingidos pela repercussão dos efeitos do evento danoso na esfera pessoal.

8.- Desnecessária a constituição de capital para a garantia de pagamento da pensão, dada a determinação de oferecimento de caução e de inclusão em folha de pagamento.

9.- Ultrapassar os fundamentos do Acórdão, afastando a condenação ao custeio de tratamento psicológico, demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, incidindo, à espécie, o óbice da Súmula 7/STJ.

10.- Recurso Especial da ré provido em parte, tão-somente para afastar a constituição de capital, e Recurso Especial dos autores improvido." (fls. 1228/1229)

A embargante invoca divergência com julgados da eg. Quarta Turma, o Resp 613.402/SP, relator o eminente Min. CÉSAR ASFOR ROCHA e o Resp 1.164.889/SP, relator o eminente Min. HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO, ao entendimento de que bala perdida não constitui risco inerente à atividade principal da parte e, portanto, não enseja a sua responsabilização.

A alegada divergência, entretanto, não parece demonstrada.

O aresto ora embargado, com respaldo em toda a situação fática emanada dos autos, assim concluiu:

"No caso, a vítima, estudante do estabelecimento prestador de serviços, obtinha os serviços em situação de risco, consistente na grande probabilidade de vir a ser atingida por disparos de armas de fogo por malfeitores e, mesmo, eventuais perseguidores destes, em dia em que a região estava convulsionada devido a verdadeira "ordem" dos delinqüentes de paralisação geral de atividades, em decorrência de fato a envolver ocorrência com traficantes - o que tinha sido objeto de panfleto distribuído à população local e que havia chegado ao conhecimento da instituição de ensino.

Não se podia, evidentemente, exigir que o estabelecimento de ensino obedecesse a ordem ilegal de paralisação de atividades. Mas não há como deixar de reconhecer que o funcionamento se fazia em situação de maior risco para os estudantes.

Nessa situação de maior risco, inerente ao serviço, a tomada de providências visando a eliminá-lo ou, ao menos, a alertar os estudantes para a situação, de modo que a ausência dessas providências configura, neste caso específico, sem que se afirme a automática propagação desta conclusão para situações outras, o defeito do serviço, não desqualificável como defeito por nenhuma das situações enumeradas no art. 14, § 3º, do Cód. de Defesa do Consumidor, ou seja: "I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou e terceiro".

Volte-se a frisar bem, que a situação especial que rege o caso presente não é de transpor-se a todo e qualquer caso de ocorrência de dano a estudante, ocorrente em instituição de ensino durante suas atividades normais. Quase que totalmente ímpar o caso, em verdade, diante das circunstancias que encerra. Mas, sem dúvida, no caso, havia risco na prestação do serviço, naquela região e naquele momento. Esse risco específico exigia providências específicas, não rotineiras, que iam além do fornecimento de segurança habitual, por intermédio de câmaras e vigilantes, de que dispunha a instituição ora recorrente." (fls. 1191/1192)

(...)

"No caso, trata-se de evento ocorrido nas dependências de universidade particular, instituição prestadora de serviço de ensino superior. Embora a ocorrência não se situe na atividade principal do estabelecimento de ensino, isto é, garantia de qualidade do estudo fornecido, situa-se ela, a ocorrência, no âmbito de prestação de serviço necessário à atividade, ou seja, o de resguardar a integridade física dos estudantes, tanto que existente aparato de segurança, mantido pela universidade, com custo repassado aos consumidores na mensalidade, de modo a gerar proveito econômico, atraindo estudantes para a instituição." (fls. 1194)

(...)

"Relembre-se e frise-se que, no caso dos autos, foi entregue a preposto da Universidade um panfleto (fls. 173), em que se ventilava o fechamento do comércio local em protesto contra a atuação da Polícia Militar na área, tendo a sentença de primeira instância concluído pela assunção do risco pela recorrente ao manter as aulas, contrariamente ao ocorrido em situações análogas, consignando que (fls. 474):

Como restou demonstrado, havia por parte da direção do campus Rebouças da ré a ciência de que a marginalidade do morro do Turano havia determinado o fechamento do comércio local e que o campus já tinha sido fechado em outras oportunidades. A alegação de que não havia ordem expressa para que o campus fosse fechado não pode ser acolhida, uma vez que, sabendo da periculosidade que os marginais do morro em questão representavam para a vizinhança, correu a ré o risco do resultado mantendo o campus aberto. Assim, seria previsível que os marginais, em represália à conduta da ré em manter o campus aberto, tomassem uma atitude mais grave, como a que ocorreu no caso em tela." (fls. 1196)

Por outro lado, os arestos apontados como paradigmas, que tratam de situação fática estranha a dos autos (bala perdida em transporte coletivo e crime cometido dentro de cinema localizado em shopping center), também pela análise das circunstâncias específicas de cada espécie, afirmaram a ausência de responsabilidade da transportadora (Resp 613.402/SP) e ausência de nexo de causalidade entre os tiros desferidos por um cidadão, portador de doença mental, e a responsabilidade do shopping (Resp 1.164.889/SP).

Confiram-se as seguintes passagens dos mencionados julgados:

"Na espécie, o dano ocorrido durante o transporte é decorrente de bala perdida, que não é fato conexo aos riscos inerentes do deslocamento, mas constitui evento alheio ao contrato de transporte, equiparável à força maior e ao caso fortuito, não implicando responsabilidade da transportadora, conforme bem aduziu a r. sentença: 'se o transporte do autor ocorria assim em condições normais , o fato de autoria exclusiva de terceiro, sem qualquer nexo com a relação estabelecida entre a transportadora e o passageiro, a ela não pode ser imputado" (grifo nosso) (fls. 1283/1284)

.......................................................................................................

" Por todas essas peculiaridades reinantes no caso concreto, tenho por necessário tecer algumas considerações sobre o conceito de Shopping Center.

No Brasil não existe lei que define o que é Shopping center. A definição mais aceita é dada pela ABRASCE (Associação Brasileira de Shopping Centers), qual seja, "um centro comercial planejado sob uma administração única, composto de lojas destinadas exploração comercial e à prestação de serviços, sujeitas a normas contratuais padronizadas, para manter o equilíbrio da oferta e da funcionalidade, assegurando a convivência integrada e pagando um valor de conformidade com o faturamento".

Não se nega que o Shopping Morumbi, é um edifício que significa união de lojas com o um objetivo único: "Venda" e que, para alcançar tal fim, possui alguns diferenciais, tais como: lojas âncoras, espaços de lazer e alimentação, estacionamento e segurança, que servem de chamariz para os clientes, uma vez que é possível ter acesso a uma série de facilidades num único local.

No entanto, é de se indagar: qual a ilicitude da conduta dos recorrentes?

Não existe, em nosso País, na presente data, nenhuma lei específica que obrigue os shopping centers a fiscalização dos clientes e de seus pertences antes de adentrarem as dependências propriamente dita dos shopping.

Aliás, é de se ressaltar que, nem mesmo nos Estados Unidos da América, onde esse tipo de crimes ocorre com certa freqüência, essa fiscalização existe.

O crime ocorrido choca e causa espanto, pois, todos nós acreditamos que esse tipo de situação não aconteceria dentro de um shopping center, estando, portanto, fora do "risco inerente" à atividade empresarial exercida pelo recorrente.

Não se ignora aqui a dor das famílias que perderam seu entes queridos de forma tão selvagem.

Porém, não se pode perder de vista, que o mesmo crime poderia ter sido cometido no saguão de um aeroporto, por exemplo, onde qualquer pessoa pode chegar com uma arma dentro da mochila, sem ser notado, começar a disparar a esmo, causando a morte de várias pessoas, exatamente como fez Matheus, até que a segurança chegue e controle a situação.

Mesmo num aeroporto, local onde circulam várias pessoas diariamente e onde a segurança normalmente é mais reforçada, a fiscalização das pessoas e de seus pertences só realizada no momento do embarque e apenas naqueles que vão viajar.

Por tais razões, data maxima venia, entendo que não há nexo causal na atividade do recorrente e os fatos acontecidos. Os empregados do Shopping não dispunham do poder de polícia para revistar pessoas que buscassem o cinema." (fls. 1303/1304)

Constata-se, portanto, que entre os julgados em confronto não há divergência de interpretação de teses jurídicas, mas sim análise de cada caso concreto e solução específica e adequada, levando-se em consideração a mesma orientação legal. Não há, em verdade, identidade de bases fáticas apta a dar ensejo à abertura da via dos Embargos de Divergência. E a jurisprudência do STJ já pacificou entendimento de que só são cabíveis os Embargos de Divergência quando os arestos trazidos à colação firmaram posição antagônica sobre os mesmos fatos e questões jurídicas deduzidos no acórdão embargado. Ao contrário, devem ser indeferidos os embargos quando, considerando as peculiaridades de cada caso concreto, foram dadas soluções diferentes para as hipóteses confrontadas (EREsp. 443.095/SC, 2S, Rel. Min. CASTRO FILHO, DJU 02.02.2004).

Ante o exposto, com base no art. 266, § 3º do RISTJ, indefiro liminarmente os Embargos de Divergência. Publique-se."

Alega a agravante que "demonstrou, de maneira adequada e suficiente, a existência de divergência entre as teses jurídicas adotadas no acórdão embargado e nos v. acórdãos paradigmas relativamente à isenção de responsabilidade por dano decorrente de evento que não constitua risco inerente à atividade empresarial desenvolvida, como se dá no fortuito externo" (fl. 1.337).

Argumenta que:

"A circunstância de tratarem os acórdãos divergidos e divergente, de alvejamento por bala perdida no interior de um ônibus, de uma sala de cinema ou nas dependências de estabelecimento de ensino superior, data maxima venia, não descaracteriza a similitude fática existente entre os casos. Com efeito, nos três processos trata-se de responsabilização de empresa por dano decorrente de disparo de arma de fogo realizado por terceiro. Nos três casos verificou-se que o disparo de arma não constituía risco inerente à atividade da fornecedora de serviços. Entretanto, diante da mesma circunstância, a Terceira e a Quarta Turmas desse egrégio Tribunal concluíram de maneira diametralmente oposta: enquanto a Terceira Turma entendeu pela responsabilidade da empresa, a Quarta Turma entende tratar-se de fortuito externo, que exonera de responsabilidade a prestadora de serviços. Daí a divergência ensejadora dos embargos aviados." (fls. 1.337/1.338).

Insiste, assim, que ficou comprovada a divergência de teses jurídicas entre o Acórdão embargado, proferido pela egrégia Terceira Turma desta Corte, da relatoria do Ministro Sidnei Beneti, e os Recursos Especiais 613.402/SP e 1.164.889/SP, ambos da Egrégia Quarta Turma, tendo o primeiro como Relator o eminente Ministro Cesar Asfor Rocha, e o segundo da relatoria do eminente Ministro Honildo Amaral de Mello Castro.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator):

O inconformismo não merece prosperar. A decisão agravada enfatizou, de forma clara, que as bases fáticas entre os casos confrontados são manifestamente distintas.

No acórdão embargado, ficou esclarecido que, embora a ocorrência - aluna baleada no campus da Universidade - não se situe dentre os riscos normais inerentes à atividade principal de um estabelecimento superior de ensino, a entidade agravante incidiu em falha no dever de resguardar a integridade física dos estudantes, quando ignorou os avisos e advertências de criminosos, baseados em suas vizinhanças, alertando que promoveriam tiroteios no dia do lamentável evento. Portanto, foi levando em conta essas peculiaridades do caso que se chegou à decisão embargada.

Para melhor compreensão, destaco trecho da ementa do acórdão embargado:

"1.- Constitui defeito da prestação de serviço, gerando o dever de indenizar, a falta de providências garantidoras de segurança a estudante no campus, situado em região vizinha a população permeabilizada por delinqüência, e tendo havido informações do conflagração próxima, com circulação de panfleto por marginais, fazendo antever violência na localidade, de modo que, considerando-se as circunstâncias específicas relevantes, do caso, tem-se, na hipótese, responsabilidade do fornecedor nos termos do artigo 14, § 1º do Código de defesa do Consumidor.

2. ..........................."

Assim, restou destacado que na hipótese tratada no acórdão embargado houve prévia e ampla divulgação do movimento e ameaças de distúrbios feitas por marginais, vizinhos à instituição de ensino, que fora, assim, cientificada dos riscos diretos a que ficariam expostos seus estudantes, naquele dia. Confira-se o seguinte trecho do acórdão:

"(...) no caso dos autos, foi entregue a preposto da Universidade um panfleto (fls. 173), em que se ventilava o fechamento do comércio local em protesto contra a atuação da Polícia Militar na área, tendo a sentença de primeira instância concluído pela assunção do risco pela recorrente ao manter as aulas, contrariamente ao ocorrido em situações análogas, consignando que (fls. 474):

Como restou demonstrado, havia por parte da direção do campus Rebouças da ré a ciência de que a marginalidade do morro do Turano havia determinado o fechamento do comércio local e que o campus já tinha sido fechado em outras oportunidades. A alegação de que não havia ordem expressa para que o campus fosse fechado não pode ser acolhida, uma vez que, sabendo da periculosidade que os marginais do morro em questão representavam para a vizinhança, correu a ré o risco do resultado mantendo o campus aberto. Assim, seria previsível que os marginais, em represália à conduta da ré em manter o campus aberto, tomassem uma atitude mais grave, como a que ocorreu no caso em tela." (fl. 1.196)

Já os acórdãos paradigmas, além de não cuidarem das particularidades acima, retratam situação fática totalmente diversa da considerada no acórdão embargado. O REsp 613.402/SP cuida de hipótese de acidente com bala perdida em relação à situação normal de transporte coletivo, para afastar a responsabilidade da transportadora justamente porque, em condições normais, tal risco não se acha inserido na atividade econômica explorada pela empresa. Assim, não houve nenhuma peculiaridade nessa hipótese apontada pelo recorrente. Igualmente, no julgamento do REsp 1.164.889/SP, tratou-se de crime ocorrido dentro de cinema localizado em shopping center, onde foram desferidos tiros a esmo por atirador portador de deficiência mental, considerando-se tal evento imprevisível e inevitável, dentro das condições normais de funcionamento de um centro comercial.

Consideradas as condições em que ocorrido cada caso concreto, dentro da normalidade dos riscos inerentes a atividade empresarial, nos paradigmas, ou levando-se em conta a assunção de risco extraordinário pelo demandado, como na situação do acórdão embargado, foram dadas soluções diferentes para as hipóteses confrontadas, não havendo, assim, divergência de teses jurídicas.

Nesse caso, de rigor o indeferimento dos embargos de divergência.

A propósito, anotem-se os seguintes precedentes:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL. DISSENSO INTERPRETATIVO. REQUISITO. DISSÍDIO ENTRE ACÓRDÃOS PROFERIDOS EM RECURSO ESPECIAL. ART. 546, I, DO CPC. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO-CARACTERIZADO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. INVIÁVEL A DISCUSSÃO ACERCA DA ADMISSIBILIDADE DO APELO ESPECIAL.

1. Mantém-se na íntegra a decisão recorrida cujos fundamentos não foram infirmados.

2. O art. 546, I, do CPC, c/c o art. 266 do RISTJ estabelece como requisito para a interposição dos embargos de divergência que o dissenso se dê entre acórdão proferido por turma e aresto exarado por outra turma, seção ou órgão especial em sede de recurso especial.

3. A caracterização do dissenso interpretativo pressupõe a semelhança das bases fáticas e a adoção de teses jurídicas distintas.

4. É inviável, em sede de embargos de divergência, discussão acerca da admissibilidade do recurso especial.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg nos EREsp 855.687/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/10/2008, DJe de 20/11/2008)

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AFERIÇÃO. SÚMULA N.º 07 DO STJ. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. CASUÍSTICA. PARTICULARIDADES DE CADA CASO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SITUAÇÕES COMPARADAS DISTINTAS. EMBARGOS LIMINARMENTE INDEFERIDOS. DECISÃO MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.

1. O requisito central para a admissibilidade dos embargos é haver divergência de teses jurídicas em face da mesma hipótese fática, isto é, partindo-se de uma mesma premissa, ter-se alcançado uma conclusão diversa.

2. Perquirir acerca da incidência ou não da Súmula n.º 07 desta Corte, demanda a análise, necessariamente, de cada situação em particular, de cada caso. E, tendo partido o acórdão embargado e o paradigma de bases fáticas completamente distintas, não há como proceder à comparação.

3. Assim, não se abre a especialíssima via - que não se presta à revisão do acerto ou desacerto da decisão embargada - quando não restar evidenciada divergência de teses jurídicas, pressuposto elementar do recurso, nos termos do art. 266, § 1.º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

4. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EREsp 889.807/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/9/2007, DJ de 12/11/2007, p. 146)

Isso posto, nega-se provimento ao agravo regimental.

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