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Termos de cooperação técnica entre órgãos públicos e empresas de tecnologia têm curiosas cláusulas

Empresas responsáveis pela tecnologia que viabiliza a operação do empréstimo consignado aos servidores públicos, por meio de sistema eletrônico, celebram "termos de cooperação técnica" com entes públicos para que o sistema seja instalado. Estes termos versam sobre algumas questões relevantes como, por exemplo, os custos da operação (onde curiosamente não se fala nada de qual é o custo) e do sigilo dos dados bancários, em que pese estas empresas não serem fiscalizadas por ninguém, pelo menos não que saibamos.

Da Redação

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Atualizado em 22 de agosto de 2011 16:52


Quem consigna o consignado ? - II

Termos de cooperação técnica entre órgãos públicos e empresas de tecnologia têm curiosas cláusulas

Empresas responsáveis pela tecnologia que viabiliza a operação do empréstimo consignado aos servidores públicos, por meio de sistema eletrônico, celebram "termos de cooperação técnica" com entes públicos para que o sistema seja instalado.

Estes termos versam sobre algumas questões relevantes como, por exemplo, os custos da operação (onde curiosamente não se fala nada de qual é o custo) e do sigilo dos dados bancários, em que pese estas empresas não serem fiscalizadas por ninguém, pelo menos não que saibamos.

É o que acontece, por exemplo, na cidade de Juazeiro/BA.

Vejamos.

Ali o termo de "cooperação" foi firmado este ano entre a prefeitura e uma empresa responsável pelo sistema de consignação.

  • Custos

Na clásula que trata dos custos, curiosamente a informação não aparece. Com efeito, diz-se apenas que a instalação e manutenção do sistema ocorrerá sem nenhum ônus à prefeitura.

E mais.

Consta que a responsabilidade de garantir a cobertura de todos os custos da operação ficará a cargo das instituições financeiras. Ou seja, imputa a responsabilidade a um terceiro, que não faz parte do acordo.

  • Sigilo

Existem duas cláusulas que versam sobre as informações gerenciadas pelo sistema, melhor dizendo, dos dados da folha de pagamento dos servidores e dos empréstimos.

As cláusulas deixam claro que as empresas passam a ter acesso completo a estes dados, ficando o sigilo resguardado apenas pelo "termo de cooperação". Ora, o Banco Central não deveria regular a operação, uma vez que estamos a tratar de sigilo bancário ?

Enfim, há muito mais dúvidas do que certezas na história dos consignados.

De fato, as empresas de software, aparentemente com espírito filantrópico, oferecem às prefeituras e aos governos o sistema gratuitamente. Firmam, para isso, um "termo de cooperação". No entanto, como se vê, quem coopera, na realidade, é órgão público no faturamento de uma empresa privada. Nada mais.

Com efeito, uma vez dentro dos órgãos públicos, de posse da privilegiada informação (que, frise-se, não lhes custou patavina), estas empresas se apoderam dos dados da folha de pagamento dos servidores e se incubem generosamente de "informar" aos bancos o quanto cada servidor pode tomar de empréstimo, fazendo os respectivos lançamentos. Mas, incauto leitor, não duvide : como não existe almoço grátis, para isso há uma cobrança (e de quanto será?).

A instituição financeira (vivemos num mundo capitalista) repassa o custo para a própria operação, e quem paga ao final é o servidor.

Dessa forma, o que era para ter um custo baixo, acaba sendo onerado.

Na prática, então, as empresas de software ganham na qualidade de intermediários. Intermediários que detêm a informação com exclusividade (aliás, detalhe que não passa despercebido nos contratos, e no de Juazeiro não é exceção, ao final há um item que trata da exclusividade, quando se afirma que as operações de crédito consignado na prefeitura só poderão ser feitos pelo sistema da empresa).

Por tudo isso, há questões ainda sem resposta.

  • Mesmo sendo gratuito para o órgão público, esse tipo de prestação de serviço não precisaria de uma licitação?
  • Falando em custos, não seria o caso do custus legis, o Ministério Público, olhar a questão, pois se trata, de um lado, de coisa pública envolvida, e, de outro, de uma relação de consumo que tem reflexos difusos e coletivos?
  • Se as empresas de software ganham (ouve-se falar em números fabulosos) com as operações, por que o órgão público não licita, ou explora o serviço, a exemplo do que faz quando vende o direito de bancos fazerem a folha de pagamento?
  • O servidor sabe que há embutido um valor na operação?

  • Os bancos seguem regras severas quanto ao sigilo bancário. Mas no caso das empresas de software, qual segurança o servidor tem de que seu sigilo bancário não será violado? Qual segurança há de que os limites legais da proporcionalidade do empréstimo em relação ao salário estão sendo observadas? Alguma entidade fiscaliza estas empresas? Não seria uma missão para o Banco Central?

Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.

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Leia mais - Notícia

  • 26/8/11 - O BC diz que não é responsável por fiscalizar empresas de software que operam o consignado. No entanto, por lidar com poupança (o dinheiro do empréstimo é tomado na outra ponta), parece-nos óbvio que isso é função para o BC fiscalizar - clique aqui.
  • 25/8/11 - Acordos relacionados às operações de consignado não esclarecem importantes questões - clique aqui.

  • 23/8/11 - Empresas de software, sem regulação alguma, detêm relevantes informações bancárias dos servidores públicos - clique aqui.

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