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Justiça do RN indeniza família de passageiro de vôo da Air France

O juiz de Direito Manoel Padre Neto, da 4ª vara Cível de Mossoró/RN, concedeu uma indenização no valor de R$ 1.635.000,00, além de uma pensão no valor de R$ 4.098,13, para a viúva e duas filhas menores do geofísico Soluwellington Vieira de Sá, vítima do acidente aéreo do voo 447, ocorrido no dia 31/5/09, resultando na morte de 228 pessoas.

Da Redação

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Atualizado às 08:50


Acidente aéreo

Justiça do RN indeniza família de passageiro de vôo da Air France

O juiz de Direito Manoel Padre Neto, da 4ª vara Cível de Mossoró/RN, concedeu uma indenização no valor de R$ 1.635.000,00, além de uma pensão no valor de R$ 4.098,13, para a viúva e duas filhas menores do geofísico Soluwellington Vieira de Sá, vítima do acidente aéreo do voo 447 da Air France, ocorrido no dia 31/5/09, resultando na morte de 228 pessoas.

Na sentença, o magistrado ressaltou que o acidente foi amplamente noticiado na imprensa mundial, e que o Tribunal de Grande Instância de Var, no sul da França, indiciou as empresas Air Bus e Air France, respectivamente, fabricante e proprietária da aeronave, pelo crime de homicídio culposo que teve como vítimas as 228 pessoas que estavam a bordo da aeronave do vôo AF 447.

Para o juiz, não há dúvidas de que o brasileiro Soluwellington Vieira de Sá estava como passageiro do vôo, conforme Atestado de Presença de Vôo expedido pela compainha e que o passageiro faleceu no acidente, conforme Certidão de Óbito anexada ao processo. Soluwellington Vieira de Sá nasceu no dia 28/2/69, contando, na data do acidente, com 40 anos, 03 meses e mais 03 dias de vida. Ele era civilmente casado e pai de duas filhas, uma nascida em 4/10/00, e outra em 21/3/05.

Na sentença, o juiz defende que "o anseio de obrigar o agente, causador do dano, a repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça." Nesse sentido, entende o magistrado que a Air France foi negligente pois, uma vez avisada pela Air Bus da necessidade de troca dos tubos pitot, somente em 27/4/09 (apenas dois meses antes do acidente do voo 447 e dois anos após o alerta), a companhia áerea iniciou, segundo matéria jornalística, a troca dos equipamentos.

Acerca dos danos morais, ponderou o juiz que a perda do pai por crianças tão pequenas é irreparável. "Quem já sofreu a perda de um ente querido, notadamente em situação trágica e inesperada como é um acidente aéreo, sabe quão profunda é a dor que invade a alma", afirmou.

A indenização por danos morais fixada foi de R$ 545 mil para cada uma das autoras, totalizando, assim, R$ 1.635.000,00, valor este que deve ser acrescido de atualização monetária e juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano.

As indenizações por danos morais concedidas as filhas da vítima deverão ser depositadas em contas de caderneta de poupança, individualmente abertas para cada uma delas, junto à CEF, com claúsula condicional de movimentação somente pelas respectivas titulares das contas, quando as mesmas atingirem a maioridade (18 anos), ou mediante autorização judicial.

Veja abaixo a íntegra da sentença.

_________

Relação: 0168/2011 Teor do ato: SENTENÇA

EMENTA:

TRATADO INTERNACIONAL, DIREITO CIVIL, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL - ACIDENTE AÉREO EM VÔO INTERNACIONAL - MORTE DE PASSAGEIRO - OCORRÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - APLICAÇÃO DAS REGRAS INSCULPIDAS NA CONVENÇÃO DE MONTREAL - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA AÉREA, PARA INDENIZAÇÃO ATÉ O VALOR CORRESPONDENTE A 100.000 DIREITOS ESPECIAIS DE SAQUE (DES) POR PASSAGEIRO, E RESPONSABILIDADE SUBJETIVA COM CULPA PRESUMIDA DA TRANSPORTADORA, NO VALOR EXCEDENTE AO LIMITE ACIMA CITADO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO OU MESMO ARGÜIÇÃO, PELA PARTE RÉ, DE QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA QUE ELIDA A PRESUNÇÃO DE SUA CULPA - DANO MATERIAL CONFIGURADO, O QUE IMPÕE À PROMOVIDA O DEVER DE PENSIONAR AS PROMOVENTES COM O VALOR MENSAL CORRESPONDENTE A 2/3 (DOIS TERÇOS) DA RENDA LÍQUIDA AUFERIDA PELA VÍTIMA NA DATA DO ACIDENTE, A PARTIR DA DATA DO EVENTO DANOSO ATÉ A DATA EM QUE O DE CUJUS COMPLETARIA 69 (SESSENTA E NOVE) ANOS DE IDADE (DE ACORDO COM O PEDIDO AUTORAL), CESSANDO O AUXÍLIO, PARA AS FILHAS DO FALECIDO, COM O ATINGIMENTO DA IDADE DE 25 (VINTE E CINCO) ANOS OU NA HIPÓTESE DE CASAMENTO E/OU CONCLUSÃO DE CURSO SUPERIOR; E, PARA A VIÚVA, NO CASO DE CONTRAIR NOVAS NÚPCIAS - DANO MORAL CONFIGURADO - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO AUTORAL - EXTINÇÃO DO PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. Vistos, etc.

RELATÓRIO

FRANCY REGIENE ROCHA DE SÁ, RAYANE ROCHA DE SÁ e SABRINA ROCHA DE SÁ, qualificadas nos autos, ajuizaram a presente Ação de Indenização em face da SOCIÉTÉ AIR FRANCE, igualmente qualificada, pedindo que a promovida seja condenada a pagar às autoras a importância de R$ 1.288.000,00 (hum milhão, duzentos e oitenta e oito mil reais), a título de pensionamento mensal, além de indenização por danos morais, no valor que for arbitrado por este julgador.

Em prol do seu querer, aduzem que a primeira demandante é a viúva e as duas últimas são filhas de SOLUWELLINGTON VIEIRA DE SÁ, falecido em 31 de maio de 2009, vítima de acidente em aeronave, vôo 447 da empresa demandada.

Citada, a promovida ofereceu contestação, suscitando as preliminares de (a) ausência de interesse de agir: ao argumento de que as autoras já ajuizaram reclamação trabalhista em face da ex-empregadora do Sr. Soluwellington (a empresa Geokinetics Geophsycal do Brasil Ltda), por meio da qual, alegando a ocorrência de acidente de trabalho (já que o de cujus viajava a bordo do vôo 447 a trabalho), pleitearam o recebimento das exatas mesmas verbas objeto do pedido desta ação indenizatória; (b) prejudicialidade externa: para que a tramitação deste processo seja suspensa, admitindo-se a sua retomada se - e somente se - a reclamação trabalhista proposta contra a ex-empregadora do de cujus for julgada improcedente ou entre ela e as autoras não for celebrado qualquer acordo.

No mérito, disse que a controvérsia apresentada nos autos deve, necessariamente, ser examinada e decidida à luz da Convenção de Montreal, seja porque é essa a legislação específica que rege o transporte internacional de passageiros, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por força do Decreto nº 5.910/2006, seja porque, sob qualquer perspectiva que se avente a questão, o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil são inaplicáveis à hipótese dos autos.

Sustenta que a ré não deixará de assumir o pagamento integral da indenização dos danos sofridos pelos familiares das vítimas do vôo 447, mas desde que estes sejam devidamente comprovados nos autos e respectivamente fixados de acordo com a jurisprudência dominante nos Tribunais Superiores.

No tocante ao pleito de indenização dos danos materiais, assevera que as autoras não provaram que a vítima auferia salário líquido mensal de R$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentos reais), como foi afirmado na petição inicial. Ademais, qualquer pensionamento às autoras deverá corresponder a somente 2/3 (dois terços) da renda percebida pela vítima na data do acidente, perdurando a obrigação até a data em que o de cujus completaria 65 (sessenta e cinco) anos de idade, ou até a data em que as beneficiárias menores completarem 25 anos de idade ou venham a contrair matrimônio, o que ocorrer primeiro, sem que haja direito de acrescer da filha em relação à qual o benefício persistir, ou mesmo da mãe.

No que se refere ao pleito indenizatório a título de danos morais, defendeu que a eventual fixação deva ser feita com parcimônia e moderação, tendo em vista a finalidade exclusiva de compensação do dano, e não de punição para a empresa promovida.

Requereu, por fim, que a indenização final seja trazida a valor presente, para desembolso em uma única parcela e que a promovida seja dispensa da constituição de capital, dadas as suas notórias solvabilidades e solidez financeira.

Na réplica, as promoventes rebateram as duas preliminares supra, e pugnaram pela antecipação dos efeitos da tutela satisfativa, no sentido de que a promovida volte a custear o tratamento psicológico das autoras, uma vez que o custeio foi suspenso logo após o ajuizamento da presente demanda.

Noutro pórtico, apontaram defeito de representação da promovida, em face da ausência de instrumento de procuração e/ou substabelecimento outorgando poderes para o advogado que subscreveu a petição inicial (Rony Jefferson Confessor da Paz - OAB/RN 8.650).

O defeito de representação da promovida foi sanado.

Por meio da decisão interlocutória de fls. 421/423, este magistrado rejeitou as duas preliminares acima mencionadas, oportunidade em que, também, indeferiu o pedido de antecipação de tutela.

Na audiência preliminar (fls. 430), não houve acordo, tendo a promovida, por meio de petição escrita, requerido a juntada de "documentos novos" (fls. 438 a 467), e a reapreciação das preliminares suscitadas na peça contestatória e já rejeitadas por este julgador.

Feita a junta dos documentos, foi aberto prazo para a parte autora e o representante do Ministério Público se manifestarem.

Ambos pugnaram pelo desentranhamento dos documentos, uma vez que os mesmos já existiam ao tempo da oferta da contestação, restando, assim, preclusa a oportunidade de sua juntada.

Na mesma audiência preliminar, ambas as partes, por seus patronos, pugnaram pelo julgamento antecipado da lide.

É o relatório.

Decido.

FUNDAMENTAÇÃO I

I - Do pedido de reexame das preliminares agitadas na contestação:

As preliminares de ausência de interesse de agir e de prejudicialidade externa foram rejeitadas por este magistrado, nos termos e de acordo com a decisão interlocutória proferida às fls. 421/423, em data de 01/02/2011, a qual foi publicada no Diário da Justiça, edição nº 782, no dia 08/02/2011 (fls. 425 dos autos).

Contra a decisão supra, não houve qualquer recurso.

Todavia, quase dois meses depois, a promovida atravessa nos autos um pedido de reexame daquelas questões processuais, com base em novos documentos, dizendo que, por um lapso da defesa, os documentos trazidos autos com a contestação não são aqueles que a demandada realmente pretendia juntar.

Os sobreditos novos documentos são: uma notificação da Justiça do Trabalho, datada de 23/10/2009 (fls. 438) e cópia da petição de uma Reclamação Trabalhista ajuizada em outubro de 2009 (fls. 439/467).

Enquanto isso, verificamos que a contestação apresentada pela parte ré aportou nestes autos em 25 de outubro de 2010, ou seja, um ano depois da existência dos dois documentos cuja juntada foi agora requerida. Bem podemos ver que a promovida não pretendeu trazer aos autos "documentos novos" e sim "novos documentos", sendo estes preexistentes à data da oferta da sua contestação, o que não se admite, com base no disposto nos artigos 396 e 397, do CPC.

Se a promovida se equivocou no momento de selecionar os documentos que deveriam acompanhar sua contestação, querendo ou não, deu causa ao que chamamos de PRECLUSÃO CONSUMATIVA, nada mais podendo ser feito, pois o processo não volta no tempo para correção de falhas das partes, juízes ou advogados.

Portanto, rejeito o pedido de reapreciação das preliminares, e determino o desentranhamento dos documentos de fls. 438 a 467 dos autos.

II - Do mérito:

Pretendem as autoras a condenação da empresa promovida em indenização por danos morais e materiais resultantes do óbito de SOLUWELLINGTON VIEIRA DE SÁ, esposo da primeira demandante e pai das duas outras, o qual foi vítima do fatídico acidente aéreo ocorrido na noite de 31 de maio de 2009, quando a aeronave Air Bus A330, pertencente à empresa Air France, no vôo AF 447, partindo do Rio de Janeiro, Brasil, com destino a Paris, na França, desapareceu nas águas internacionais do oceano atlântico, ceifando a vida de todas as 228 pessoas que estavam a bordo, entre tripulantes e passageiros.

De ressaltar que, conforme amplamente noticiado na imprensa mundial, por conta do aludido acidente, o Tribunal de Grande Instância de Var, no sul da França, indiciou as empresas Air Bus e Air France, respectivamente, fabricante e proprietária da aeronave sinistrada, pelo crime de homicídio culposo que teve como vítimas as 228 pessoas que estavam a bordo da aeronave do vôo AF 447.

Compulsando os autos, constata-se, sem a menor sombra de dúvida, que o brasileiro SOLUWELLINGTON VIEIRA DE SÁ estava como passageiro do vôo acima referido, conforme Atestado de Presença de Vôo expedido pela promovida, documento este que tem cópia encartada às fls. 47 dos autos. O mencionado passageiro faleceu no acidente, conforme Certidão de Óbito cuja cópia repousa às fls. 48 dos autos.

Por outro lado, o senhor Soluywellington Vieira de Sá era civilmente casado com a demandante FRANCY REGIENE ROCHA DE SÁ, sendo, outrossim, pai das autoras RAYANE ROCHA DE SÁ, nascida em 04 de outubro de 2000, e SABRINA ROCHA DE SÁ, nascida em 21 de março de 2005, conforme revelam os documentos acostados às fls. 37 a 42 do caderno processual.

Ressalto, ainda, que a vítima nasceu no dia 28 de fevereiro de 1969, contando, na data do acidente, com 40 anos, 03 meses e mais 03 dias de vida (vide documento de fls. 45).

Noutra quadra, o documento de fls. 135 comprova que a vítima possuía vínculo empregatício com a empresa GEOKINETICS GEOPHYSICAL DO BRASIL LTDA, tendo recebido salário líquido mensal, em 29 de maio de 2009, no valor de $ 2.659,39 (dois mil, seiscentos e cinquenta e nove dólares americanos e trinta e nove centavos), quantia essa, convertida em REAL, pela cotação cambial do dólar comercial americano do dia 29/05/2009, que era de R$ 1,9722 para cada $ 1,00, importando em R$ 5.244,85 (cinco mil, duzentos e quarenta e quatro reais e oitenta e cinco centavos), o que pode ser comprovado por quem desejar, acessando o site www4.bcb.governo.br/pec/conversao/Resultado.asp?

As autoras informaram que o de cujus tinha um salário líquido mensal de R$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentos reais), o que diverge da constatação feita por este magistrado. A diferença decorre do fato das demandantes terem feito a conversão do salário líquido de $ 2.659,39 para o real, tomando por base a cotação cambial do DÓLAR TURISMO, e não do dólar comercial, do dia 29/05/2009, que foi 2,10575.

Já a cotação do dólar comercial, conforme foi demonstrado acima, ficou em 1,9722. Neste aspecto, devo destacar que o DÓLAR COMERCIAL é o oficial. É o dólar oficialmente usado para as operações de importação e exportação do país, bem como para as operações financeiras. Temo-lo, portanto, como o dólar referencial da economia, embora as pessoas físicas geralmente não trabalhem com esta moeda, o que é um equívoco.

O Dólar Turismo corresponde ao preço do dólar para as pessoas que vão viajar para o exterior. Além disso, também existe uma diferença de cotação entre o dólar turismo em papel moeda e o dólar turismo em travellers check, embora ambos sejam chamados de dólar turismo.

Lançadas as premissas supra, passo ao exame da questão de fundo.

O anseio de obrigar o agente, causador do dano, a repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça. O dano causado pelo ato ilícito rompe o equilíbrio jurídico-econômico anteriormente existente entre o agente e a vítima. Por isso, passa a existir uma necessidade fundamental de se restabelecer esse equilíbrio, o que se procura fazer recolocando o prejudicado no statu quo ante. Impera, neste campo, o princípio da restitutio in integrum, isto é, tanto quanto possível, repõe-se a vítima à situação anterior à lesão.

Isso se faz através de uma indenização fixada em proporção ao dano. Indenizar pela metade é responsabilizar a vítima pelo resto (Daniel Pizzaro, in Daños, 1991). Limitar a reparação é impor à vítima que suporte o resto dos prejuízos não indenizados.

No caso em testilha, a responsabilidade da promovida no tocante à reparação dos danos suportados pelos familiares das vítimas do acidente em comento é algo que dispensa maiores sustentações, até porque a própria ré admitiu essa responsabilidade, quando, juntamente com familiares e beneficiários das vítimas, em conjunto com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Fundação Procon do Estado do Rio de Janeiro e Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, instituiu o PROGRAMA DE INDENIZAÇÃO 447 (PI 447), voltado para promover, extrajudicialmente, o pagamento das indenizações pleiteadas pelos familiares das vítimas do acidente, com observâncias de certos limites valorativos.

O que a promovida não admitiu foi que tenha concorrido culposamente para a verificação do acidente. Admite, mais uma vez, a responsabilidade independente de culpa, quando pede que esta demanda seja julgada com base nas regras da Convenção de Montreal, a qual passou a integrar o nosso ordenamento jurídico, por força do Decreto nº 5.910, de 27 de setembro de 2006.

A referida Convenção, no seu art. 17, estabelece que o transportador é responsável pelo dano causado em caso de morte ou de lesão corporal de um passageiro, desde que o acidente que causou a morte ou a lesão haja ocorrido a bordo da aeronave ou durante quaisquer operações de embarque ou desembarque.

Já o art. 21 reza que, em caso de morte ou lesões dos passageiros, o transportador não poderá excluir nem limitar sua responsabilidade, com relação aos danos previstos no número 1 do art. 17, que não exceda de 100.000 Direitos Especiais de Saque por passageiro. Também estabelece que o transportador não será responsável pelos danos previstos no número 1 do art. 17, na medida em que exceda de 100.000 Direitos Especiais de Saque por passageiro, se provar que:

(a) o dano não se deveu a negligência ou a outra ação ou omissão do transportador ou de seus prepostos; ou

(b) o dano se deveu unicamente a negligência ou a outra ação ou omissão indevida de um terceiro.

De acordo com os ditames da Convenção de Montreal, a promovida assume a responsabilidade pelos danos resultantes do acidente, com base na culpa objetiva, até o limite de 100.000 Direitos Especiais de Saque (DES), devendo sua responsabilidade, no que exceder do limite supra referido, ser apurada com base na culpa subjetiva presumida (a culpa é presumida porque cabe à promovida provar que o dano não se deveu a negligência ou a outra ação ou omissão de sua parte ou de seus prepostos), ao passo que, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade do fornecedor de produtos ou serviços é objetiva, ou seja, independe da existência de culpa, uma vez que se funda na teoria do risco, in casu, risco da atividade desenvolvida.

Significa dizer que, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa, pois esse dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas.

Ademais, pela Convenção de Montreal, o prazo prescricional para a propositura da ação de indenização é de apenas dois (02) anos, enquanto o Código de Defesa do Consumidor estipula um prazo de 05 (cinco) anos. Em razão dos conflitos acima evidenciados, entre dispositivos da Convenção de Montreal e do Código de Defesa do Consumidor, necessário se faz destacar qual a natureza jurídica da relação de direito material subjacente a esta demanda e, conseqüentemente, quais são as normas que deverão ser aplicadas no deslinde da causa, uma vez que as autoras invocaram o Código Civil e Código de Defesa do Consumidor enquanto a demandada defendeu a incidência da Convenção de Montreal.

Inicialmente, devo destacar que entre a vítima SOLUWELLIGNTON VIEIRA DE SÁ e a empresa demandada foi entabulado um contrato de prestação de serviços de transporte de passageiro. Trata-se de contrato bilateral, comutativo, oneroso e consensual, podendo, no entanto, ser documentado pela emissão de títulos de crédito (conhecimento de transporte e bilhete de passagem, no transporte de carga e de pessoas, respectivamente). No transporte de pessoas, são partes da relação contratual a transportadora e a pessoa que deseja ser transportada de um local para outro, eventualmente junto com seus pertences (bagagens). Contempla a obrigação básica de transportar a pessoa, em conformidade com o roteiro, ou o itinerário previsto, e com o zelo e diligência necessários. Compreende as obrigações de recepcionar, acomodar e entregar a pessoa em seu destino, observadas sempre as normas de segurança e de operacionalização compatíveis ao meio de transporte visado. O contrato de transporte traduz obrigação de resultado, cumprindo, assim, à empresa transportadora, entregar a pessoa, em perfeito estado, no local designado, sob pena de arcar com os ônus correspondentes a danos experimentados no curso da atividade.

Todavia, o resultado acima referido não foi alcançado pelos passageiros do vôo 447 da empresa promovida, em razão da catástrofe que resultou na morte de todos. Ou seja, o resultado foi o pior possível: a morte prematura de todos; coisa que não era desejada nem esperada pelos contratantes dos serviços da promovida.

Fazendo um apanhado no nosso ordenamento jurídico, vamos constatar que, no Brasil, a atividade econômica do transportador está esparsamente disciplinada em vários dispositivos legais, tais como: Código Comercial, nos arts. 99 a 118, e 457 a 796; no Código Civil de 2002, nos arts. 730 a 733 (disposições gerais), 734 a 742 (do transporte de pessoas) e 743 a 756 (do transporte das coisas); na Convenção de Varsóvia, na Convenção de Montreal, nas Condições Gerais IATA (Intercarrier Agreement on Passanger Liability), no Código Brasileiro da Aeronáutica, no Código de Defesa do Consumidor (arts. 12 a 14), bem como na Constituição Federal de 1988 (art. 21, inciso XII, alínea "c"). Pelo disposto no art. 21, inciso XII, alínea "c", da Constituição Federal: "Compete à União, explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária". Sendo assim, o transporte aéreo é um serviço público essencial, nos termos do art. 22, do CDC, exigindo e aceitando, como nenhum outro meio de transporte, a intervenção estatal, que regula desde os seus atributos de segurança até a distribuição de rotas. Tanto é verdade que o Governo Federal criou a ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil, para regular esse serviço.

Percebemos, no entanto, que a Convenção de Montreal, o Código Brasileiro de Aeronáutica, o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor convivem de maneira harmoniosa, permanecendo aqueles dois primeiros documentos plenamente em vigor, exceto em relação a alguns pontos de seus dispositivos, onde o conflito de normas é evidente.

Isso quer dizer que o Código de Defesa do Consumidor não revogou a Convenção de Varsóvia nem o Código Brasileiro de Aeronáutica, da mesma forma que a Convenção de Montreal também não revogou qualquer disposição do Código de Defesa do Consumidor.

Diante disso, cabe ao magistrado, no julgamento de cada caso concreto que lhe for apresentado, definir qual é a norma sob qual a demanda deva ser decidida, tendo como ponto de partida o norte que é dado pela Constituição Federal.

Ao tempo da vigência da Convenção de Varsóvia, a indenização dos danos causados aos passageiros de vôos internacionais era limitada a um pequeno valor, além do qual a vítima só conseguiria alcançar se provasse que a empresa aérea havia concorrido dolosamente para a produção do dano.

Ou seja, era praticamente impossível alguém receber uma indenização integral quando o dano ultrapassava o valor tarifado naquela Convenção Internacional, pois a responsabilidade da empresa era subjetiva, e somente se houvesse dolo, recaindo o onus probandi sobre a vítima.

Na Convenção de Montreal, realizada em 28 de maio de 1999, da qual o Brasil passou a ser signatário por força do Decreto nº 5.910/2006, essa limitação foi extirpada, ficando estabelecido que o transportador não poderá excluir nem limitar sua responsabilidade, com relação aos danos previstos no número 1 do art. 17, que não excedam de 100.000 Direitos Especiais de Saque por passageiro.

No mesmo texto, estão elencadas duas excludentes de responsabilidade, aplicáveis apenas nos casos de indenizações acima de 100.000 Direitos Especiais de Saque, a saber: o transportador não será responsável pelos danos previstos no número 1 do art. 17, na medida em que exceda de 100.000 Direitos Especiais de Saque por passageiro, se provar que: (a) o dano não se deveu a negligência ou a outra ação ou omissão do transportador ou de seus prepostos; ou (b) o dano se deveu unicamente a negligência ou a outra ação ou omissão indevida de um terceiro.

Temos, assim, que a proteção conferida ao passageiro vítima de acidente aéreo em vôo internacional, conferida na Convenção de Montreal, não fica muito aquém das garantias que lhe asseguradas pelo Código Consumerista, uma vez que, nos casos em que exige a comprovação da culpa, o ônus da prova ficou com o transportador.

Por outro lado, o art. 178, da Constituição Federal, diz, textualmente, que, no tocante ao transporte aéreo internacional, devemos observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade. Destarte, não encontro a menor dificuldade para concluir que a questão trazida a julgamento nestes autos deve ser dirimida com base nas disposições da Convenção de Montreal, que trata especificamente do transporte aéreo internacional, sem afrontar qualquer direito dos consumidores, no que tange à responsabilidade civil decorrente de morte ou lesão aos passageiros de vôos internacionais.

Nesse compasso, vejo como certa e determinada a responsabilidade civil da promovida, não só no tocante ao valor correspondente a 100.000 Direitos Especiais de Saque (DES), que independe de culpa, como no valor que for necessário para que ocorra a integral reparação dos danos suportados pelas autoras, em decorrência da morte de SOLUWELLINGTON VIEIRA DE SÁ, vítima do acidente aéreo acima mencionado, considerando que a promovida não cuidou de produzir qualquer prova tendente a demonstrar que o dano não se deveu a negligência ou outra ação ou omissão de sua parte ou de seus prepostos; ou que o dano se deveu unicamente a negligência ou a outra ação ou omissão indevida de um terceiro.

Ademais, mesmo que o ônus da prova quanto à culpabilidade da promovida não caiba às demandantes, entendo que tal fato já está sobejamente evidenciado, não só pela prova existente nos autos, como também por tudo que já foi divulgado na imprensa internacional a respeito desse acidente, principalmente depois do resgate das caixas-pretas do Airbus A330 do vôo AF 447.

Em entrevista coletiva para a imprensa internacional, ERIC SCHRAMM, diretor de operações aéreas da Air France, elogiou a competência da tripulação da aeronave, composta de três pilotos, e disse que o relatório do BEA - Escritório de Investigações e Análises (sigla em francês), órgão que apura as causas do acidente, confirmou oficialmente que a pane nos sensores de velocidade do Airbus, os chamados Tubos Pitot, foi o ponto de partida de uma série de eventos que conduziram à catástrofe.

As divulgações jornalísticas dão conta de que houve perda dos dados de velocidade do avião, ocorrendo, em seguida, a desconexão do piloto automático da aeronave, perda de sustentação e altitude, culminando com a queda.

Acerca da pane nos Tubos Pitot, o Jornal "O Globo", edição de 07/06/2009, divulgou que, desde setembro de 2007, a Airbus havia recomendado à Air France a troca dos sensores de velocidade (sondas pitot) dos aviões A340 e A330. Entretanto, somente a partir de maio de 2008 foi que a Air France começou a discutir com a fabricante das aeronaves a possibilidade de substituição do equipamento. E isso aconteceu porque, na época, foram registrados o que a companhia aérea francesa chama de "incidentes de perdas de informações anemométricas em vôo de velocidade de cruzeiro em avisões A340 e A330".

Mesmo assim, somente em 27 de abril de 2009 (apenas dois meses antes do acidente aqui mencionado), a Air France iniciou, segundo a matéria jornalística, a troca dos tubos pitot. Antes de ter início a substituição das sondas pitot, foram registrados problemas com vários Airbus A330, sendo um deles com avião da companhia australiana Qantas, em outubro de 2008, com 313 pessoas a bordo. A aeronave subiu e despencou repentinamente, deixando 70% dos passageiros feridos. O avião pousou, depois de conseguir estabilizar a altitude, no aeroporto de Laermonth, perto da cidade de Exmouth, Oeste da Austrália.

Verifica-se, pois, que a promovida foi negligente no tocante à segurança das suas aeronaves e, por conseguinte, da vida dos seus passageiros, o que é inadmissível, pois com vidas humanas não se brinca.

Ora, sendo a atividade fim da promovida o transporte aéreo de passageiros, não se admite que, para isto, não conte com aeronaves que trafeguem em condições normais, mas também que sejam capazes de suportar eventuais intempéries.

Se disso não cuidou, deixou de cumprir a mais importante cláusula do contrato de transporte de pessoas, que é, sem sombra de dúvida, a cláusula de incolumidade nele implícita. Entende-se por cláusula de incolumidade a obrigação que tem o transportador de conduzir o passageiro são e salvo ao lugar de destino.

Dessa forma, mesmo de acordo com as disposições contidas nos arts. 17 e 21 da Convenção de Montreal, deve a promovida ser condenada a reparar integralmente os danos sofridos pelas autoras, em decorrência da morte do citado passageiro, cabendo a este julgador fazer a fixação das verbas indenizatórias.

Dos danos materiais:

De acordo com o documento encartado às fls. 135 dos autos, e como já foi explicitado acima, o "de cujus" recebia salário líquido mensal no valor de R$ 5.244,85 (cinco mil, duzentos e quarenta e quatro reais e oitenta e cinco centavos).

A esposa e filhas da vítima, autoras desta ação, dependiam economicamente da renda do falecido, devendo, por isso, a promovida pagar pensão mensal às mesmas, no valor correspondente a 2/3 (dois terços) do salário líquido acima mencionado, o que importa em R$ 3.496,57 (três mil, quatrocentos e noventa e seis reais e cinquenta e sete centavos) para aquele grupo familiar.

O pensionamento deve ser mantido até a data em que a vítima completaria 69 (sessenta e nove) anos de idade, ou seja, até 28 de fevereiro de 2.038, considerando que o falecido nasceu em 28/02/1969.

Ressalto que, de acordo com a jurisprudência mais recente dos nossos tribunais que, por sua vez, se baseiam em estudos divulgados pelo IBGE, a expectativa de vida do brasileiro está, hoje, em 70 (setenta) anos. Porém, como o pedido das autoras foi para pensionamento perdurar até a data em que a vítima completaria 69 anos, mais do que isso não posso conceder, para não incorrer em julgamento ultra petita.

Apenas para exemplificar, confira-se o seguinte julgado:

"AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - INVASÃO DE PISTA PREFERENCIAL - ENTRETANTO, MOTOCICLETA QUE ALI TRAFEGAVA COM OS FARÓIS APAGADOS AO ANOITECER - CULPA CONCORRENTE - RESSARCIMENTO DEVIDO PELA METADE - PENSÃO MENSAL - OBJETIVO - RECOMPOR A RENDA AO PATAMAR ANTERIOR AO INFORTÚNIO - OBRIGAÇÃO QUE NÃO TEM A MESMA NATUREZA DO PENSIONAMENTO FAMILIAR - INCLUSÃO DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO - TERMO FINAL DA VERBA EM RELAÇÃO À FILHA E ESPOSA - DATA EM QUE A PRIMEIRA VIER A COMPLETAR 25 ANOS, E PARA A OUTRA O DIA EM QUE O FINADO FARIA 70 ANOS - DIREITO DE REVERSÃO DA PENSÃO ENTRE AS BENEFICIÁRIAS GARANTIDO - DANOS MORAIS CARACTERIZADOS - QUANTUM INDENIZATÓRIO - CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO - SUBJETIVIDADE - DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - DPVAT - PROVA DO RECEBIMENTO - DECOTE DA VERBA QUE SE IMPÕE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO - Age com culpa, na modalidade imprudência, o condutor de veículo que invade via preferencial (BR 282) e obstrui o fluxo contínuo do tráfego. Concorre sobremaneira pelo infortúnio, entretanto, o motociclista que ali seguia com os faróis apagados, próximo do anoitecer, num momento de baixa luminosidade, dificultando a visualização pelos demais motoristas. Ressarcimento devido, mas reduzido à metade. A pensão por ato ilícito, calculada em razão do salário, inclusive o décimo terceiro, visa recompor a renda ao patamar anterior ao acidente, razão pela qual é irrelevante o fato de a esposa estar em idade produtiva, podendo exercer outra atividade. Por outro lado, o pensionamento para a filha cessa aos 25 anos, presumindo-se tal como suficiente para a sua estabilidade no mercado laboral, além de se supor seu casamento, cessando o auxílio familiar. Com a maioridade, o quinhão reverte em prol da esposa, a quem será devida a pensão até quando o finado completaria 70 anos. É evidente o sofrimento infligido aos familiares da vítima, privados do convívio de maneira tão abrupta e repentina, o que causa efeito negativo prolongado na psique, muitas vezes difícil de se superar, ponto de partida para o ressarcimento por danos morais. Na fixação do valor da condenação por dano moral, deve o julgador atender a certos critérios, tais como nível cultural do causador do dano; Condição sócio-econômica do ofensor e do ofendido; Intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; Efeitos do dano no psiquismo do ofendido e as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima (RESP 355392/RJ, Rel. Min. Castro Filho, j.26.3.2002)

Verificado o percebimento do seguro obrigatório pela parte beneficiária, faz-se necessária sua dedução sobre a verba indenizatória estabelecida (Apelação Cível nº 2004.034105-6, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. 24.3.2006). (TJSC - AC 2009.063728-2 - 3ª CDCiv. - Relª Desª Maria do Rocio Luz Santa Ritta - DJe 03.12.2010)". (grifei).

O pensionamento cessará para as filhas do falecido ante a ocorrência de qualquer dos seguintes eventos:

a) alcance da idade de 25 (vinte e cinco) anos:

b) casamento;

c) conclusão de curso superior.

Para a viúva, o pensionamento terá seu fim antes da data em que a vítima completaria 69 anos, se a mesma deixar a condição de viúva, ou seja, casar-se novamente.

O quinhão da filha que completar 25 anos permanece para o grupo familiar, pois, se a vítima estivesse viva, o casamento de uma filha não reduziria sua renda mensal. Portanto, não seria justo fazê-lo com a viúva.

A importância de R$ 3.496,57 (três mil, quatrocentos e noventa e seis reais e cinquenta e sete centavos), acima estipulada como pensão para o grupo familiar, corresponde a 2/3 (dois terços) do salário líquido da vítima na data do acidente. Todavia, de acordo com a Súmula 490, do Supremo Tribunal Federal, "A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores".

Assim, necessário se faz dividir o valor supra pelo valor do salário mínimo vigente em 31/05/2009 (data do acidente), que era R$ 465,00 (por força da Lei 11.944, de 28/05/2009), o que importa em R$ 7,52 (sete reais e cinquenta e dois centavos) e multiplicar pelo valor do salário mínimo vigente na data desta sentença, qual seja, R$ 545,00 (por força da Lei nº 12.382, de 25 de fevereiro de 2011), o que resulta em uma pensão mensal, nesta data, no valor de R$ 4.098,13 (quatro mil, noventa e oito reais e treze centavos).

A partir desta data, o valor da pensão será reajustado de acordo com as variações dos salários mínimos vindouros, nas mesmas datas e nos mesmos percentuais, conforme estabelece a Súmula 490 do STF.

No tocante às parcelas já vencidas, não deve incidir atualização monetária, pois as mesmas serão pagas tendo como referência o valor do salário mínimo vigente na data do pagamento, o que não deixa de ser uma forma de recomposição do valor da moeda.

Incidem, entretanto, juros de mora de 6% (seis por cento) ao ano, a partir da data da citação válida (01/10/2010 - fls. 182v), visto que inaplicável a Súmula 54 do STJ, por se constituir o fato como inadimplemento contratual.

Do dano moral:

À luz da Constituição Federal vigente, dano moral nada mais é do que agressão à dignidade humana, podendo ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo.

Noutro pórtico, a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Em sendo o dano moral algo imaterial ou ideal, seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia.

Neste ponto, a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum.

Quando o dano moral resulta da perda de um filho, do cônjuge, do pai, da mãe ou de outro ente querido, não há que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre do próprio fato, de acordo com as regras de experiência comum; quem é que não sofre a perda de um filho, do pai ou da mãe, do esposo ou da esposa? No caso em exame, as promoventes perderam um ente querido, esposo da primeira demandante e pai das duas últimas.

Ficaram elas, demandantes, em razão do acidente mencionado nestes autos, privadas do convívio salutar com a desditosa vítima, devendo ser ressaltado que a filha RAYANE estava apenas com 09 anos de idade, e a outra filha, SABRINA, com 04 anos. Tão infantis e já desassistidas da proteção e segurança que todo filho encontra nos braços do pai.

Quem já sofreu a perda de um ente querido, notadamente em situação trágica e inesperada como é um acidente aéreo, sabe quão profunda é a dor que invade a alma. Vivenciar a indesejada realidade e adaptar-se à perda, à ausência definitiva é o que se chama o processo de luto. Tudo fica sombrio e sem sentido; por isso que a cor do luto é preta.

No processo de luto, passamos por uma fase inicial de negação, em que de algum modo continuamos a aguardar um telefonema da pessoa que já se foi para sempre, e cuidamos dos seus bens, preparando tudo para um retorno que já é impossível. Depois, e não raras vezes, passamos por um período de raiva, de revolta com a situação (por quê isso aconteceu? Por quê agora? ).

Outra fase é da negociação, quando tendemos a fazer promessas de nos tornarmos "pessoas melhores" se nos derem de volta a pessoa perdida. Depois de tudo isso, vem a fase da depressão, quando a tristeza passa a ser vivenciada em sua forma mais profunda. Esta fase pode ser reativa e passageira, mas também pode tomar proporções de maior gravidade.

Os profissionais da psicologia afirmam que um processo de "luto normal" dura cerca de 02 (dois) anos, e termina quando vem a fase de aceitação, em que conseguimos voltar a criar laços e a nos dedicar à vida. Isto demonstra a intensidade da dor sofrida pelas autoras, devendo, pois, a promovida ser condenada a pagar a cada uma delas uma quantia que possa ensejar uma justa compensação, sem que, por outro lado, estejamos outorgando uma indenização punitiva, exemplar ou de qualquer natureza que não seja compensatória, como adverte o art. 29, da Convenção de Montreal.

Com fulcro em tais premissas, hei por bem fixar a indenização por danos morais no valor de R$ 545.000,00 (quinhentos e quarenta e cinco mil reais) para cada uma das autoras, totalizando, assim, R$ 1.635.000,00 (hum milhão, seiscentos e trinta e cinco mil reais), nesta data, valor este que deve ser acrescido de atualização monetária pelos índices do INPC/IBGE e juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano (Código Civil, art. 406 c/c art. 161, § 1º, do CTN, e Dec. 22.626/33), fluindo ambos os encargos a partir da data da publicação desta sentença.

As indenizações por danos morais outorgadas as menores RAYANE ROCHA DE SÁ - CPF 104.531.404-83, e SABRINA ROCHA DE SÁ - CPF 104.531.394-77, deverão ser depositadas em contas de caderneta de poupança, individualmente abertas para cada uma delas, junto à Caixa Econômica Federal, nesta cidade, com CLÁUSULA CONDICIONAL de movimentação somente pelas respectivas titulares das contas, quando as mesmas atingirem a maioridade (18 anos), ou mediante autorização judicial.

DISPOSITIVO

Isto posto, extingo o presente processo, com resolução do mérito, na forma do disposto no art. 269, inciso I, do CPC, JULGANDO PROCEDENTE o pedido autoral, para CONDENAR a empresa SOCIÉTÉ AIR FRANCE (Air France), qualificada nos autos, a reparar os danos materiais causados às promoventes, reparação esta a ser feita na forma de pensão mensal no valor atual de R$ 4.098,13 (quatro mil, noventa e oito reais e treze centavos), que corresponde a 2/3 (dois terços) do salário líquido auferido pela vítima Soluwellington Vieira de Sá, na data do acidente, devendo o valor da pensão, a partir desta data, ser reajustado de acordo com as variações dos salários mínimos vindouros, nas mesmas datas e nos mesmos percentuais, conforme estabelece a Súmula 490 do STF.

No tocante às parcelas já vencidas, não deve incidir atualização monetária, pois as mesmas serão pagas tendo como referência o valor do salário mínimo vigente na data do pagamento, o que não deixa de ser uma forma de recomposição do valor da moeda (atualização monetária). Incidem, entretanto, juros de mora de 6% (seis por cento) ao ano, a partir da data da citação válida (01/10/2010 - fls. 182v), visto que inaplicável a Súmula 54 do STJ, por se constituir o fato como inadimplemento contratual.

O pensionamento supra deve ser mantido até a data em que a vítima completaria 69 (sessenta e nove) anos de idade, ou seja, até 28 de fevereiro de 2.038, considerando que o falecido nasceu em 28/02/1969. O pensionamento cessará, para as filhas do falecido, ante a ocorrência de qualquer dos seguintes eventos: a) alcance da idade de 25 (vinte e cinco) anos: b) casamento; c) conclusão de curso superior. Para a viúva, o pensionamento terá seu fim antes da data em que a vítima completaria 69 anos, se a mesma deixar a condição de viúva, ou seja, casar-se novamente.

O quinhão da filha que completar 25 anos permanecerá para o grupo familiar, pelas razões expostas na fundamentação desta sentença. CONDENO, ainda, a promovida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 545.000,00 (quinhentos e quarenta e cinco mil reais) para cada uma das autoras, totalizando, assim, R$ 1.635.000,00 (hum milhão, seiscentos e trinta e cinco mil reais), nesta data, valor este que deve ser acrescido de atualização monetária pelos índices do INPC/IBGE e juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano (Código Civil, art. 406 c/c art. 161, § 1º, do CTN, e Dec. 22.626/33), fluindo ambos os encargos a partir da data da publicação desta sentença.

As indenizações por danos morais outorgadas as menores RAYANE ROCHA DE SÁ - CPF 104.531.404-83, e SABRINA ROCHA DE SÁ - CPF 104.531.394-77, deverão ser depositadas em contas de caderneta de poupança, individualmente abertas para cada uma delas, junto à Caixa Econômica Federal, nesta cidade, com CLÁUSULA CONDICIONAL de movimentação somente pelas respectivas titulares das contas, quando as mesmas atingirem a maioridade (18 anos), ou mediante autorização judicial.

Por fim, CONDENO a promovida ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrando estes em 10% (dez por cento) sobre o montante da condenação, considerando para tanto o total da indenização por danos morais mais 12 (doze) parcelas da pensão mensal, devidamente atualizados, em consonância com o disposto no art. 20, § 3º, alíneas "a", "b" e "c", do CPC.

Fica a promovida ciente de que o não cumprimento voluntário das obrigações que lhe foram impostas nesta sentença, no prazo de 15 (quinze) dias, a contar do trânsito em julgado, ensejará a aplicação de multa de 10% (dez por cento), prevista no art. 475-J, do CPC, além do desencadeamento das medidas de execução, se requeridas no prazo de 180 (cento e oitenta) dias. Após o trânsito em julgado, e pagas as custas, arquive-se, com a baixa respectiva, se nada mais for requerido.

Publique-se.

Registre-se e Intimem-se. Advogados(s): Rony Jefferson Confessor da Paz (OAB 8650/RN), Waltency Soares Ribeiro Amorim (OAB 3481/RN)

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